11 de maio de 2021 | 18h31
Agências de controle de medicamentos e imunizantes ganharam estatura com esforços nacionais para salvar vidas na pandemia. A Emea, da União Europeia, e o CDC, dos Estados Unidos, além de acelerar vacinas seguras e eficazes, monitoram a vacinação e a testagem, banem tratamentos ineficazes, orientam decisões sobre lockdown e reaberturas seguras de escolas, lazer e comércio, discutem produção, patentes e ampliação do acesso a insumos.
A contraparte brasileira, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), foi levada à CPI sob suspeita de interferência do governo federal e sob críticas relacionadas à demora na liberação de vacinas.
Em outubro de 2020 o mesmo Senado Federal aprovou , por maioria , a indicação do contra-almirante Antonio Barra Torres para o cargo de presidente da Anvisa, agora na posição de testemunha da CPI. Na época, em sabatina, sua inexperiência no ramo foi desconsiderada e o currículo divulgado nos fez saber de seus hobbies (é colecionador de objetos militares e dirige veículos 4x4 fora da estrada) e das cidades que visitou (Casablanca e Veneza, entre elas).
Enfim, um ritual conhecido que coloca o Senado na rota da degradação técnica e da subordinação a interesses privados que arrebataram as agências reguladoras no Brasil.
Na CPI, Barra Torres buscou afastar-se do compadrio com Bolsonaro. Confirmou reunião “sem cabimento” no Planalto para discutir eventual alteração da bula da cloroquina. Sua reação teria sido, nesse dia "deseducada", por referir-se a medicamento que "não funciona no tratamento de doentes de covid-19".
Disse ter se arrependido – “se eu tivesse pensado mais cinco minutos” – de surgir, sem máscara, em manifestação antidemocrática promovida pelo presidente Bolsonaro, em março do ano passado.
Barra Torres ainda derramou argumentos técnicos razoáveis, quando contestado sobre a rejeição da vacina indiana Covaxin e da russa Sputinik, e sobre decisão anterior que interrompeu testes da Coronavac.
Numa CPI transmitida ao vivo, performances ensaiadas expõem as deficiências de arguições, mas também constrangimentos. O fato concreto, aqui, é que um almirante foi colocado em cargo estratégico quando a situação sanitária exigia pés na terra e responsabilidade máxima dos órgãos públicos. E vale lembrar que cavalo-de-pau em discursos não basta para reverter o padrão de transmissão e de óbitos por covid no Brasil.
* É PROFESSOR DA FACULDADE DE MEDICINA DA USP
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