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Conselhos de meio ambiente enfrentam impasse em SP

Órgãos que ajudam a Prefeitura na elaboração de políticas públicas na área aguardam eleição de conselheiros para retomar atividade

Por Roberta Vassallo
Atualização:

Exemplo bem-sucedido de participação popular e da sociedade civil em iniciativas da Prefeitura de São Paulo na área ambiental, os Conselhos Regionais de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz (Cades) têm enfrentado obstáculos para manter seu funcionamento em meio à pandemia de covid-19. Além da redução da atuação dos conselhos por causa das restrições sanitárias, a eleição de conselheiros, em agosto, que marcaria o início da retomada das atividades, foi cancelada por suspeita de fraude.

Organizada pela primeira vez por uma plataforma de votação online, a eleição teve “problemas técnicos” que levaram à anulação do processo um dia depois do encerramento da disputa. Integrante do Fórum Verde Permanente, Francisco Bodião disse que, entre as “falhas”, houve a apresentação da contagem de votos enquanto a eleição ainda estava em andamento e a falta de verificação da identidade de eleitores registrados no site da plataforma. Por causa de uma instabilidade da plataforma, no dia da votação também ocorreu um erro que permitiu que eleitores votassem em mais de três candidatos – acima do limite estabelecido pelo regulamento.

Integrantes do conselho regional da Vila Mariana: construção de jardins de chuva para ajudar no combate a alagamentos. Foto: Alex Silva/Estadão

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O Fórum Verde Permanente acompanha a atuação do poder público na questão ambiental e mantém diálogo com Prefeitura e conselhos. Para Bodião, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente tem preterido a eleição de conselheiros e desconsiderado as demandas da sociedade civil. Segundo ele, o cancelamento da disputa expõe a falta de valorização da área ambiental na gestão municipal e da participação popular na administração pública. “A Secretaria do Meio Ambiente vem deixando de ser importante, o que é uma contradição pensando no cenário global.” De 2020 para 2021, a fatia do orçamento destinada à pasta diminuiu de 0,77% para 0,64%, e encolheu R$ 15 milhões.

Indefinição. Agora, integrantes dos conselhos regionais, candidatos e moradores da cidade engajados na causa ambiental aguardam uma definição da Prefeitura sobre quando e como ocorrerá uma nova eleição, que já havia sido adiada no ano passado para 2021. Integrantes da gestão atual afirmaram, ainda, que essa indefinição prejudica o trabalho dos conselhos que já estava enfraquecido desde 2020, além de comprometer o engajamento das comunidades locais na participação nos órgãos. “Isso desmobiliza bastante”, disse a conselheira do Cades Butantã Luciana Murakami.

A Prefeitura ainda não estabeleceu um meio para a nova votação, que, até 2018, ocorria presencialmente, via subprefeituras. A previsão é de que a disputa seja realizada novamente em novembro, mas não há consenso. “A Comissão Eleitoral vai deliberar sobre o formato do pleito”, informou, em nota, a Secretaria do Verde e do Meio Ambiente.

A secretaria afirmou também que “tem por compromisso a lisura das eleições unificadas dos Cades Regionais”. “A Secretaria do Verde e do Meio Ambiente está trabalhando com outras secretarias envolvidas, comissão eleitoral e representantes da sociedade civil para que todas as informações sejam divulgadas com total transparência. No momento, os mandatos dos atuais conselheiros foram estendidos”, disse a pasta.

Parceria. A atuação do Cades Vila Mariana, por exemplo, mostra como parcerias com a sociedade civil e a população funcionam na elaboração de políticas públicas, desde que bem geridas. Um projeto piloto serviu de base para o desenvolvimento do Plano Municipal de Arborização Urbana, que teve início na região, na zona sul da capital, em 2016, por meio da atuação do conselho regional. Em sua quarta fase, no ano passado, a ação resultou na construção de jardins de chuva pelo bairro e contou com o auxílio de moradores e associações da sociedade civil, com atividades inclusive durante a pandemia (mais informações na página ao lado).

