BRASÍLIA - Após uma manobra para tentar blindar integrantes da Mesa Diretora da Câmara, a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) adiou a votação de um projeto que afasta provisoriamente membros da cúpula da Casa processados por quebra de decoro no Conselho de Ética. O adiamento foi possível por causa de um requerimento de audiência pública apresentado pelo deputado Pauderney Avelino (DEM-AM) e aprovado pela comissão. Enquanto a audiência não acontecer, o projeto não será apreciado.
Pauderney, ex-líder da bancada do DEM na Câmara, pediu que fossem ouvidos os ministros Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, e Mauro Campbell, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), além do jurista Manoel Gonçalves Filho. O requerimento foi aprovado por 25 votos a favor e 13 contrários. O presidente da CCJ, Rodrigo Pacheco (PMDB-MG), disse que marcará a audiência "oportunamente". "Criaram uma nova forma de obstrução. O presidente retirou de ofício o projeto e não marca data da audiência", reclamou o relator Chico Alencar (PSOL-RJ).
O projeto, de autoria do deputado Betinho Gomes (PSDB-PE), prevê o afastamento por até 90 dias do membro da Mesa Diretora que responder a processo disciplinar pelo Conselho de Ética. O prazo é o mesmo adotado no andamento dos processos por quebra de decoro, que podem resultar em pedido de cassação. Ele foi apresentado em 2015, durante o processo disciplinar contra o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), então presidente da Casa.
Cunha continuou na presidência da Câmara e foi acusado de interferir no andamento dos trabalhos do Conselho de Ética. A perda do mandato foi aprovada quase um ano depois da formalização da representação. "Essa é uma medida saneadora, que protege os membros da Mesa Diretora para que não sejam acusados de interferir no processo", disse Betinho.
Do mesmo partido de Pauderney, o atual presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), é citado em delações premiadas no âmbito das investigações da Operação Lava Jato, mas não responde a processo no Conselho de Ética. Maia nega irregularidades. Pauderney justificou seu requerimento dizendo que a audiência pode "dar mais clareza" para o relator melhorar a proposta.
A manobra foi interpretada como uma tentativa de blindagem aos possíveis alvos no futuro de processo disciplinar. "Na iminência de aceitação de inquéritos contra dezenas de deputados, incluindo membros da Mesa, é óbvio que ficar falando que é trauma com o Cunha é, na verdade, esconder a preocupação em relação a um futuro próximo", disse o relator da proposta.
Alencar alegou que Barroso não tinha nada em especial a dizer ao Parlamento sobre o tema. "Esse pedido de audiência significará a protelação da apreciação da matéria", protestou. Os principais deputados da bancada do DEM acompanharam a aprovação do requerimento na comissão e, após a votação, deixaram a sessão.
Caso o projeto de resolução seja aprovado, qualquer representação admitida pelo Conselho de Ética, independentemente se for fruto das investigações da Lava Jato ou por qualquer outro motivo, o membro da Mesa terá de ser afastado cautelarmente.