Capitão indica base onde estaria corpo de Stuart Angel

Ex-oficial da FAB relata à Comissão da Verdade conversa com sargento que contou ter visto militares ocultarem cadáver

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Por Clarissa Thomé
Atualização:

Rio - (última atualização às 22h01) O corpo de Stuart Angel, militante do MR-8 morto em sessão de tortura na Base Aérea do Galeão, em maio de 1971, pode ter sido enterrado na cabeceira da pista da Base Aérea de Santa Cruz, na zona oeste do Rio. A revelação foi feita pelo capitão reformado da Aeronáutica Álvaro Moreira, de 89 anos, que prestou depoimento à Comissão Nacional da Verdade (CNV) em setembro de 2013 e em fevereiro e junho deste ano. Até hoje o destino dado ao corpo do militante, filho da estilista Zuzu Angel, é desconhecido.

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A comissão fará requerimento formal à Aeronáutica, pedindo informações sobre a possível ocultação do corpo de Angel na instalação militar. “É fundamental que a Aeronáutica nos ajude. Somos órgão público e não faz sentido que outro órgão público negue informações”, disse o coordenador da CNV, Pedro Dallari, acrescentando que os atuais comandantes da Força não têm ligação com as torturas e mortes ocorridas na ditadura militar (1964-1985).

 

 

 

O capitão Álvaro Moreira contou ter ouvido do sargento José do Nascimento Cabral, já morto, a versão a respeito do enterro do corpo de Stuart Angel. Nascimento era controlador de voo na Base Aérea de Santa Cruz e estava de plantão na noite em que houve a visita de um grupo de oficiais comandado pelo brigadeiro João Paulo Moreira Burnier (1919-2000), então à frente do 3.º Comando Aéreo Regional (Comar).

Burnier teria ordenado o fechamento da pista - a de número 10, de acordo com o depoimento de Moreira.

Nascimento contou ao amigo que, a partir da torre de controle, conseguiu observar o enterro de uma pessoa na cabeceira da pista, “um local em que ninguém vai”; “que só é interditado em caso de acidente”.

“Depois ficou-se sabendo que ele estava enterrando um corpo de um, como na época se chamava, subversivo. Depois vieram os detalhes: que foi o coronel Cabral, comandante do Galeão, junto com ele (Burnier). E que era o filho de Zuzu Angel”, contou Moreira, em depoimento gravado na semana passada.

O capitão Álvaro Moreira foi cassado logo após o golpe militar e teve contato com o sargento José do Nascimento Cabral até sua morte, provocada por câncer. Nascimento teria tocado no assunto em pelo menos duas ocasiões. O capitão reformado procurou a CNV por e-mail e por uma rede social para narrar o episódio. “Eu me sinto com o dever cumprido”, afirmou.

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A CNV confirmou que José do Nascimento Cabral trabalhava na Base Aérea de Santa Cruz em maio de 1971. De acordo com André Saboia, secretário executivo da CNV, a comissão ouviu ainda o depoimento de um militar, que não teve a identidade divulgada, que confirma que a Base de Santa Cruz era usada como centro de tortura clandestino e para ocultação de corpos.

A comissão agora busca informações mais precisas para localizar os restos mortais de Stuart. “Precisamos da colaboração intensa da Aeronáutica para ter informações sobre os fatos. Há comandantes vivos da Base Aérea de Santa Cruz e da Base Aérea do Galeão. Eles poderão dar informações mais precisas para estas buscas, utilizando as tecnologias mais modernas, como radar de solo”, afirmou Saboia.

A jornalista Hildegard Angel, irmã de Stuart Angel, reagiu emocionada à divulgação do relatório da CNV. “Enfim tenho informações que me parecem objetivas a respeito do paradeiro dos restos mortais do meu irmão.” Ela disse esperar que os oficiais que atuavam à época e estão sendo localizados pela CNV contem o destino dado a seu irmão.

Pela manhã, integrantes da CNV ouviram o depoimento do capitão Lucio Valle Barroso, chefe de operações do 3.º Comar em 1971. Ele negou ter visto Stuart Angel na unidade, cuja carceragem era usada para “presos legais”.

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