
09 de julho de 2015 | 05h00
Os números evidenciam o pragmatismo dos deputados. Em situações extremas, a Câmara tem comportamento da manada. Raros votam com sua “consciência”. A maioria migrará para o lado que tiver mais chance de ganhar. Questão de sobrevivência: alinhar-se com a oposição em questão de vida e morte para o governo é abrir mão de qualquer cargo e verba. Não tem volta. E votar com o governo que por ventura cair dificulta usufruir daquele que vai entrar.
Todo o palavrório sobre “golpe” e “golpismo”, tanto por parte do governo quanto da oposição, seria desperdício de tinta e bytes se não tivesse um efeito simbólico para os deputados: sinaliza que ambos os lados estão dispostos a ir até o fim no seu propósito de ficar na cadeira presidencial ou de desocupá-la.
Isso é especialmente importante para Dilma. A qualquer sinal de dúvida ou fraqueza, a manada pode correr para o lado da oposição. Os deputados estão todos com orelhas e narinas alertas, como um bando de zebras auscultando leões.
A consequência fundamental da reunião de Dilma com os aliados na segunda-feira passada foi a declaração de apoio de PT, PMDB, PSD, PC do B, PDT, PRB, PR e PROS. Eles somam 262 deputados, hoje. Segundo o artigo 51 da Constituição, cabe privativamente à Câmara autorizar, por dois terços de seus membros, a instauração de processo contra o presidente e o vice. Dois terços de 513 dá 342 votos. Logo, 172 deputados é o mínimo que qualquer presidente precisa – sempre – para não ir mais cedo para casa.
Os 262 deputados dos oito partidos que se declararam governistas implicam, em tese, 90 votos a mais do que a presidente precisa para garantir-se no cargo. Está longe de ser “moleza”. Em primeiro lugar, porque a base do governo é movediça: só 131 deputados votaram 90% das vezes nesta legislatura seguindo a orientação do governo – e a maioria deles é do PT.
Ter o apoio formal de outros partidos, portanto, é condição necessária à sobrevivência de Dilma. Mas não suficiente. Nem todos os deputados seguem a orientação do seu líder partidário. Haverá defecções.
Computando-se apenas aqueles deputados que votaram 90% das vezes de acordo com a orientação do líder de seu partido ou que seguiram o líder do governo em 80% das votações nominais neste ano, os 262 caem para 203. A margem de segurança de Dilma ficaria reduzida de 90 para 31 votos. Acrescente-se aí outro fator de incerteza: os partidos podem mudar de lado.
A deserção da liderança do PMDB, por exemplo, implicaria Dilma perder 39 votos de deputados fiéis a ela ou ao líder do PMDB. Já seria fatal para sua contabilidade. Com o agravante de que o PMDB tem um peso institucional extra por presidir a Câmara e o Senado, além de ter o vice-presidente, Michel Temer. Se os peemedebistas se bandearem para a tese do impeachment, outros partidos tendem a segui-lo. Zebras e leões.
Logo, é praticamente impossível para Dilma segurar-se no cargo sem o apoio do PMDB. Mas pode não bastar. Nas simulações e modelos estatísticos desenvolvidos pelo Estadão Dados, outro partido é sempre um bom termômetro das votações na Câmara: o PSD. Se o partido do ministro das Cidades, Gilberto Kassab, mudar de orientação, não seriam só 24 deputados fiéis a menos. Seria um sinal forte demais para a manada parlamentar ignorar.
Ao final das contas, para manter seu mandato, Dilma precisará manter PMDB e PSD do seu lado. Custe o que custar.
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