Em 2004, ministra admitiu ter feito 'treinamento de aborto'

Para Eleonora Menicucci, objetivo era que 'pessoas não-médicas pudessem lidar com aborto'; ONG nega curso

Foto do author Redação
Por Redação
Atualização:

* Atualizado às 21h

PUBLICIDADE

Em uma entrevista concedida em 2004 a uma professora da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), a ministra Eleonora Menicucci (Secretaria de Políticas para as Mulheres) admitiu ter participado de um "treinamento de aborto" na Colômbia com uma ONG brasileira. Segundo a ministra, que à época era docente da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), um grupo do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde viajou ao país vizinho, em data não especificada, para aprender a fazer o procedimento "com sucção".

"A gente aprendia a fazer aborto com aspiração. (...) Porque a nossa perspectiva no Coletivo (era que as pessoas se) auto-capacitassem, e que pessoas não-médicas podiam lidar com o aborto", afirmou Eleonora na entrevista à professora de História Social Joana Maria Pedro, no dia 14 de outubro de 2004. O texto foi divulgado pelo jornalista Reinaldo Azevedo, em sue blog no site da revista VejaA transcrição está disponível no site da UFSC.

A atual ministra não afirma se participou ou presenciou a realização de abortos na Colômbia. Até 2006, a prática era considerada crime naquele país - mesmo em casos de estupro, risco de morte para a mãe ou má-formação do feto.

A presidente do Coletivo Feminista Sexualidade e Saúde afirmou ao estadão.com.br que desconhece a realização de qualquer treinamento de aborto pela organização. Segundo Ana Galati, a ministra Eleonora Menicucci deixou o grupo em 2004 e que a ONG não realiza nenhum tipo de capacitação para não-médicos.

"O Coletivo ensina mulheres a fazer auto-exames (de mama e colo de útero), não para fazer aborto", disse a presidente do Coletivo. Ela afirmou que o grupo é favorável à descriminalização da prática, mas que não incentiva ou encaminha a clínicas as mulheres que procuram a ONG interessadas em realizar abortos.

Eleonora também já disse ser favorável ao aborto, mas assumiu o compromisso de seguir a orientação do governo na aplicação de políticas públicas referentes a essa prática. Atualmente, o aborto é crime, exceto em casos de estupro e de risco de morte para a mãe.

Publicidade

Na entrevista concedida em 2004, a atual ministra admite ter feito dois abortos - um deles decidido em conjunto com a organização clandestina na qual militava, o Partido Operário Comunista. Ela também afirma que, àquela época, atendia mulheres vítimas de violência sexual e realizava abortos em mulheres que procuravam a Casa de Saúde da Unifesp.

Autora da entrevista, a professora Joana Maria Pedro, da UFSC, afirmou ao estadão.com.br que as declarações de Eleonora estão fora de seu contexto original. "Isso é história, é uma pesquisa acadêmica", disse a socióloga, que trabalhava à época em uma pesquisa sobre o engajamento de mulheres que se identificaram com o feminismo quando lutavam contra a ditadura. "As pessoas podem ter feito e vivido coisas que não fazem mais. Eu entrevisto pessoas que falam de sua juventude e de coisas que fizeram sua juventude."

Joana Maria Pedro disse ser favorável à descriminalização do aborto. "Não é justo que mulheres sejam presas ou morram por fazer aborto. Fazer aborto não é como fazer as unhas: não acho que as pessoas devam sair fazendo, mas também acho que não devem ser presas", afirmou. "a saída seria a descriminalização, mas não como uma forma de controle da natalidade."

A Secretaria de Políticas para as Mulheres informou, em nota, que Eleonora Menicucci nunca esteve na Colômbia e que a entrevista "contém imprecisões que a levaram a requerer, em 2010, a sua retirada do site".

A professora Joana Maria Pedro informou que recebeu, em 2011, um pedido para que a entrevista fosse retirada do ar para evitar exposição da filha de Eleonora. "Se havia alguma outra imprecisão, eu não me lembro", disse.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.