Braga Netto, o general que se tornou um ‘soldado’ do bolsonarismo

Ministro da Defesa, que fez ameaça à eleição de 2022, é considerado ‘cumpridor de ordens’ e totalmente fiel ao presidente Jair Bolsonaro

PUBLICIDADE

Foto do author Vinícius Valfré
Por Vinícius Valfré
Atualização:

BRASÍLIA – O presidente Jair Bolsonaro dá sinais cada vez mais claros de que terá como vice o ministro Walter Braga Netto, da Defesa. Nesta segunda-feira, 21, o chefe do Executivo disse que seu escolhido para a vaga "é de Belo Horizonte e fez escola militar", perfil ao qual o ministro se encaixa. O movimento é visto como uma tentativa do presidente de se blindar contra processos de impeachment.

PUBLICIDADE

As credenciais que levaram o general Braga Netto ao governo de  Bolsonaro eram a de um militar experiente que executou a árdua missão de ser o interventor da Segurança Pública no Rio, em 2018, por designação de Michel Temer. Pelas mãos de oficiais que já haviam embarcado no projeto de Bolsonaro, chegou à Casa Civil em fevereiro de 2020. Desde que assumiu a pasta e, posteriormente, o Ministério da Defesa, passou a ser visto como um militar que aderiu ao bolsonarismo e se transformou em um “soldado” do presidente na marcha a favor do tensionamento com as demais instituições e da politização das Forças Armadas.

Considerado pelos pares um enérgico "cumpridor de ordens" e totalmente fiel ao presidente, Braga Netto virou uma eminência parda no governo. Antes dos últimos atritos, setores do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Congresso e alas moderadas da caserna vinham manifestando incômodo com o que classificavam como patrocínio de Braga Netto à radicalização.

O ministro da Defesa, general Walter Braga Netto Foto: Dida Sampaio/Estadão

Os relatos colhidos pela reportagem com pessoas que interagem ou interagiram com o general apontam que o ministro é autoritário, avesso a discussões e alguém que não reconhece que errou ao aceitar a tarefa de misturar Forças Armadas com a política.

No primeiro escalão de um governo em que todos ganham pontos quando alimentam narrativas contra adversários na internet, ele vai na contramão. Não é adepto das redes sociais, mas se articula no “mundo real” conforme Bolsonaro lhe orienta. O contexto da ida de Braga Netto para a Defesa deixou claro o propósito da escolha feita pelo presidente.

O fim de março do ano passado foi marcado por demissões coletivas de militares. Junto com o então ministro Fernando Azevedo e Silva, os três comandantes das Forças renunciaram. O motivo seria a recusa da cúpula militar em alinhar as tropas ao presidente. “Preservei as Forças Armadas como instituições de Estado”, dizia a nota de Azevedo e Silva.

Nos meses seguintes à sucessão, Braga Netto contabilizou ao menos quatro situações em que anuiu a interesses do bolsonarismo. A primeira foi minimizar a não punição ao general da ativa Eduardo Pazuello, ex-ministro da Saúde, por participação em evento político com Bolsonaro no Rio.

Publicidade

O regramento disciplinar do Exército proíbe expressamente a conduta, mas nada aconteceu por intervenção do presidente. Depois da impunidade, em junho, Braga Netto disse que as Forças estão “coesas e disciplinadas”.

Em julho de 2021, ele liderou a dura reação ao então presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), que, sem generalizar, mencionou um “lado podre” das Forças Armadas. A comissão foi uma das principais fontes de problemas para o governo e para os militares que o compõem porque investigava a resposta à pandemia.

A nota, com tom de ameaça, teria sido publicada sem que os três comandantes fossem consultados. “As Forças Armadas não aceitarão qualquer ataque leviano às instituições que defendem a democracia e a liberdade do povo brasileiro”, dizia o texto assinado por Braga Netto.

Em seguida, o comandante da Aeronáutica, Carlos Almeida Baptista Junior, foi ainda mais duro, em entrevista ao jornal O Globo. Entre outras coisas, disse que “homem armado não ameaça”. As reações da sociedade civil e do Congresso foram fortes, mas Braga Netto não sinalizou reprimendas.

PUBLICIDADE

Mais à frente, o ministro foi apontado pelo relatório final da CPI como uma figura omissa no âmbito da pandemia. Como ministro-chefe da Casa Civil, Braga Netto foi o coordenador do Centro de Operações do Comitê de Crise da Covid-19 até março de 2021. 

Em julho daquele ano, o Estadão revelou que o general fez uma ameaça direta às disputas eleitorais. Por meio de um interlocutor, ele enviou um recado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL). Pediu para comunicar, a quem interessasse, que não haveria eleições em 2022, se não houvesse voto impresso.

Ao soltar um comunicado oficial, o militar não desmentiu a reportagem e, de certa forma, a confirmou. Disse na nota que os cidadãos desejam um processo com “maior transparência e legitimidade”.

Publicidade

A ameaça nutre o discurso de que eventual derrota de Bolsonaro em 2022 só poderá ser explicada por uma fraude na Justiça Eleitoral. É o que o presidente tem feito desde que as crises se intensificaram e a avaliação do governo piorou. “Ou fazemos eleições limpas no Brasil, ou não teremos eleições”, disse, no mesmo dia do recado de Braga Netto nos bastidores.

Em altaPolítica
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

Para membros da CPI da Covid, parte do ímpeto de Braga Netto é explicado pelo interesse corporativista de proteger membros das Forças Armadas que estão sendo investigados pela comissão. Denúncias de corrupção afetam fardados que foram cedidos ao Ministério da Saúde e a competência de militares que geriram o combate à pandemia é alvo de críticas.

Braga Netto também foi criticado pelos resultados que apresentou como interventor da Segurança do Rio. A missão não gerou resultados concretos para a redução da violência e da corrupção policial. Foi durante o período em que ele controlou as forças de segurança do Estado que a vereadora Marielle Franco e seu motorista, Anderson Gomes, foram assassinados em um crime premeditado a cerca de 1 quilômetro da base da intervenção.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.