''Corre-se o risco de uma hiperconcentração de poder''

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Por Redação
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A atuação cada vez mais intensa do Supremo Tribunal Federal (STF) nas decisões políticas tem provocado uma concentração de poderes nas mãos dos 11 ministros e a distorção do sistema republicano, afirma o deputado Flávio Dino (PC do B-MA). Ele quer acabar com a vitaliciedade dos ministros, fixando prazo de permanência no cargo, como forma de evitar a submissão da política por uma "aristocracia judiciária". Por que o sr. diz que os ministros do Supremo devem ter mandatos? Nós tínhamos um tribunal historicamente mais técnico que político. Na medida em que o Judiciário, em geral, e o STF, de modo mais evidente, assume crescentemente o papel de arbitramento de outros conflitos, que não aqueles classicamente submetidos ao Judiciário, mas sim conflitos que têm uma dimensão política, econômica e social cada vez mais ampla, a consequência para mim é que deve ter uma regra que permita uma alternância. Se há um tribunal com papel político mais alto e é vitalício, corre-se o risco de uma hiperconcentração de poder e, portanto, um desequilíbrio entre os Poderes do Estado. Com o Supremo assumindo crescentemente um papel político, um papel de supremacia sobre os outros Poderes, que haja mandato. Esse é o caminho democrático de alternância para que outras maiorias tenham possibilidade de se formar. Como deve ser o mandato? Minha proposta seria de um mandato de 11 anos. Ele não pode ser muito longo, porque equivaleria a vitaliciedade, mas não pode ser muito curto, porque teríamos instabilidade institucional, sem o tempo que permita a consolidação de orientação jurisprudencial e o amadurecimento das teses. Na Justiça Eleitoral, que o mandato é de dois anos, há um nível de instabilidade muito alto e a jurisprudência muda muito. As competências clássicas devem migrar para o Superior Tribunal de Justiça, como instância mais técnica. É a busca do modelo continental europeu, em que todos tribunais constitucionais têm mandato. Como o ministro seria escolhido? A escolha deve ser política, ou seja, pelo presidente da República, como hoje, introduzindo um sistema de lista feita pela comunidade jurídica e com a participação do Congresso. O que passaria para o STJ? Alguns temas que hoje vão ao Supremo e que são objeto de muita controvérsia devem ficar no STJ. Por exemplo, a competência criminal. O Supremo ficaria com essa competência apenas no que se refere a presidente e parlamentares. O STF julgar casos criminais, por mais relevantes, é atípico para tribunal constitucional. Como o caso de Daniel Dantas? Entre outros. Na verdade, Daniel Dantas é apenas um réu conhecido. Mas lá também têm João, Pedro e Maria. Se você pegar a pauta do Supremo, vai ver que o tribunal julga várias causas criminais por ano. Isso é uma atipicidade. A competência criminal do STF deve ser excepcionalíssima, até para que ele tenha tempo de se dedicar ao papel de definir grandes questões, como o uso de células-tronco embrionárias e o caso do aborto em casos de anencefalia. Está correto o Judiciário definir questões por causa da omissão do Legislativo? Houve um esvaziamento da política e a crise no processo decisório é a causa maior. De nada adianta se lamentar diante disso, é uma relação política, portanto, de poder e de força. O Judiciário avançou na competência do Legislativo por inércia do Congresso. Quando o Congresso vota, o partido que perde recorre ao STF... É outro ponto de reflexão, o modo como esgarçou em demasia a relação entre o governo e a oposição. É antológica a atitude da Mesa do Senado de levar ao STF um conflito interno do Congresso acerca da promulgação de uma emenda constitucional (que aumentou o número de vereadores). Esse é o exemplo máximo da chamada tribunalização da política, com o Senado e a Câmara litigando no Supremo. É um caso inédito no planeta. D.M.

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