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'Discurso de ódio surge em fissuras da democracia', diz pesquisadora

Para Maria Luiza Tucci Carneiro, informação qualificada e educação são caminhos para combater o ódio

Por Paulo Beraldo
Atualização:

O discurso de ódio, potencializado pelas redes sociais, ganha espaço quando há fragilidades na democracia. A avaliação é da professora Maria Luiza Tucci Carneiro, coordenadora do Laboratório de Estudos sobre Etnicidade, Racismo e Discriminação (LEER), da Universidade de São Paulo (USP), que coordenou um evento nesta semana para debater soluções para combater o discurso de ódio

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O evento abordou temas como o antissemitismo, o preconceito contra negros e contra a população LGBT. No encontro, os palestrantes enfatizaram que até atitudes que parecem despretensiosas, como uma piada ou o compartilhamento de um meme no celular podem carregar preconceito e potencializar atitudes hostis. Para a pesquisadora, informação qualificada e a educação são as ferramentas capazes de combater o discurso de ódio

Qual a importância de se discutir o discurso de ódio e encontrar maneiras de reduzi-lo neste momento?

Esse momento é emergencial. É importantíssimo formar uma opinião pública que venha a combater os discursos de ódio. Também devemos identificar e conceituar esses discursos, principalmente do ponto de vista acadêmico, com fundamentos em pesquisas, e também formar pessoas conscientes do seu papel de cidadãos que possam interferir através de ações educativas com propostas criativas e sedutoras porque o discurso de ódio é sedutor.

Temos de fazer uma contrapartida no sentido de minimizar esses discursos. Precisamos de critérios que identifiquem e, ao mesmo tempo, ofereçam um diagnóstico, um mapeamento, e também uma profilaxia de combate e de minimização desse discurso, que tem consequências que levam a violências físicas e simbólicas. 

A professora Maria Luiza Tucci Carneiro na Universidade de São Paulo Foto: Paulo Beraldo/Estadão

A senhora falou em interferir nessa realidade. Como isso pode ser feito de maneira concreta, criando redes, por exemplo? 

A rede é importantíssima. As estratégias têm de superar as redes que propagam discursos de ódio para que haja intervenções educativas, proporcionando mais informação. Eu percebo que há uma certa ignorância, não proposital, mas um desconhecimento por falta de acesso à educação. É importante criar matrizes que possam colaborar para um pensamento e para ações humanistas, que favoreçam a compreensão e a necessidade da Justiça social, dos direitos humanos e, para isso, precisamos de estratégias.

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Tenho usado muito em nossas atividades o teatro, o cinema, as artes visuais, as histórias e testemunhos de sobreviventes do Holocausto, por exemplo. São posturas de pesquisa e que são fundamentais para que você possa oferecer conteúdo, debater, com fundamentos em critérios científicos e acadêmicos, para fundamentar ações. A educação para mim está em primeiro plano, seguida de pesquisas históricas. 

Pensando de maneira um pouco mais ampla, por que, na sua avaliação, o discurso de ódio está ganhando força?

À medida que há na sociedade a ignorância, a falta de uma educação direcionada para o respeito ao outro, quando esse caminhar da democracia se apresenta falho ou apresenta uma fissura em algum momento, é por essa fissura que o discurso de ódio penetra e prolifera. Porque ele encontra um campo fértil.

Quando há uma crise de valores, se os nossos valores de Justiça, de dignidade, de respeito às diferenças, os (novos) valores que vêm vão tomar esse lugar. Acho que neste momento vivemos uma crise de valores e os educadores, a imprensa, os grupos vulneráveis, devemos realizar um diagnóstico que possibilite estratégias de defesa e ações intervencionistas em parceria com o Estado, a comunidade acadêmica e a sociedade civil brasileiras. O ponto final seria a valorização explicitando o legado desses grupos vulneráveis.

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