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Delator diz que Odebrecht entregou dinheiro vivo para comprar tempo de TV para chapa Dilma/Temer

Alexandrino Alencar disse que a empreiteira pagou um total de R$ 21 milhões, proveniente de caixa 2, a três partidos políticos para comprar tempo de TV para a chapa em 2014

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Foto do author Beatriz Bulla
Por Rafael Moraes Moura e Beatriz Bulla
Atualização:

BRASÍLIA - Em depoimento prestado ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht Alexandrino Alencar disse que a empreiteira pagou um total de R$ 21 milhões em dinheiro vivo a três partidos políticos para comprar tempo de TV para a chapa de Dilma Rousseff (PT) e Michel Temer (PMDB) em 2014. O dinheiro, proveniente de caixa 2, foi entregue em hotéis e flats.

A ex-presidente Dilma Rousseff e o então seu vice, Michel Temer Foto: Dida Sampaio/Estadão

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Conforme antecipou o Estado, Alexandrino Alencar disse ao TSE que a empreiteira pagou R$ 7 milhões para cada um desses três partidos: PROS, PCdoB e PRB, em um total de R$ 21 milhões. A reportagem obteve nesta quinta-feira (23) a íntegra do depoimento do ex-executivo da Odebrecht, mantido sob sigilo.

De acordo com Alencar, cada um desses três partidos eram chamados por codinomes: PROS era “onça”; PC do B, “vermelho”; e PRB, “doutor”.

“Eram inicialmente cinco partidos que houve essa demanda para gente contribuir via Caixa 2, e eu fiquei encarregado de três partidos. Então, três partidos foram feitos por mim, a saber: o PROS, o PCdoB e o PRB”, informou Alencar ao ministro Herman Benjamin, relator da ação que apura se a chapa Dilma-Temer cometeu abuso de poder político e econômico para se reeleger em 2014. Os outros dois partidos do bloco, PDT e PP, tiveram tratativas conduzidas por outros executivos da empreiteira, segundo o relato do delator.

De acordo com Alexandrino Alencar, a demanda surgiu do então tesoureiro da campanha de Dilma, Edinho Silva (PT), em reunião ocorrida em 11 junho de 2014, com a presença de Marcelo Odebrecht. O encontro ocorreu no escritório da empreiteira. De acordo com o delator, Edinho chegou com a proposta pronta dos valores a serem acertados e a indicação de que o pagamento seria feito via caixa dois.

Questionado pelo ministro Herman Benjamin se havia ficado claro os termos do pedido, Alexandrino foi categórico: “Sim, para a compra dos partidos. E tanto é, depois quando eu contatei as pessoas que o Edinho me solicitou pra falar, era claramente uma compra do tempo de TV, que, se não me engano, isso deu, aproximadamente, 1/3 (um terço) a mais de horário de TV para a chapa.”

Fontes que acompanham as investigações consideram o depoimento de Alexandrino Alencar um dos mais delicados para Dilma e Temer, já que em 2015 o TSE mudou a sua jurisprudência e passou a reconhecer a compra de apoio político como uma forma de abuso de poder econômico.

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Queixas. De acordo com Alexandrino, também havia queixas dos partidos, de que os pagamentos fossem mais rápidos. “Às vezes, os partidos voltavam para o Edinho, o Edinho me ligava e dizia: olha, Alexandrino, estão me ligando do partido de fulano de tal, estão preocupados”. Por conta das cobranças, o contato era frequente com Edinho. De acordo com o delator, o “fluxo” dos pagamentos foi objeto de mais dois encontros em que Marcelo Odebrecht estava presente, antes do segundo turno eleitoral.

Em relação à cobrança dos partidos beneficiados, Alexandrino Alencar informou os nomes dos seus interlocutores. “Pelo PROS, o meu interlocutor foi o presidente do PROS, Eurípedes Junior; pelo PCdoB, foi o senhor chamado Fábio (...), que é de Goiás aqui; e pelo PRB, o atual Ministro Marcos Pereira, que era presidente do PRB.”

Indagado por que a empreiteira fez a distribuição dos recursos via caixa 2 e não caixa 1, Alexandrino rebateu: “Eu acho que a pergunta não é para mim. Pergunta para ele (Edinho). Eu acredito pelas dificuldades de... talvez não querer aparecer os recursos nos partidos. Não sei. Aí é uma negociação dele com os partidos”,

O depoimento de Alexandrino também expõe a operacionalização do pagamento de caixa 2. A disponibilização dos recursos em espécie e a entrega do dinheiro era operacionalizada pelo Setor de Operações Estruturadas da empreiteira, conhecido como o departamento da propina. Ele afirma, por exemplo, que onde os pagamentos eram feitos era um assunto tratado com a secretária do setor, Maria Lúcia Tavares.“Eu contatava a pessoa da Operações Estruturadas (conhecido como departamento da propina) e dizia: olha, temos essa demanda, temos que fazer uma programação - existia uma programação. E aí variava: às vezes a pessoa, o partido, ficava num hotel e o recurso ia para o hotel, ou tinha um lugar fixo em São Paulo, um flat, onde as pessoas dos partidos iam lá buscar. Aí era uma conveniência operacional, que aí eu não me metia nisso”, descreveu o ex-executivo da Odebrecht.

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Reforma política. Ao final do depoimento, Herman Benjamin quis saber a opinião de Alexandrino Alencar sobre o funcionamento das eleições e a corrupção no País.

"O senhor, por exemplo, neste trabalho que fez à frente da Odebrecht, em algum momento se questionou se aquilo era certo, era errado e também as suas observações sobre: é possível melhorar? É possível se pensar de alguma forma em controlar doações empresariais porque este vem a ser o grande dilema", questionou o ministro.

Alexandrino respondeu ao ministro que, sem reforma política, o "Brasil vai patinar". "Essa questão dos marqueteiros é que gera muito essa questão dessas doações Caixa 2. Tudo tem que ser justificado por aí. Eu acho que muito disso está nesse programa de televisão que não sei qual é a eficácia para a população, mas é para o marqueteiro e para as redes de televisão", afirmou o ex-diretor de relações institucionais da Odebrecht.

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Defesas. Em resposta encaminhada ao TSE na segunda-feira, o PRB disse não ter recebido caixa 2, propina, ou "recurso financeiro de qualquer origem ilícita" para apoiar a chapa Dilma-Temer nas eleições de 2014. O PCdoB informou o TSE que o apoio à candidatura de Dilma em 2014 se deveu a "identidade de projetos político-ideológicos".

Em entrevista recente ao Broadcast, Edinho Silva negou participar de irregularidades na campanha e questiona "que poder" teria para fazer determinações à Odebrecht.

"Eu nunca participei de uma reunião cuja pauta fosse de caixa 2 e, se houve doação por caixa 2 para outros partidos, foi opção da empresa", disse Edinho na entrevista. A defesa da presidente Dilma Rousseff emitiu nota nesta quinta-feira na qual destaca que a vida pública da petista é "limpa e honrada" e critica vazamentos de informações protegidas por segredo de justiça.