PUBLICIDADE

Comissão Arns exige investigação de massacre em favela do Rio

Grupo de intelectuais, juristas e lideranças políticas de governos anteriores quer apuração sobre morte de 15 jovens no Morro do Fallet, no Rio, em fevereiro; outra área de atuação será a questão indígena

Por Paulo Beraldo
Atualização:

A Comissão Arns, grupo formado por 20 lideranças para denunciar violações de direitos humanos, anunciou nesta terça-feira, 9, que vai exigir investigações sobre as 15 mortes ocorridas no Morro do Fallet, no Rio.

Na ocasião, policiais cercaram uma casa em que, segundo uma denúncia, haveria criminosos. A PM diz que eles “reagiram à voz de prisão”, mas a mãe de um deles afirma que não houve reação. Os policiais responsáveis pela ação receberam homenagens na Assembleia Legislativa do Rio. Segundo o advogado Antonio Cláudio Mariz de Oliveira, é necessário sensibilizar a sociedade em campanhas contra esse tipo de violência.

Reunião da Comissão Arns no auditório da Livraria Martins Fontes, na Avenida Paulista, em São Paulo. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

PUBLICIDADE

“É a repetição do que já ocorreu e o prenúncio do que pode vir a ocorrer com mais intensidade. É algo de altíssima gravidade, uma barbárie social”. “É algo de altíssima gravidade, uma barbárie social”. A Comissão está em contato com a OAB-RJ, com parlamentares, com a Procuradoria da Justiça do Rio e o MP para apurar.

O grupo também afirmou que acompanhará a construção de uma linha de transmissão entre as cidades de Boa Vista e Manaus, com impacto na comunidade indígena Waimiri-Atroari, que vive no sul de Roraima e norte do Amazonas.

Os integrantes da Comissão também criticaram o pacote anticrime proposto pelo ministro da Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro, e disseram que homenagens públicas de líderes políticos a autoridades de segurança pública que mataram criminosos não são positivas. 

“O pacote anticrime contém elementos que podem isentar uma pessoa das suas responsabilidades e, de outro lado, causar vítimas entre nós, entre as pessoas”, disse o advogado Belisário dos Santos Júnior e ex-secretário de Justiça de São Paulo. “É praticamente uma licença para matar”. 

Já o diplomata e ex-secretário de Direitos Humanos Paulo Sérgio Pinheiro disse que o projeto de Moro é um "liberou geral" e afirmou que "a celebração da morte não é política de segurança", em referência a homenagens a ações policiais que causaram mortes. 

Publicidade

Ele afirmou, ainda, que as forças de segurança de não devem ser tratadas com ideologia, quando falava sobre o caso de integrantes do Exército que atiraram 80 vezes em um veículo e mataram um músico. "Precisam de experiência, inteligência, comando. E não de discurso", disse. 

Indígenas em Roraima 

Em relação à questão indígena, o grupo entende que as reservas e o processo de demarcação têm sido alvo de críticas de diferentes setores da sociedade, notadamente políticos. Além disso, há relatos de ataques em comunidades, com destruição de estruturas e plantios. “Tudo isso faz com que haja um discurso que recoloca o índio como um entrave ao desenvolvimento. Um discurso regressivo, passadista e carente de fundamentos”, disse a jornalista Laura Greenhalgh. Os membros da Comissão vão monitorar, dar visibilidade e cobrar providências junto aos diferentes níveis de poder para que haja resposta.

Especificamente, a Comissão abordará a interligação elétrica entre Boa Vista e Manaus, que já existe e vem sendo implantada, e vai impactar a etnia Waimiri-Atroari. Na extensão do linhão, há 120 km pertencentes ao grupo. O empreendimento foi classificado pelo governo como de interesse da defesa nacional, já que hoje algumas cidades da região dependem de energia elétrica vinda da Venezuela.

Com o microfone, o diplomata Paulo Sérgio Pinheiro, líder da Comissão Arns. Ao seu lado, o advogado Antônio Mariz de Oliveira. Foto: Tiago Queiroz/Estadão

PUBLICIDADE

Apartidária 

Paulo Sérgio Pinheiro, que lidera o grupo, ressaltou que a Comissão não é um movimento de oposição ao governo e é apartidária. “A centralidade da nossa comissão é defender a manutenção de uma política de direitos humanos que prevaleceu nos 30 anos depois da Constituição de 1988. E outro braço é impedir o retrocesso. O Estado é um interlocutor natural”, afirmou. Pinheiro ressalta que o foco da Comissão será atuar no direito à defesa das vítimas, sejam civis ou militares.

Na avaliação da cientista política Maria Hermínia Tavares de Almeida, a Comissão integra um movimento da sociedade que vai tratar de barrar os “desatinos” do governo federal. Ela identifica que há “falta de entendimento da diversidade do País”. “Somos parte de um movimento maior em que existem organizações de defesa de direitos humanos, de setores da sociedade, que atuam há muito mais tempo”.

Publicidade

O que é 

O nome da Comissão é uma homenagem ao cardeal arcebispo d. Paulo Evaristo Arns, que em 1972, durante a ditadura militar, criou a Comissão Justiça e Paz de São Paulo. A iniciativa foi lançada oficialmente em 20 de fevereiro com o objetivo de "dar visibilidade e acolhimento institucional a graves violações da integridade física, da liberdade e da dignidade humana, especialmente as cometidas por agentes do Estado contra pessoas e populações discriminadas”.  

Entre os integrantes do grupo há outros ex-ministros como Cláudia Costin e José Gregori, do governo de Fernando Henrique Cardoso, e o economista Luiz Carlos Bresser-Pereira, que foi ministro de José Sarney

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.