‘Contrabando’ em projeto de lei libera concessão de terminais, piscinões e viadutos em São Paulo

PL da prefeitura de Fernando Haddad que regularizava terreno para Museu Judaico foi modificado para permitir até construção de shoppings

Por Bruno Ribeiro
Atualização:

SÃO PAULO - Um projeto de lei apresentado na Câmara Municipal de São Paulo para, originalmente, conceder um terreno municipal para o Museu Judaico, no centro da cidade, terminou por liberar a concessão à iniciativa privada dos piscinões municipais, a construção de shoppings em terminais de ônibus e a exploração comercial dos baixos de viadutos, além de liberar organizações sociais a gerenciar equipamentos da Secretaria Municipal de Cultura.

O projeto de lei foi aprovado nesta quarta-feira, 6, em primeiro turno, e terá de ser votado mais uma vez antes de ir para a sanção do prefeito Bruno Covas (PSDB) , que segue internado no Hospital Sírio-Libanês tratando de um câncer no sistema digestivo.

Fachada da Câmara Municipal de São Paulo Foto: Marcos Bezerra / Futura Press

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A manobra que incluiu tantos ítens na discussão sobre o museu judaico é chamada na Câmara de “contrabando” ou “jabuti” e provocou reações na oposição, que agora quer audiências públicas para discutir esses assuntos antes da votação final.

O projeto havia sido apresentado em 2016, ainda pelo prefeito Fernando Haddad (PT), e regularizava o uso do terreno do museu judaico, que fica na Avenida 9 de Junho. O espaço já era usado desde 2001, autorizado pelo poder público por um decreto, mas faltava a formalização da concessão da área, que tem 300 m². 

Entretanto, a base de apoio da gestão Covas na Câmara decidiu incluir, naquele texto, autorização para outros três tipos de concessão, que já chegaram a ser discutidas pela Câmara durante o governo João Doria (PSDB), e fazem parte do Plano Municipal de Desestatização. 

Pouco antes de Doria renunciar para disputar as eleições para governador do Estado, sua base na Câmara apresentou um projeto que autorizava concessões de uma série de itens da cidade: o serviço funerário municipal, os cemitérios, os terminais de ônibus, os piscinões e os viadutos. Entretanto, houve um entendimento jurídico de que, como o serviço funerário é regido por uma lei própria, sua concessão teria de ser tratada em um projeto exclusivo dele. E os demais itens foram retirados do projeto.

Há três semanas, a base governista acordou com os demais vereadores que o texto do museu judaico seria levado à votação, na forma de um texto substitutivo. No plenário, na hora da votação, ao ler o texto, os vereadores do centro e da oposição entenderam que os itens retirados do Plano de Desestatização haviam sido incluídos no projeto do museu, e deixaram de marcar presença. A sessão terminou suspensa por falta de quórum. 

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Agora, o Executivo conseguiu aprovar o projeto por meio de um acordo: em outro projeto do governo, que prevê a venda de 41 terrenos municipais, uma emenda irá retirar dois terrenos da lista. São áreas onde há escolas municipais em funcionamento. 

“É um projeto votado em primeira votação e que foi apresentado a todos os vereadores já com uma certa antecedência. Foram duas semanas, já é de conhecimento de todos o objeto desse projeto”, disse o líder do governo, vereador Fábio Riva (PSDB). “Não acredito que seja menos transparente, porque ainda teremos uma audiência pública para discutir esse projeto”, afirmou. “Em segundo turno, vai ter como a população entender.”

Riva afirma que o Plano Municipal de Desestatização já é de conhecimento da cidade, e que a opção por agir dessa maneira não atrapalha as discussões. “Efetivamente, é de conhecimento da população”, concluiu. 

A oposição discorda. “Lamentamos esse método. Um projeto que a gente é a favor, a concessão da área para o museu, mas se aproveita esse projeto e se enfia questões que merecem maior debate”, disse o vereador Antonio Donato (PT). “Isso sem ter nenhuma audiência Pública. Esse método dessa gestão de se lidar com quatro, cinco assuntos é equivocado.”

Mudanças

No texto votado nesta quarta, a Prefeitura fica autorizada a liberar uma empresa que queira gerenciar um terminal de ônibus a construir edifícios acima do terreno do terminal e explorar a área, seja construindo um shopping, um hotel ou outro prédio, por um prazo de 35 anos. 

Em outro ponto, autoriza a contratação de uma concessionária para ficar responsável pela manutenção dos piscinões, a exemplo do que já ocorre com a coleta de lixo. A concessionária é remunerada por manter os locais limpos, mas tem que fazer investimentos para melhorar a drenagem.

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No caso baixo dos viadutos, empresas poderão obter o direito de explorar comercialmente as áreas, montando lojas. Um projeto piloto está em andamento em três viadutos da zona oeste.

Por fim, Organizações Sociais de Cultura (OSs) poderão ser contratadas pelo poder público para manter a operação de equipamentos da área, como museus, teatros e bibliotecas, a exemplo do que Prefeitura e governo do Estado fazem na área da saúde.  

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