Detenção de Bové foi uma confusão completa

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Por Agencia Estado
Atualização:

A liberação do líder camponês francês José Bové, à 1h45 desta terça-feira, encerrou a sucessão de incidentes e informações desencontradas iniciada pela detenção do ativista. O coordenador do MST João Pedro Stédile contou que havia chegado com Bové e outras pessoas à garagem do hotel quando um gerente avisou que havia cinco policiais à procura do francês, para que assinasse a notificação. O funcionário queria que Bové o fizesse em seu quarto, mas o grupo não aceitou. "Dissemos que isso devia ser uma coisa pública", afirmou Stédile. Foi tentado um acordo, para que o gerente garantisse um local, de preferência com vidros que permitissem à imprensa documentar o fato. Quando o gerente voltou e avisou que o acordo não seria possível, os policiais atacaram o líder camponês. "Agarraram-no, o empurraram para dentro do carro e saíram em disparada, por sorte de ré", relatou Stédile. Um funcionário do hotel, advertido pelos gritos dos que acompanhavam Bové, baixou a porta da garagem. "Criada a confusão, um dos agentes desceu do carro e começou a negociação." No saguão do hotel, a notícia de que Bové estava detido na garagem gerou tumulto. Fotógrafos tentaram usar a escada de serviço para chegar até lá, mas foram barrados. Houve bate-boca com funcionários e correria até a Rua Coronel Vicente, onde fica a saída da garagem. Amigos de Bové, em sua maioria franceses, aglomeraram-se junto ao portão. Comandados pelo sociólogo Emir Sader, sentaram-se na calçada, para impedir os carros de sair. Alguns chegaram a socar o portão e gritar em francês e português. De um prédio vizinho -já passava das 22h, e o barulho era grande - jogaram água sobre os ativistas. "Libertem Bové", gritavam alguns manifestantes. O impasse permaneceu até que Stédile saiu e explicou, em espanhol, que Bové não estava preso e que fora feito um acordo com os policiais. O francês iria numa perua do MST, acompanhado de outros ativistas, até a PF, seguidos pelos policiais, para assinar a notificação (os agentes não estavam com o formulário, que teve que ser feito em um computador da PF). O grupo chegou ao prédio onde funcionam dependências da Polícia Marítima, Aeroportuária e de Fronteiras, às 23h de segunda-feira. Ironia: o edifício fica nas esquinas das Avenidas Paraná e França. Na placa desta última, a explicação entre parênteses: "Homenagem à República Francesa". Prevista para durar menos de meia hora, a permanência de Bové se prolongou porque, segundo Stédile, faltavam boas condições de trabalho para os policiais. "A Polícia brasileira está tão despreparada que não tem formulário de notificação, a água que têm é da torneira e pediram para nós a Zero Hora de sábado, porque precisam anexar a foto (de Bové destruindo transgênicos) como prova", declarou. O presidente da seccional gaúcha da Ordem dos Advogados do Brasil, Valmir Batista, o representante do Conselho Federal da entidade, Jorge Garcia, a integrante da organização de direitos humanos Centro de Justiça Global, Maria Mendonça, e o presidente a Attac/França, Bernard Cassen, foram barrados. Devido ao pouco espaço e ao forte calor, o delegado Ricardo Hoff Rocha ordenou que saíssem todos que não fossem essenciais ao trabalho. Bové ficou com as advogadas Andressa Caldas e Marie Cristine Rella ep Etelin, Emir Sader e o tradutor Milton Rondó Filho, além do cônsul honorário da França, Roner Guerra Fabris. No interrogatório, Bové se recusou a responder se estivera na propriedade da Monsanto em Não-Me-Toque. "Tentaram impedir os advogados de exercer suas prerrogativas funcionais", reclamou Andressa. "Não deixaram que Bové chegasse à janela, a pretexto de que chamaria a atenção e causaria tumulto." Pouco antes da detenção, já à noite, advogados do francês estiveram na PF, mas lá lhe disseram que não havia nada contra ele. Mesmo assim, o advogado Jacques Alfonsin entrou com habeas corpus preventivo junto ao presidente do Tribunal Regional Federal local, Fábio Bittencourt da Rosa. Até a liberação do líder camponês, porém, não havia despacho. Andressa explicou que, inicialmente, o delegado Rocha apresentou um Termo de Redução de Prazo de Estadia, mas, por ele, Bové teria oito dias para deixar o Brasil (ele tem passagem marcada para esta terça-feira). "Posteriormente, o delegado voltou com um Termo de Cancelamento de Estada, fixando o prazo de um dia para que saísse do País", contou ela. Segundo o documento, o francês teria até a meia-noite desta terça-feira para deixar o País, por supostamente ter violado o artigo 26, combinado com 7, inciso II, da Lei 6.815/80. A determinação acabou revogada pela Justiça.

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