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''''Cargos fazem do Parlamento uma casa de negócios''''

Ex-candidato a vice na chapa de Heloísa Helena diz que, ?graças ao governo?, horizonte das expectativas é ?medíocre?

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Por Moacir Assunção
Atualização:

Ex-preso político nos anos 70, o cientista político César Benjamim está muito pessimista com o Brasil do ex-companheiro Luiz Inácio Lula da Silva, como ele fundador do PT. Desde os tempos da ditadura, quando atuou na Vanguarda Popular Revolucionária (VPR), sob o codinome Menininho (tinha 17 anos), que não se via tão descrente. Benjamim, que foi candidato a vice-presidente na chapa de Heloísa Helena (PSOL) em 2006, mas não está mais filiado ao partido, critica o que chama de lulismo - espécie de "ideologia oficial" do governo. Benjamim condena o modelo de relacionamento entre Executivo e Legislativo baseado na distribuição de cargos e verbas. "A enorme quantidade de cargos - cerca de 25 mil - de que o governo dispõe, faz com que a instituição Parlamento perca sua força e se torne uma casa de negócios", afirma ele nesta entrevista ao Estado. Como funciona o que o sr. chama de influência do lulismo na sociedade? Sun Tzu, o maior estrategista da história e autor de A Arte da Guerra, descrevia o que chamava de guerra perfeita como aquela em que você destrói a vontade de lutar do inimigo sem usar os métodos da guerra convencional, cara e cruel. Com seu método de governo, o presidente está fazendo com que os brasileiros percam a vontade de produzir coisas novas, o que foi a nossa marca, principalmente após os anos 40. No passado, para deixar de ser uma fazenda de café e se tornar um país industrial, o Brasil criou o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES); hoje não fazemos mais nada. O lulismo introduziu isso na nossa alma e parece que os brasileiros estão gostando de viver sem nenhum projeto, o que é preocupante. Em termos práticos, o que ocorre por conta dessa influência? As famílias recebem R$ 60 ao mês com o Bolsa-Família. Se for de quatro pessoas, serão R$ 15 por membro, o que dará 0,50 ao dia. Isso é aviltante. Se alguém sentar-se em qualquer praça do Brasil e pedir esmola, terá mais que isso ao fim do dia. No Brasil, os velhos esquemas continuam e a eles foram acrescentados os novos. Sempre tivemos uma tendência a essa acomodação, mas havia um combate. Sob Lula, nós nos tornamos uma nação covarde, que não enfrenta seus problemas, preferindo postergá-los até onde não se sabe. Em termos globais, nossos números de crescimento são medíocres, abaixo da maior parte do mundo e até da América Latina. De 2000 até 2006, o Brasil não criou um emprego sequer com salário superior a três mínimos (R$ 1.050). Se um país, em pleno século 21, só ofereceu a sua população cargos de motoboys e balconistas, a situação é complicada. No entanto, há setores contentes. Os banqueiros porque têm juros altos, o MST porque tem convênios e os estratos mais humildes da população porque dispõem do Bolsa-Família. Como o sr. vê o relacionamento do Executivo com o Legislativo, em que para aprovar propostas de seu interesse o governo acaba destinando cargos e verbas para deputados e senadores? O Legislativo é um órgão como a polícia, o corpo de bombeiros ou qualquer outro, em que há 10% de heróis, o mesmo porcentual de corruptos e os 80% restantes que são uma espécie de maioria silenciosa, olhando para cima para ver o que acontece. Se o governo trata com o Legislativo de uma forma que leva a estimular os bandidos, será esta a relação que vigorará. Se mantiver uma relação republicana de alto nível, um comportamento diferente aflorará e vamos prestigiar os honestos. Nunca será possível extinguir a corrupção, mas o corrupto tem de se sentir acuado. Bandido tem de ter medo da polícia. E o que faz com que essa relação se dê dessa forma? O que leva o Estado a ter uma relação totalmente distorcida com as outras instituições, como o Congresso, é algo de fundo, que não tem sido discutido por nenhum partido político: a enorme quantidade de cargos - cerca de 25 mil - de que o governo dispõe, o que faz com que a instituição Parlamento perca sua força e se torne uma casa de negócios. Na França, o presidente tem 300 cargos e cada ministro pode levar dois assessores e uma secretária. No Brasil, com a eleição do presidente, troca-se até o gerente da Caixa Econômica Federal no interior de Pernambuco. Quais são os principais problemas desse modelo? No lado do Executivo, os funcionários públicos se sentem desprestigiados por ter a seu lado alguém que não foi guindado à posição por mérito, mas por amizade com algum poderoso de plantão. E, no Legislativo, faz com que o poder se atrofie e os partidos e o Congresso percam totalmente sua função, virando agrupamento de lobbies e casa de negócios. Por que você acha que os políticos brigam tanto, por exemplo, pelo gerente da Petrobrás em Bonsucesso? Não é pelo voto dele, obviamente, é porque ele dirige licitações, tem contato com grandes empresas e vai ajudar a fazer caixa. Como classificar a absolvição de Renan Calheiros (PMDB-AL)? O caso Renan é a personificação desse processo viciado, é a metástase da doença. Com esse tipo de atitude de barganha que ocorreu nessa situação específica, as instituições vão se enfraquecendo e dissolvendo-se a uma velocidade assustadora. Se as coisas funcionassem como deveriam no Brasil, o Congresso se ocuparia, realmente, de fazer política, o que nem de longe ocorre. Quem é: César Benjamim É doutor honoris causa em Ciência Política pela Universidade Bicentenária de Aragua, na Venezuela. Autor de O Sertão Todo se Impropriou à Vida (Ed.Vozes) e Bom Combate (Contraponto). Foi vice na chapa de Heloísa Helena à Presidência. É editor da Editora Contraponto, no Rio.

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