Brasil entra na era do estudo das proteínas

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Por Agencia Estado
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O seqüenciamento do genoma da bactéria Xylella fastidiosa, concluído em 6 de janeiro de 2000, pôs o Brasil no Primeiro Mundo da ciência. Agora, três anos e vários organismos seqüenciados depois, o País se prepara para entrar na era da proteômica, o estudo das proteínas, colocando-se ao lado dos países desenvolvidos. Vários laboratórios, divididos em duas redes, uma em São Paulo (em formação) e outra no Rio, iniciaram as primeiras pesquisas. Segundo os cientistas envolvidos nesses projetos, o Brasil tem tudo para repetir o sucesso que teve em genômica, embora o estudo do proteoma seja mais complexo. Enquanto o genoma é o conjunto dos genes de um determinado organismo, que dão a receita de como ele é feito, o proteoma é o conjunto das proteínas produzidas por ele. O primeiro é como a planta de um carro. O segundo são as peças desse carro, cada uma com uma função específica. "O proteoma é o conjunto de proteínas num dado momento, ou evento, metabólico de um organismo", diz o bioquímico Carlos Bloch, que coordena a formação da rede paulista de proteômica, que será financiada pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Uma analogia deixa a diferença mais clara. Um determinado ovo, o pintinho que dele resulta e o galo no qual este se transforma têm o mesmo genoma (genes e código genético). Mas as proteínas, feitas sob orientação desses genes, são diferentes em cada uma dessas fases do desenvolvimento da ave. Os genes que determinam a produção de penas ou da crista do galo são ativados em momentos diferentes e "ordenam" a produção de proteínas diferentes. Descobrir as de um organismo e como elas funcionam em cada momento, eis a complexidade do estudo do proteoma. O que tem em complexidade, no entanto, esse estudo tem em potencial de cura de doenças, desenvolvimento de novos medicamentos ou aumento de produtividade de culturas agrícolas, por exemplo. O conhecimento da estrutura das proteínas permite compreender sua função nas células. Elas fazem de tudo num organismo, como transportar o ferro no sangue, controlar a entrada de açúcar na célula e constituir-se em hormônios importantes. Há as que participam de processos patológicos, como câncer e infecção por vírus e bactérias. Por isso, os primeiros objetos de estudo serão microorganismos que causam doença, como o vírus da dengue e o vibrião da cólera e plantas como o café e a cana-de-açúcar. Confiança - Os pesquisadores estão confiantes no sucesso desses projetos e no desempenho do Brasil em proteômica. "Temos tudo para repetir os bons resultados que tivemos com o genoma", acredita Marcos Eberlin, que participa do projeto que estuda o proteoma do café, na Universidade Estadual de Campinas. "Temos químicos, biólogos e bioquímicos do mais alto nível, além de laboratórios bem equipados. Os grupos são formados por pesquisadores jovens e maduros, entusiasmados, inovadores, flexíveis e calejados na arte de fazer boa pesquisa mesmo com poucos recursos." O diretor do Laboratório Nacional de Luz Síncroton, de Campinas, e coordenador da futura rede paulista de proteoma, Rogério Meneghini, lembra que o Brasil está iniciando esses estudos bem menos defasado do que foi no caso da genômica. "Hoje já existe uma base que foi formada pelos projetos de genomas da rede Onsa (Organização para Seqüenciamento e Análise de Nucleotídeos) da Fapesp e por outras redes nacionais que podem ser exploradas." Ainda que mais cauteloso, o coordenador da Rede de Proteômica do Rio, Paulo Mascarello Bisch, vê boas perspectivas para esses projetos. "Os estudos proteômicos necessitam de análises em larga escala e atualmente ainda temos poucos equipamentos para isso", ressalva. Em compensação o Brasil possui, segundo Bisch, cientistas altamente qualificados no estudo de proteínas. "Sem dúvida temos potencialmente a capacidade de nos adaptar rapidamente para empreendermos estudos de proteoma", diz. Para ele, isso ocorrerá se houver verbas para a compra de equipamentos e material de consumo. Essa ressalva também é feita pelo biólogo Elias Walter Alves, da Universidade Estadual do Norte Fluminense, participante da rede. "Se tivermos financiamento constante, os resultados aparecerão", diz. "O Brasil tem tradição em estudar proteínas. Nossa bioquímica, ciência fundamental para pesquisas de proteoma, é uma das melhores e temos agora melhores condições do que quando começamos a estudar genoma. Naquela época havia poucos grupos estudando biologia molecular."

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