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Para economistas, escolha entre economia e saúde é 'equivocada'

No debate sobre futuro da economia do 'Brazil Forum UK 2020', especialistas classificaram a atuação do governo frente à pandemia como 'imperdoável'

Por Fernanda Boldrin
Atualização:

Desde a gestão Mandetta no ministério da Saúde, o presidente Jair Bolsonaro critica medidas de isolamento social impostas para atrasar o avanço do novo coronavírus no País e defende a reabertura do comércio e a extinção de medidas restritivas para possibilitar a retomada da economia. Economistas presentes no painel sobre futuro da economia do Brazil Forum UK 2020, realizado nesta segunda-feira, 29, no entanto, afirmam que a suposta escolha entre economia e saúde é errônea, e avaliam que a atuação de Bolsonaro frente à crise foi “imperdoável”.  Assista ao painel:

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Na visão do economista e professor do King’s College London Alfredo Saad-Filho, as “raízes” do impacto da pandemia no País têm relação com a desigualdade brasileira e com “o descaso deliberado do governo” ao lidar com a questão. Saad-Filho cita “a tentativa deliberada de se manter a atividade econômica a partir de um ponto de vista de que, para se manter o nível da renda, valeria a pena sacrificar vidas” - algo que ele classifica como “equivocado”.

Ainda segundo Saad-Filho, que fala em “psicopatia”, o governo brasileiro abriu mão de suas responsabilidades com a população em meio à pandemia. “A psicopatia que impede os níveis mais altos de governo de olhar para o outro, de cuidar do seu, de tratar da população. É a responsabilidade de qualquer governo, a responsabilidade pela vida, e o governo brasileiro abdicou dessa responsabilidade”, afirmou. 

Com um ministro interino na pasta da Saúde, o Brasil somava, até às 20h desta segunda, 58.385 mortes por covid-19, conforme Consórcio de imprensa. Segundo Saad-Filho, “estamos lidando com um desastre que poderia ter sido evitado.” O economista completa: “Isso, ao meu ver, é imperdoável”. 

Zeina Latif, colunista do Estadão e ex-economista chefe da XP, avalia que “faltou articulação (do governo) com os Estados” no enfrentamento à pandemia, e considera que “todos os alertas (sobre os riscos) foram feitos”. Segundo ela, a crise econômica seria “inevitável” com ou sem medidas de isolamento, mas, com “uma estratégia de isolamento mais eficiente”, ela pondera que “o custo econômico certamente poderia ser menor.”

Citando um cenário em que nenhuma medida tivesse sido tomada, Zeina afirma que “a contaminação seria muito rápida”, que “isso poderia gerar crise social, poderia gerar distúrbios muito grandes, e de qualquer forma ia acabar impactando a economia - pelas mortes, pela mão de obra que você perde, pelo caos social, pelo medo das pessoas”. Segundo ela, é importante ter em vista este cenário extremo, senão podemos acabar “confundindo a análise, achando que o isolamento causa a crise, e não exatamente a doença”. 

Monica de Bolle, economista, pesquisadora do Peterson Institute for International Economics e professora da Universidade Johns Hopkins, criticou também o papel que a gestão Bolsonaro, com Paulo Guedes na Economia, confere ao Estado. “O princípio norteador de Paulo Guedes é do Estado mínimo”, diz Bolle, segundo quem esta é uma agenda dos anos 60 - “70, talvez, com alguma generosidade”, diz. 

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“A não ser que a gente queira repactuar nossa Constituição, o Estado mínimo não cabe na Constituição”, afirmou a economista. Ela rebate uma ideia disseminada entre alguns economistas de que os direitos garantidos pela Constituição de 1988 não caberiam no orçamento do governo. “Isso é uma bobagem, porque a Constituição é soberana”, conclui.

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