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'Dilma precisa adotar proatividade de Lula', afirma pesquisadora

Cientista política reconhece que cenário diplomático ficou mais complexo, mas vê falha do governo ao não assumir protagonismo

Por Wilson Tosta
Atualização:

RIO - A pesquisadora Maria Regina Soares de Lima, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Iesp-Uerj), avalia que a presidente Dilma Rousseff, em seu novo mandato, precisará retomar a diplomacia presidencial ativa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Para ela, Dilma manteve os princípios adotados pelo antecessor na política externa, mas pecou ao não adotar a mesma proatividade. Maria Regina acredita que o Brasil deve assumir seu protagonismo na América do Sul de forma "solidária", e não por meio de instituições supranacionais, como ocorre na Europa.A questão do Porto de Mariel, em Cuba, foi um tema recorrente na campanha eleitoral. Como a sra. analisa esse debate? O porto virou um símbolo. Isso, na verdade, é como se fosse uma exportação de serviços. O BNDES não pode emprestar para países estrangeiros. Mas pode financiar um investimento brasileiro no exterior. Financia em reais e o governo (estrangeiro) vai pagar em dólares. Financia o serviço lá, o cliente compra produtos brasileiros, tem de importar e paga em dólar o investimento que foi feito em reais. Então, não é um gasto. Não é como se o Brasil deixasse de investir em um porto seu, é totalmente distinto. Isso é parte do processo de internacionalização das empresas brasileiras. Como comparar a política externa sob Lula e Dilma? Dilma conservou os princípios e a orientação, mas não foi tão ativa quanto Lula, que ampliou muito o alcance da ação brasileira do ponto de vista da atividade, do número de embaixadas, do aumento até do quadro de diplomatas. Ela não inovou e não foi tão ativa. Primeiro, as condições de ação internacional do Brasil se tornaram mais complexas, do ponto de vista da crise do multilateralismo, com a crise da OMC (Organização Mundial do Comércio). A própria condição na região se tornou mais complexa. A morte do (presidente venezuelano Hugo) Chávez acabou tendo um efeito... Chávez tinha um certo pragmatismo. Com (o atual presidente, Nicolás) Maduro, ficou mais instável. A Argentina em crise... Talvez tenha um lado da presidente Dilma que vê a política externa de forma muito instrumental, de dar resultados. E política externa não dá resultado imediato. Tem de fazer um investimento de longo prazo.A diplomacia presidencial mais ativa deveria ser uma opção no segundo mandado de Dilma? Sim, porque não vamos ter instituições regionais com supranacionalidade, como é o caso da Europa. Esquece, impossível. O diferencial de poder do Brasil é tão grande que é impossível. Então, o que é possível? É ter uma política solidária. Vai ter de ter um investimento. Outra coisa que complica é a própria dimensão do orçamento do Itamaraty. De 2013 para 2014, diminuiu pela metade, passou de R$ 2 bilhões para R$ 1 bilhão. O próprio Itamaraty terá de fazer uma reforma na gestão de seus quadros.O que a presidente pode fazer pelo Mercosul? Vai ter de inovar, criar cadeias produtivas dentro da região. Não é só comércio. A região e o Mercosul - e os Estados Unidos também são importantes - são mercados dos mais dinâmicos para as exportações de manufaturados brasileiros. A região vende commodities e compra do Brasil manufaturados. Como vai ser a política do novo governo em relação a países como Venezuela e Bolívia?O status quo, quando não se faz nada, se deteriora. Então, ela não fez nada contra. Ela fez pouco do ponto de vista de presença. E tem uma questão que vai aparecer em 2015, que é a renegociação do acordo de gás com a Bolívia. Um problema seriíssimo que a gente enfrenta e vai ter de pensar é a migração para o Brasil. Como é o México com os Estados Unidos? A gente vai construir um muro? É do nosso interesse que eles se desenvolvam. Enquanto a gente continuar com essa ideia de "ah, se dá para eles, está tirando da gente", aí não vai.

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