Deputado bolsonarista propõe transformar Rio em capital federal

Daniel Silveira (PSL-RJ) propôs PEC sugerindo transformar cidade em segundo distrito federal e sede do Congresso Nacional

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Por Renato Vasconcelos
Atualização:

O deputado federal Daniel Silveira (PSL-RJ) apresentou uma Proposta de Emenda Constitucional (PEC) para devolver o status de capital federal à cidade do Rio de Janeiro. Pela proposta, o Rio seria considerado um Distrito Federal, assim como Brasília, e passaria a ser sede do Congresso Nacional.

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O texto da PEC foi divulgado pelo próprio parlamentar em seu site oficial, mas ainda não está em tramitação. De acordo com o Protocolo da Secretaria-Geral da Mesa da Câmara dos Deputados, a proposta ainda não foi numerada ou inserida no sistema. São necessárias as assinaturas de 171 deputados para que uma PEC possa ser protocolada.

Entre as razões apontadas por Silveira, estariam a incapacidade dos políticos cariocas em oferecer soluções para serviços públicos nas áreas de saúde, educação e "principalmente segurança pública". "Federalizar o Rio é a melhor saída para superar o crônico problema de insegurança nacional", escreve o parlamentar.

Rio de Janeiro passaria a se chamar Distrito Federal do Rio de Janeiro, segundo PEC apresentada por deputado. Foto: Estadão

Além de uma solução para os problemas do Rio, no entanto, Silveira garante que a medida seria significativa para a União, acabando com o problema de "isolamento" de Brasília e fortalecendo a independência dos Poderes "dando mais autonomia física ao parlamento brasileiro."

"No Brasil, o presidente despacharia regularmente na cidade federal, devolvendo ao Rio pastas ministeriais", escreveu o deputado.

Na justificativa feita aos parlamentares, o deputado descreve a "queda vertiginosa" de importância política e econômica do Rio desde a mudança da capital federal para Brasília, na década de 1960, ponderando que, ainda assim, a cidade continua sendo "mais Capital que Brasília".

"Com todo esse paradoxo, é inconteste que o Rio de Janeiro é mais capital que Brasília, pois encontram-se as bases de instituições federais e ministérios, o Rio detém a maior quantidade de servidores federais do país: são 259 mil contra 181 mil em Brasília, sem contar os funcionários das estatais, que concentram na cidade nada menos que 70% do seu patrimônio líquido."

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Quando ainda eram candidatos, o deputado federal Daniel Silveira(à esquerda)e o deputado estadual Rodrigo Amorim, ambos do PSL-RJ, quebraram uma placa que homenageava a vereadora Marielle Franco (PSOL), assassinada em março de 2018 Foto: Reprodução

Daniel Silveira ficou nacionalmente conhecido em 2018, após destruir uma placa que homenageava a vereadora Marielle Franco, morta em um atentado no Rio. Eleito na onda bolsonarista, o deputado atualmente é alvo do inquérito das fake news, aberto pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Prefeito vira governador, vereador vira deputado e Niterói vira capital

A PEC também avança sobre questões organizacionais do "novo Distrito Federal" e do Estado do Rio de Janeiro após a mudança. Um dos dispositivos propostos acrescenta um artigo aoAto das Disposições Constitucionais Transitórias.

Segundo o parágrafo único do art. 115 do ADCT, o "Distrito Federal do Rio de Janeiro" herdaria da prefeitura do Rio e da Câmara Municipal seus primeiros representantes. O prefeito assumindo como governador do "DFRJ" e os vereadores como Deputados Distritais.

Ponte Rio-Niterói Foto: Ricardo Zerrenner/Riotur/Divulgação

Já o Estado do Rio de Janeiro, privado da cidade do Rio, passaria a ter como sede de governo a cidade de Niterói, que ganharia status de capital. Também seriam criados "mecanismos de compensação e auxílio" para a reinstalação do governo do Estado em Niterói.

A PEC ainda propõe que questões sobre a criação do "Rio de Janeiro-DF", como a repartição de bens e servidores com o Estado do Rio de Janeiro, seja tratada por lei complementar.

Já as dívidas e restos a pagar da atual cidade do Rio seriam divididas, em sistema de cota parte, entre o Estado e o DF.

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Precedentes

Ainda justificando a medida, Silveira cita como exemplos Bonn, na Alemanha - cidade federal que é sede de ministérios do país -, a África do Sul, que tem três capitais (Pretória, Cidade do Cabo e Bloemfontein) e outros exemplos como Rússia, China, Chile e Coreia do Sul.

Juridica e politicamente questionável

Para Floriano de Azevedo Marques Neto, professor de direito administrativo e diretor da faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP), o meio pelo qual o deputado busca validar sua ideia - PEC - é correto, no entanto, deve encontrar resistência, tanto parlamentar quanto jurídica.

"O pacto federativo é cláusula pétrea, então Brasília e o Estado do Rio de Janeiro, que estão envolvidos diretamente na medida, certamente questionariam qualquer medida nesse sentido. A Constituição não prevê o desmembramento de um município de uma Unidade Federativa, nem a divisão do Distrito Federal. O próprio STF, acredito, não permitiria", explica o professor.

Para além da questão procedimental, Marques Neto aponta que manter dois Distritos Federais teria impactos orçamentários ao governo federal, que teria que se comprometer com novos gastos para manter desde servidores à manutenção de estruturas físicas. Além disso, o professor questiona a argumentação utilizada pelo parlamentar.

"Se o número de servidores públicos em uma localidade ou a incapacidade dos políticos de resolverem os problemas de suas regiões forem razões fortes o suficiente para motivar a criação de um novo Distrito Federal, ficaremos vítimas das circunstâncias e de tempos em tempos teremos novos DFs sendo criados."

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"Antes de tudo, parece-me muito mais uma tentativa do parlamentar de mostrar serviço para seus próprios eleitores, que seriam, talvez, os mais beneficiados com a medida, do que algo viável propriamente."

Rio busca compensação

A proposta do deputado não é a primeira a propor uma revisão da mudança da capital para Brasília. Em 2019, a deputada Clarissa Garotinho (PROS-RJ) conseguiu as assinaturas necessárias e protocolou uma PEC buscando uma reparação financeira ao Estado do Rio de Janeiro pelos danos causados por dois eventos: a mudança da capital para o DF e a fusão dos então Estados do Rio de Janeiro e da Guanabara.

A proposta prevê o pagamento de cerca de R$ 70 bilhões ao Estado do Rio nos próximos 10 anos. O recurso seria retirado do Fundo Constitucional do Distrito Federal, que seria dividido entre as duas Unidades Federativas pelo prazo definido. Atualmente, a proposta está na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, e é relatada pelo deputado federal Fábio Trad (PSD-RJ). Ao contrário do proposto por Silveira, a proposta de Clarissa não propõe a federalização do Rio.

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