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Bolsonaro proíbe ministros de atender Doria

Presidente está convencido de que tucano trabalha em dobradinha com Maia. ‘Não vão me derrubar’, diz ele

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Foto do author Vera Rosa
Por Vera Rosa
Atualização:

Caro leitor,

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O presidente Jair Bolsonaro proibiu ministros de atender qualquer pedido do governador de São Paulo, João Doria (PSDB), seu adversário político. Quem conversar e fizer “graça” para o governador também está sujeito a receber cartão vermelho. A ordem foi reforçada depois que Doria deu a largada para a vacinação contra a covid-19, no último domingo, 17, tirando o protagonismo do governo federal.

Bolsonaro está convencido de que o tucano trabalha em sintonia com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para desgastar cada vez mais o governo e articular o impeachment. “Não vão conseguir me derrubar”, disse ele, em recente conversa com aliados, segundo relatos obtidos pelo Estadão.

Candidato a novo mandato, o presidente afirmou que Doria fez da vacina Coronavac uma jogada de marketing para ter os holofotes porque quer sua cadeira, em 2022. Em mais de uma ocasião, Bolsonaro chamou Doria de “calcinha apertada” e “gravatinha”. As expressões também são usadas por ele, em reuniões com ministros, para se referir ao governador.

O presidente Jair Bolsonaro Foto: Marcos Correa/PR

A relação entre os dois começou a desandar ainda mais em abril do ano passado. Naquele mês, Doria ligou para o ministro da Economia, Paulo Guedes, e o aconselhou a sair do governo para salvar a sua biografia. O telefonema de Doria para Guedes ocorreu logo após o ex-juiz da Lava Jato Sérgio Moro, então titular da Justiça, desembarcar da equipe. Informado, Bolsonaro começou a arquitetar sua vingança.

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Diante da animosidade cada vez maior entre os palácios do Planalto e dos Bandeirantes, auxiliares de Bolsonaro que ainda conversam com Doria pedem para que nunca tenham os nomes citados. Dois assessores contaram, sob a condição de anonimato, que o presidente chegou até mesmo a ameaçar com demissão quem se aproximasse do governador.

A dobradinha entre Doria e Maia para construir uma saída diplomática com a China, na tentativa de impedir que a vacinação contra o coronavírus seja interrompida por falta de matéria-prima, aumentou a irritação de Bolsonaro. Foi por ordem dele que o Ministério das Comunicações divulgou uma nota, na noite desta quarta-feira, 20, para avisar que “o governo federal é o único interlocutor oficial com o governo chinês”.

João Doria, governador de São Paulo, posa com uma dose da vacina Coronavac, aprovada por unanimidade pela Anvisa Foto: Governo de São Pauo / Divulgação

Horas antes, após sair de uma reunião virtual com o embaixador chinês Yang Wanming, Maia havia afirmado que o governo precisava superar os conflitos com o país asiático. “É incrível como a questão ideológica para alguns prevalece sobre a intenção de salvar vidas”, alfinetou o presidente da Câmara, a cinco dias de passar o bastão para seu sucessor.

Maia apoia a candidatura do deputado Baleia Rossi (MDB-SP) e Bolsonaro é fiador de Arthur Lira (Progressistas-AL), chefe do Centrão. A disputa que vai escolher os presidentes da Câmara e do Senado está marcada para o próximo dia 1.º. No Palácio do Planalto, a eleição para as cúpulas do Congresso vem sendo tratada como uma batalha de vida ou morte.

Além de pautar ou engavetar projetos de interesse do governo, o presidente da Câmara tem poder para dar andamento ou arquivar pedidos de impeachment e há 61 deles protocolados na Câmara contra Bolsonaro.

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Em entrevista ao Estadão, o vice-presidente Hamilton Mourão disse não ver possibilidade de qualquer movimento nesse sentido prosperar. “Deixa o cara governar, pô!”, exclamou ele.

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Mourão avalia, porém, que a disputa ideológica muitas vezes é prejudicial ao governo. Ao saber que apoiadores reclamaram com Bolsonaro até mesmo da contratação de Seu Jorge para fazer um show por live, em dezembro, para funcionários do Banco do Brasil, Mourão abriu um sorriso. O argumento usado para a queixa foi que o cantor era de esquerda.

“Seu Jorge é ideológico? Eu acho que, em determinados momentos, nossos apoiadores mais radicais se perdem pela linha de fundo”, reagiu o vice-presidente, recorrendo à imagem do futebol. “É aquele atacante que corre demais com a bola e sai com ela pela linha de fundo”.

Exatos dois anos depois de Doria ter sido apontado por Bolsonaro, no Fórum Econômico Mundial de Davos, como “futuro presidente do Brasil”, o cenário político virou de cabeça para baixo. Mesmo em queda de braço com o tucano, no entanto, Bolsonaro não esquece de chamar o PT para o ringue. Não sem motivo: é a polarização com os petistas que atrai mais seguidores, e potenciais eleitores, para ele.

“O adversário de Bolsonaro em 2022 não será o Doria, mas, sim, alguém da esquerda”, previu o deputado Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ), da bancada evangélica. “Doria é um chuchu e tem no DNA a traição. Traiu o Alckmin com aquela chapa Bolsodoria para ganhar a eleição e, depois, traiu o Bolsonaro. Na política não se perdoa traição”, emendou.

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O governador de São Paulo, porém, parece não dar bola para xingamentos. Nesta quarta-feira, 20, ao lançar um “vacinômetro” – ferramenta para acompanhar em tempo real o número de vacinados contra a covid-19 no Estado –, fez uma oferta que provocou ranger de dentes no Planalto.

“Se o Ministério da Saúde desejar, São Paulo cede, sem custo algum, toda a estrutura e formatação técnica (da plataforma digital)”, propôs o tucano. Até mesmo assessores de Doria fizeram cara de paisagem. 

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