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Em outras regiões, no entanto, além das dificuldades impostas pela crise sanitária e pelo adiamento da eleição de conselheiros, os conselhos regionais enfrentam gargalos para implementar projetos de preservação ambiental na cidade. Em Ermelino Matarazzo, na zona leste, o Cades ainda tenta a liberação de um terreno para a construção de um viveiro, algo com que outros conselhos regionais já conseguiram, segundo o órgão. “A ideia seria fazer plantios pelo bairro para amenizar o calor durante o dia”, afirmou o conselheiro Marcos Freitas.

Para entender: Meta é engajar a população

Criados em 2009, os Conselhos Regionais de Meio Ambiente, Desenvolvimento Sustentável e Cultura de Paz são subordinados às subprefeituras de São Paulo e têm como meta engajar a população na discussão e formulação de propostas socioambientais. Atualmente, são 32 Cades Regionais – um para cada subprefeitura.

Entre os objetivos dos órgãos estão a proposição de projetos e recomendações à política municipal de meio ambiente; o apoio a ações de conservação e promoção do desenvolvimento sustentável; o incentivo à participação social em atividades das subprefeituras relacionadas ao meio ambiente; e o apoio à implementação da Agenda 21 (ONU) local e à agenda ambiental da administração pública. Os Cades também apoiam o Plano Diretor Estratégico e Planos Diretores Regionais em questões de meio ambiente e encaminham propostas e críticas relacionadas à área.

Integram os Cades conselheiros eleitos da sociedade civil e integrantes da gestão municipal; o subprefeito da região comanda o órgão.

Iniciativa local virou política municipal

Diante da demanda crescente de conservação ambiental e combate aos efeitos do aquecimento global, os conselheiros da sociedade civil dos Cades tentam manter o desenvolvimento de ações e políticas para a melhoria dos espaços naturais no meio urbano.

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Elisa Rocha é arquiteta e urbanista e decidiu usar sua experiência com licenciamento ambiental para atuar em prol da gestão verde em 2016, quando foi eleita conselheira pela primeira vez no Cades de seu bairro, Vila Mariana. “A ideia era partir de ações práticas que envolvessem a população e mostrassem que é possível mudar algumas abordagens, inclusive de políticas públicas.”

Ela articulou com os demais conselheiros plantios coletivos que acabaram se expandindo e passaram a envolver representantes “externos”. O grupo também ajudou a desenvolver um corredor para polinizadores na calçada em frente ao Instituto Biológico. A partir das ações bem-sucedidas, o Cades foi convidado a implementar um projeto-piloto de arborização de calçadas como teste para a política municipal que a Prefeitura desenvolveria posteriormente no restante da cidade. A quarta etapa, no fim de 2020, resultou na construção de jardins de chuva para controle de alagamentos.

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Lixo. No Cades Santo Amaro, os esforços têm se concentrado principalmente na coleta seletiva. Um projeto de coleta em prédios públicos feito pelo conselho junto com a subprefeitura contou com a colaboração da estudante de pedagogia Marília Barros na elaboração do material. Ela começou a atuar como voluntária no Cades do bairro onde mora desde criança em 2018 e trouxe o conhecimento adquirido em cursos de sustentabilidade e gestão ambiental. “Sempre fui ligada à questão ambiental, mas nos últimos anos, com tantas notícias catastróficas, comecei a me envolver mais e a olhar para o que podemos fazer para solucionar.”

Em São Paulo, existem 32 Cades Regionais ligados às subprefeituras. A composição é feita por oito conselheiros titulares e oito suplentes da sociedade civil eleitos a cada dois anos, além de oito integrantes da administração municipal, incluindo o respectivo subprefeito. O objetivo é ajudar a desenvolver políticas públicas ambientais para a cidade.

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