Berlusconi ameniza tom, mas vai insistir em extradição de Battisti

Lula mostra alívio com nota de primeiro-ministro e ressalta que não volta atrás na decisão de acolher extremista

Por LEONENCIO NOSSA E CLARISSA OLIVEIRA e COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS
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O primeiro-ministro da Itália, Silvio Berlusconi, fez ontem o primeiro gesto para reduzir as tensões com o Brasil, em meio à crise diplomática provocada pela decisão do ministro da Justiça, Tarso Genro, de acolher como refugiado político o extremista Cesare Battisti. Em nota, Berlusconi afirmou que o caso Battisti "não deve afetar as excelentes e amistosas relações entre Itália e Brasil, em todos os setores". O tom conciliador do comunicado contrasta com a decisão do próprio Berlusconi, tomada no início da semana passada, de chamar para consultas em Roma o embaixador italiano no Brasil, Michele Valensise - no ritual diplomático, trata-se de um gesto para evidenciar a insatisfação de um país com as atitudes de outro. A nota de Berlusconi deixa claro, porém, que o país não desistiu de trabalhar pela volta de Battisti a seu país, onde foi condenado a prisão perpétua por quatro homicídios cometidos nos anos 70, quando integrava a organização de extrema esquerda Proletários Armados pelo Comunismo. "É necessário que esta questão continue se desenvolvendo em seu meio natural, o jurídico, onde a Itália tentará de tudo para conseguir a extradição de Battisti para o nosso país", afirmou o primeiro-ministro. A palavra final sobre a eventual extradição será dada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda precisa avaliar se a decisão de Tarso interrompe ou não o processo que corre no próprio tribunal e que pede o retorno do italiano a seu país. Battisti, atualmente preso em uma penitenciária de Brasília, alega inocência nos quatro homicídios dos quais foi acusado e acusa seu advogado na Itália de ter falsificado procurações para representá-lo. Ao anunciar a concessão de refúgio, Tarso disse que o ativista foi condenado por crimes políticos, e não comuns - o que impediria o Brasil de extraditá-lo, de acordo com decisões anteriores do STF. O ministro alegou ainda que o acusado pode não ter tido direito a ampla defesa - Battisti foi condenado à revelia, ou seja, sem estar presente no julgamento. VISITA O governo italiano empenhou-se ontem em dizer também que Berlusconi não desistiu dos planos de visitar o Brasil. O Estado publicou, na edição de ontem, que a viagem do primeiro-ministro, prevista para o final de fevereiro, havia sido cancelada por causa das tensões entre os dois países. Fontes do governo disseram, porém, que os planos da visita estão mantidos e que a data ainda não foi fixada. Berlusconi havia anunciado em novembro que visitaria o Brasil em fevereiro, em resposta a um convite feito em Roma pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. "Vou aproveitar a ocasião para inaugurar um hospital infantil no Amazonas", disse o italiano, na ocasião. ALÍVIO Lula demonstrou ontem alívio com a mudança de tom demonstrada pela nota do primeiro-ministro italiano. Em entrevista durante o Fórum Social Mundial, em Belém, o presidente ressaltou que não volta atrás na decisão de acolher Battisti como refugiado. "Não é um problema como esse que vai abalar uma relação de mais de um século", disse. Ao comentar a decisão do governo italiano de recorrer ao STF para garantir a extradição de Battisti, Lula disse que o país europeu tem direito de entrar com o pedido no Judiciário. "Na hora em que a Justiça tomar a decisão, seja qual for, nós não discutiremos mais e respeitaremos a decisão", afirmou. "É importante que as pessoas compreendam que a relação entre a Itália e o Brasil não será arranhada por uma decisão que alguém da Itália ou do Brasil não gostou", destacou o presidente. Em meio à polêmica com o governo da Itália, Lula sinalizou que pode conceder anistia a todos os imigrantes ilegais que estão no País. A uma pergunta se poderia legalizar a situação dos imigrantes, o presidente respondeu: "O Brasil pode dar o direito de as pessoas continuarem no Brasil". Segundo Lula, o País "tem lição a dar ao mundo sobre o tratamento de imigrantes". "Todos os que chegaram aqui foram tratados com respeito." Ele criticou o tratamento dado aos brasileiros nos países europeus. "Alguns países ricos acham que o problema do seu empobrecimento é o coitado do imigrante", disse. "O que precisamos garantir é o desenvolvimento das regiões mais pobres, para evitar que os pobres do mundo se transformem em nômades", acrescentou. "Se quiserem que as pessoas continuem na África ou na América Latina, temos de desenvolver esses dois continentes."

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