BRASÍLIA - Reconhecido como um dos líderes dos chamados "cabeças pretas", ala mais jovem do PSDB na Câmara dos Deputados, o deputado Daniel Coelho (PE) garante que as vozes críticas à aliança com o governo continuam no partido. Coelho foi um dos votos vencidos na decisão de anteontem, da executiva nacional, na qual os tucanos referendaram a permanência no governo Michel Temer. Em entrevista ao Broadcast Político, o parlamentar declara que a decisão "deixa dúvidas" sobre eventual participação do PSDB em um grande acordo político nacional contra o avanço das investigações da Operação Lava Jato no País.
"Eu acho que essa não é a hora de deixar dúvidas. É hora de deixar as instituições funcionarem", disse. Para ele, só há como mostrar que o partido está fora de um acordão político para barrar a Lava Jato “se estiver fora dos cargos (do governo)” e apoiando a agenda de reformas. “Um afastamento do governo daria moral para o PSDB.”
Daniel Coelho afirmou também que a posição do PSDB de permanecer no primeiro escalão de Temer o iguala ao PT, no que diz respeito ao discurso sobre combate à corrupção. "[A decisão] é péssima para o partido, que cai na vala comum, vai para a mesma posição do PT", enfatiza.
A seguir, os principais trechos da entrevista:
Como o senhor avalia a decisão do PSDB de permanecer no governo?
A decisão é errada porque parte de um pressuposto equivocado. Pensa numa possível aliança com o PMDB em 2018, quando, na verdade, o PSDB deveria fazer uma aliança com a sociedade. O PSDB nasceu pela vontade de pessoas como [Mario] Covas, como Franco Montoro. Eu me lembro que a frase de fundação era: 'longe das benesses, próximo do pulsar das ruas'. Essa mensagem deveria ter sido renovada: longe das benesses, longe do governo e conectado com o pulsar das ruas. Para isso a gente não precisaria entrar numa oposição radical, nem ficar contra as reformas que ajudam a economia no Brasil, mas deixar muito claro que não estamos fazendo parte desse acordo, desse modelo político que, evidentemente, é o mesmo acordo e o mesmo modelo político feito pelo PT e que fracassou. Essa decisão desconecta o PSDB desse pulsar das ruas e da sociedade. Todo o trabalho da gente (cabeças pretas) é para reconectar o PSDB a essa sua origem de partido mais preocupado em aliança com a sociedade.
Na sua opinião, por que o partido tomou essa decisão? Muitos dos cabeças pretas falam em pressão dos ministros tucanos...
Acho que há uma diferença de opiniões e de leituras distintas do mesmo processo. Eu não demonizo posições diferentes da minha, nem vou dizer que ela tem menos virtudes. Mas, para mim, esse caminho de permanecer no governo é ruim para o País porque vamos render um governo que não vai fazer nada, vai passar um ano apenas buscando se defender. E é péssimo para o partido, que cai na vala comum, vai para a mesma posição do PT. O PSDB foi muito duro no combate à corrupção do governo do PT, mas parece agora fechar os olhos para atos muito parecidos que estão ocorrendo dentro do governo do PMDB. Começamos a ter uma posição seletiva parecida com a posição do PT, do próprio PMDB e de partidos menores, como Rede Sustentabilidade e PSOL, que também são muito duros com a corrupção do PMDB, mas que chamam Dilma Rousseff de mulher honesta. Essas posições seletivas se esgotaram, a sociedade não aguenta mais. Não dá mais para apontar o dedo para o vizinho e deixar de se olhar no espelho. Por isso, esse nosso esforço de trazer o PSDB para uma posição de vanguarda, de mostrar, como exemplo, que é possível apoiar medidas de um governo sem precisar de cargos. O PSDB tem a oportunidade de dar o exemplo. Como é que nós queremos mudar as coisas com o mesmo formato?
O senhor acredita que o PSDB está perdido em relação à sua posição no espectro político brasileiro?
O PSDB está com dificuldade de se encontrar, ao sair da oposição e participar um governo que não é seu. O PSDB nasceu ao sair de um governo do Sarney e aparecer como alternativa para intelectuais e a classe média. O PSDB nasce dessa conexão e dessa independência. Essa coisa da origem do PSDB é essencial para a nossa credibilidade. Como mostrar hoje para a população que há uma acordão da política, mas que nosso acordo é com a sociedade? A gente só pode mostrar isso se a gente estiver fora dos cargos e apoiando a agenda (de reformas). Aí a gente mostra que o nosso compromisso é com o País e não com esse arrumado que está sendo feito para manter o governo Temer e, consequentemente, uma aliança de políticos para 2018. Eu não acredito nessa aliança.
O senhor está dizendo que há um grande acordo político contra o combate à corrupção e o PSDB perdeu a oportunidade de mostrar que está fora disso?
Você só mostra que está fora do acordo com suas atitudes. Nesse momento, a participação no governo não comprova que você está fazendo um acordo, mas coloca em dúvida. E eu acho que essa não é a hora de deixar dúvidas. É hora de deixar as instituições funcionarem, mostrar que as coisas realmente precisam ser esclarecidas. Nem todo mundo que está sendo acusado é culpado, que fique claro. Isso serve para o PMDB, PSDB, PT ou de qualquer partido. Não nos cabe fazer o julgamento de todo mundo. Mas o julgamento precisa ocorrer no Brasil. A gente não pode passar por esse momento sem que as pessoas sejam julgadas. Estamos numa onda de acusações e precisamos ter oportunidade de saber quem está certo e quem está errado. Eu apoio a Lava Jato, as investigações, mas alguns falam de abusos. Até para a política ter moral para falar de abusos, ela precisa também tomar suas atitudes. Um afastamento do governo daria moral para o PSDB para, onde houver abusos, o partido falar desses abusos.