Com perfil técnico, desafio de Dilma será 'flexibilidade política'

Disputa política em torno das Presidências da Câmara e do Senado deve ser primeiro teste de negociação para Dilma.

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Por Fabrícia Peixoto
Atualização:

Eleita terá de demonstrar poder de negociação política Escolhida para governar o Brasil nos próximos quatro anos, Dilma Rousseff galgou postos na administração pública graças, principalmente, a um perfil que pessoas próximas costumam descrever como "técnico" e com "grande capacidade de gestão". Há quem veja ainda na ex-ministra um estilo "personalista" de administrar, conferindo a essa economista de 62 anos uma imagem de "durona" e, para alguns, até de autoritária - descrição que ela rechaça. "Apenas cobro resultados", costuma dizer. Foi no governo Lula, primeiro como ministra das Minas e Energia, e depois, chefiando a Casa Civil, que Dilma se destacou aos olhos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e já em 2007 passou a ser incluída na lista dos preferidos para sucedê-lo. Alçada por Lula à condição de "mãe do PAC", o Programa de Aceleração do Crescimento, Dilma passou acompanhar o presidente na inauguração e no acompanhamento das obras, o que contribuiu ainda mais para sua imagem de "grande gestora" do governo. Mas, se por um lado, Dilma Rousseff tem capacidade técnica e competência gerencial reconhecidos inclusive entre representantes da oposição, na Presidência ela terá de demonstrar, na opinião de analistas, outra qualidade preciosa para o cargo: o da negociação política. Nas duas ocasiões em que ocupou o posto de ministra, Dilma não foi "exatamente simpática" à ideia de ceder cargos a aliados políticos, diz um deputado que integra a base aliada do governo. De acordo com essa mesma fonte, a preferência de Dilma por pessoas do seu ciclo de confiança, mesmo sob "forte pressão política", era comum inclusive na Casa Civil, pasta menos técnica e que, na avaliação desse parlamentar, poderia "acomodar melhor" as indicações de aliados. Líder "Uma coisa é ser uma boa gestora. Outra coisa é ser propriamente um líder, com uma dimensão política importante, que tem que compor e tomar decisões em um plano diferente daquele do mero administrador, do burocrata", diz o cientista político Fábio Wanderley Reis, da Universidade Federal de Minas Gerais. "Essa é uma das grandes interrogações do próximo governo. Na verdade, a gente não sabe como a Dilma irá se comportar nesse sentido", acrescenta o professor. O primeiro grande desafio deve começar logo após as eleições, com as conversas e disputas políticas em torno das Presidências da Câmara e do Senado, definidas em fevereiro, além das negociações com a base para a composição dos ministérios. O cientista político da Uerj Fabiano Santos concorda que a presidente eleita tem um perfil técnico, mas sua avaliação é de que a ex-ministra "vem surpreendendo" desde a pré-campanha, com uma predisposição a uma maior "flexibilidade política". "Ela conseguiu conversar com todos os partidos. Não foi o presidente Lula o único responsável. Ela fez reuniões sozinhas com as bancadas, negociou. E ela soube fazer, soube conduzir. Isso me surpreendeu muito", diz Santos. Economia Sem um programa de governo divulgado oficialmente, a campanha de Dilma Rousseff à Presidência acabou deixando algumas interrogações sobre como a economia do país será conduzida sob seu comando. Enquanto candidata, a ex-ministra garantiu que o tripé da atual política econômica - regime de metas de inflação, câmbio flutuante e superavit primário - será mantido, mas ainda pairam dúvidas, por exemplo, quanto ao peso que o Estado terá na economia. Os analistas de mercado não chegam a ver a possibilidade de uma onda estatizante, mas muitos apostam que o novo governo estará mais à frente dos grandes projetos do país, sobretudo por meio do financiamento público. Em setembro, durante uma coletiva de imprensa em Porto Alegre, Dilma disse que "o papo de ajuste fiscal é atrasado", corroborando a interpretação corrente de que seu governo poderá deixar as contas mais frouxas. O principal argumento da presidente eleita é de que as pessoas se acostumaram a ver os gastos do governo "somente como despesa", quando, segundo ela, esses gastos também "ajudam a movimentar a economia". Mas apesar das interrogações, os investidores - tanto no Brasil quanto no exterior - não esperam nenhuma mudança radical nos rumos da economia sob a gestão de Dilma. "Mesmo às vésperas da eleição, o real continuou uma das moedas mais procuradas do mundo. Isso já diz muita coisa sobre as expectativas quanto ao Brasil", disse um operador financeiro de um grande banco multinacional. BBC Brasil - Todos os direitos reservados. É proibido todo tipo de reprodução sem autorização por escrito da BBC.

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