Cadê a Márcia? Mulher de Queiroz completa uma semana foragida

Segundo o Ministério Público, ela teria participado da ‘complexa rotina de ocultação do paradeiro’ do marido e admitiu fugir em caso de prisão decretada

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Por Caio Sartori
Atualização:

RIO - Em conversas obtidas pelo Ministério Público do Rio e citadas no documento que embasou a prisão do ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz, a mulher dele, Márcia Oliveira de Aguiar, dizia que poderia fugir caso tivesse a prisão decretada. Os diálogos se deram em dezembro do ano passado. No dia 18, o que o casal temia aconteceu. Alvos de mandados de prisão preventiva, Queiroz foi detido, mas a mulher cumpriu o que planejava: fugiu.

O MP classifica Márcia como peça-chave na suposta tentativa de obstrução de Justiça por parte de Queiroz e de seus aliados. Além das conversas, que já denotavam preocupação com os desdobramentos do inquérito que apura suposta prática de ‘rachadinha’ no gabinete que o atual senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) comandava quando era deputado estadual, os promotores do Rio também apontam que ela recebeu, de origem desconhecida, R$ 174 mil em espécie durante o sumiço de Queiroz. O dinheiro teria bancado, por exemplo, as despesas hospitalares do ex-assessor do filho mais velho do presidente Jair Bolsonaro.

Advogado de Flávio Bolsonaro, Luis Gustavo Botto Maia (esquerda), Raimunda Veras Magalhães (mãe do miliciano Capitão Adriano) e Márcia Oliveira de Aguiar (mulher de Fabrício Queiroz). Foto: MP-RJ

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Seis anos mais nova que o marido - ela tem 48 e Queiroz, 54 -, Márcia é a segunda mulher do ex-assessor.  Estão juntos em união estável desde 2000. Ambos são librianos e comemoram aniversário nos primeiros dias de outubro.  Juntos, tiveram o filho Felipe Queiroz, também ele citado na etapa mais recente da investigação do MP, mas de modo lateral.

Felipe, de 19 anos, teria participado de um churrasco em Atibaia com “amiguinhas” e o pai, como o próprio policial aposentado contou para a mulher por mensagem. Tomaram cerveja Corona “com limãozinho” e, vascaínos, comemoraram o rebaixamento do Cruzeiro para a série B. 

Nathália, a filha mais velha de Queiroz, e Evelyn, a do meio, são de outro casamento - e foram alvo das etapas da investigação que quebraram sigilos bancário, fiscal e telefônico. Outra Evelyn, de sobrenome Mayara de Aguiar Gerbatim, é filha de Márcia com o ex-marido e também passou por medidas cautelares do Ministério Público ao longo do inquérito.

Família

Para além do aspecto jurídico da fuga de Márcia, sabe-se que Queiroz vê na família o único alicerce que, uma vez destruído, poderia levá-lo a mudar de estratégia de defesa no inquérito, que corre há quase dois anos e está prestes a render uma primeira denúncia. Considerado um "um cara muito família”, como definem interlocutores, a eventual prisão da mulher ou mesmo da filha poderia balançá-lo a ponto de passar a cogitar uma delação premiada. Por enquanto, o advogado Paulo Emílio Catta Preta afirma que essa possibilidade está descartada.

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Ao contrário de Nathália Queiroz, a filha mais velha do ex-assessor, Márcia é menos articulada e não tem atuação tão ativa na parte burocrática da investigação, como na conversa com advogados. Por outro lado, a última etapa do inquérito do MP mostra o poder que ela tinha como articuladora da vida que Queiroz levava em Atibaia enquanto o País perguntava onde ele estava.

A afirmação de que fugiria se tivesse mandado de prisão expedido e as anotações que apontam para o recebimento de R$ 174 mil em espécie não são os únicos fatos que indicam que Márcia, segundo o MP, participava da “complexa rotina de ocultação do paradeiro” do marido. Os promotores afirmam que o casal chegou a fornecer endereços falsos de onde moravam e poderiam ser encontrados em eventuais operações.

Ao acatar os pedidos do MP, o juiz Flávio Itabaiana Nicolau, da 27ª Vara Federal Criminal do Rio, endossou que “ambos estavam se escondendo, recebendo auxílio de terceiro” - e ressaltou a possibilidade de fugirem quando tivessem prisão decretada.

Exagero

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Quanto à tentativa de fugir de possíveis desdobramentos da investigação, o MP mostra que Márcia conversava frequentemente com o marido sobre as possibilidades aventadas. A ocasião em que admitiu que poderia se esconder em caso de prisão decretada, no final de novembro de 2019, se deu pouco antes de o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) autorizar que as apurações da Promotoria do Rio, paralisadas desde julho, voltassem à tona.

Naquele momento, a mulher achava “exagero” a ideia de levar toda a família de Queiroz para Atibaia, onde ele estava escondido, caso a defesa de Flávio Bolsonaro, representada por Frederick Wassef, perdesse a disputa no plenário da Corte. Logo depois, ela admitiu que concordaria com uma iniciativa como essa se eles fossem alvo de pedidos de prisão.

Márcia se apresenta como cabeleireira e designer de sobrancelhas, mas passou dez anos empregada no gabinete de Flávio na Assembleia Legislativa do Rio, onde permaneceu como deputado estadual por 16 anos. De lá, teria repassado para o marido cerca de 40% do dinheiro recebido, o que é apontado como indício de que era uma funcionária ‘fantasma’. O montante transferido corresponde a R$ 445,5 mil.

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Em 2008, um ano após começar o suposto trabalho na Alerj, Márcia foi à delegacia prestar queixa contra o marido. Acusou Queiroz de ter dado socos em sua cabeça, costela e braços. Chegou a pedir uma medida restritiva para que ele não pudesse chegar perto dela, mas acabou desistindo de fazer o exame de corpo de delito. O caso foi arquivado dois anos depois.

Na última terça-feira, 23, Márcia foi procurada em Belo Horizonte, em endereços ligados a Queiroz. Não foi encontrada. Na noite anterior, a defesa dela havia entrado com pedido de habeas corpus na Justiça do Rio. Alega que os fundamentos da prisão preventiva estão equivocados: não haveria justificativa plausível para torná-la presa por obstrução. O pedido está nas mãos da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio, o mesmo que julga nesta quinta um HC de Flávio Bolsonaro.

A defesa do senador pede que o caso seja julgado pelo Órgão Especial do TJ-RJ e não pela pela 1ª instância, onde atua o juiz Flávio Itabaiana, titular da 27ª Vara Criminal da Capital, responsável pela prisão de Queiroz.

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