Dantas diz a juiz que nada sabe sobre suborno

Banqueiro tenta se desvincular de dinheiro apreendido com lobista

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Foto do author Fausto Macedo
Por Anne Warth e Fausto Macedo
Atualização:

"Não tenho conhecimento", afirmou o banqueiro Daniel Dantas ontem na Justiça ao ser interrogado sobre a tentativa de suborno de um delegado da Polícia Federal em troca de arquivamento de inquérito sobre as atividades do Grupo Opportunity, que fundou e preside. Alvo maior da Operação Satiagraha - investigação federal sobre suposto esquema de evasão de divisas, lavagem de dinheiro, fraudes e formação de quadrilha -, Dantas é réu em ação penal por corrupção ativa e pode ser condenado até a próxima semana a uma pena que varia de 2 anos a 12 anos de reclusão. "As acusações são totalmente infundadas e delirantes", rebateu, em sessão tensa que se arrastou por cerca de 10 horas no 17.º andar do Fórum Federal de São Paulo. Mas a versão de Dantas não convence seu acusador, Rodrigo de Grandis, procurador da República. "As provas produzidas até agora dão sustentação para eventual pedido de condenação", advertiu Grandis, em alusão ao R$ 1,18 milhão em dinheiro vivo encontrado no apartamento do lobista Hugo Chicaroni, que teria feito a abordagem do delegado da PF a mando do banqueiro. O rastreamento que o procurador conduziu indica que o dinheiro saiu do caixa do Opportunity. A audiência de interrogatório e instrução na 6.ª Vara Criminal Federal foi marcada por um ambiente nervoso. Dantas foi questionado durante mais de cinco horas pelo juiz Fausto Martin De Sanctis. Ele chegou ao fórum disposto a seguir à risca a orientação expressa de seus advogados para se manter em silêncio - estratégia que já havia adotado em agosto, quando se viu pela primeira vez diante do magistrado que mandou prendê-lo duas vezes, no início da Satiagraha. Por duas vezes ele acabou beneficiado por decisões do ministro Gilmar Mendes, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), que lhe devolveu a liberdade. Dantas surpreendeu o juiz, em certos momentos, porque respondeu a algumas perguntas. "Contrariando a orientação da minha defesa, ouvi de outros advogados que seria bom responder porque o senhor (juiz) teria preconceito contra a minha pessoa", disse. JULGAMENTO Sessenta foram as perguntas que Sanctis fez ao réu e poucas ele respondeu. Evasivo, não soube dizer nem mesmo dados relativos ao valor de seu patrimônio, os bens que detém no Brasil e no exterior. Nada explicou sobre o dinheiro encontrado com Chicaroni. "Na perspectiva do Ministério Público Federal, a prova sai mais forte para pedir a condenação", destacou o procurador Rodrigo de Grandis. Também foi interrogado Humberto Braz, ex-presidente da Brasil Telecom, que negou envolvimento na trama. Segundo a denúncia, Braz e Chicaroni teriam feito a abordagem ao delegado Victor Hugo Rodrigues, da PF, por ordem de Dantas. Ação controlada da PF, autorizada pela Justiça, registrou encontros dos supostos emissários de Dantas com o delegado no restaurante El Tranvia, em São Paulo. Braz disse ao juiz que não sabia que Victor Hugo era delegado. "Pensava que fosse advogado." Nélio Machado, criminalista que coordena a defesa do banqueiro, acredita que o processo está sendo conduzido de "forma precipitada". Com receio de que Dantas saísse condenado e preso da 6ª Vara Federal, a defesa tentou suspender a audiência de ontem por meio de habeas corpus que impetrou perante o Tribunal Regional Federal e o Superior Tribunal de Justiça, mas não teve êxito. Dantas chegou à Justiça de São Paulo, às 14h30. Machado disse que instruiu o banqueiro a não dizer "absolutamente nada". Criminalista com larga experiência nos tribunais, Machado declarou que pretendia impugnar a audiência. O juiz De Sanctis intimou outra vez o dono do Opportunity porque a legislação processual penal sofreu alterações a partir da edição da Lei 11.719/08, que deslocou a etapa dos interrogatórios para o final da demanda. O novo modelo autoriza o magistrado a conduzir, em uma única sessão, depoimentos dos acusados, debates entre acusação e defesa e até promover o julgamento. Machado acha que o processo por corrupção não poderia estar nas mãos do juiz De Sanctis, que dirige vara especializada em ações sobre crimes de lavagem de capitais. A audiência será retomada amanhã, com o depoimento de Chicaroni.

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