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Discussão sobre reforma na ONU anima Itamaraty

Governo retoma esperanças de conseguir um assento permanente no Conselho de Segurança da organização

Por Denise Chrispim Marin
Atualização:

A diplomacia brasileira aposta todas as fichas em uma discreta negociação sobre a nada fácil reforma do Conselho de Segurança, que começou nas Nações Unidas neste mês. Diante da oportunidade aberta, o governo trabalha para restaurar a unidade do grupo que ambiciona uma cadeira permanente - Alemanha, África do Sul, Brasil e Índia, o chamado G4 - e para aliciar os 53 países da África na montagem de uma proposta única de reforma. Nessa estratégia, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá o papel de reforçar a tese da ampliação do Conselho em foros internacionais como o G20, que se reunirá em Londres no início de abril. O desafio esteve arquivado por quatro anos, desde a fracassada tentativa do G4 de apresentar aos 193 membros da ONU sua proposta de reforma do Conselho. Desta vez, o modelo adotado pela Assembleia-Geral anima o Itamaraty. Não se trata mais da discussão de um grupo de trabalho ou de uma confraria de especialistas, mas de um debate informal no plenário da Assembleia-Geral. Esse mesmo formato resultou, em 2006, na criação do Conselho de Direitos Humanos da ONU. A pretensão brasileira de atuar como membro permanente no Conselho tem a idade da ONU, 63 anos. O tema ganhou o topo da prioridade da política exterior nas duas vezes em que o embaixador Celso Amorim conduziu o Itamaraty - entre 1993 e 1994, no governo Itamar Franco, e desde 2003, na administração Lula. Boa parte da extensa agenda de visitas do chanceler e do próprio Lula nos últimos anos, sobretudo para a África, responde a esse objetivo. Na história da ONU, a única reforma no Conselho de Segurança se deu em 1965, quando cadeiras não-permanentes passaram de seis para dez. Os assentos permanentes - pertencentes a Estados Unidos, Rússia, China, Reino Unido e França - ficaram intocáveis. No mundo, nenhum país contesta o fato de que essa instância não reflete mais o jogo de forças da atualidade, no qual participam países em desenvolvimento de peso nas esferas econômica e político-militar. Mas chegar a uma fórmula capaz de obter o aval de 128 países - 2/3 dos 192 sócios da ONU - é um ultra desafio. SILÊNCIO Entre os detentores de assentos permanentes, a posição da administração Barack Obama sobre a reforma do Conselho é a grande incógnita. Seu antecessor, George W. Bush, mostrava-se favorável à inclusão do Japão e de "uns dois" países entre os membros permanentes. Obama não a endossa nem a rejeita, apenas se mantém em silêncio. A Rússia dá um apoio pouco entusiasta, a China mostra-se ainda mais cautelosa e apenas o Reino Unido e a França apostam na inclusão do Brasil. Na vizinhança dos países do G4, a resistência engrossa. O México chegou a pleitear sua candidatura, para se opor à do Brasil, e a Argentina também trabalha contra. O Paquistão se enfurece com a inclusão da Índia, a Itália faz o mesmo com a Alemanha, e a China e a Coréia do Sul resistem à ascensão do Japão ao Conselho. Em 2005, o G4 sugeria a inclusão de seis novos membros permanentes - dois deles na África - e de quatro não-permanentes. Para não macular sua pretensão com a polêmica sobre o direito ao veto, o G4 propôs que novos membros permanentes abdicassem desse atributo por um período de 12 anos, ao final do qual haveria um debate sobre o tema. A União Africana acabou com a expectativa do G4 ao lançar uma proposta alternativa - com uma cadeira permanente a mais e com o direito imediato dos novos membros ao veto. A iniciativa deixou claro o Brasil e ao G4 que a chave da reforma está na África. O continente detém 53 votos amarrados em um sólido consenso. Entretanto, uma fonte do governo brasileiro pondera que a unificação das duas propostas, aparentemente similares, é quase impossível. Pleitear o direito imediato de veto significaria, para o G4, a possível perda de apoios relevantes já conquistados, como a França e o Reino Unido, e maior resistência da China, da Rússia e dos EUA. Mais difícil, a saída possível estaria em um recuo da África e sua adesão à proposta original do G4. No governo, a avaliação é de que o grau de apoio à proposta do G4 atingiu o teto e que, se pender para um ou outro lado, o grupo perde apoio. Em 2005, a África jogara um balde de água fria nas pretensões brasileiras. Até então, o presidente Lula havia visitado 14 países africanos para "vender" a cooperação brasileira e posto em marcha sua tática de expansão da presença do País na região - 15 embaixadas abertas entre 2003 e 2008. Embora a reforma do Conselho de Segurança tenha ficado anestesiada, o tema não saiu da agenda do Itamaraty. Lula prosseguiu com suas excursões e pisou, pela primeira vez, em cinco países africanos e fez novas visitas a outros quatro.

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