Bastidores: Para governo e PT, saída de Cunha é articulação para dar 'cara de legitimidade' a Temer

Em conversas reservadas, petistas preveem que esse afastamento pode representar a primeira grande crise entre Temer e Cunha

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Por Vera Rosa
Atualização:

BRASÍLIA - O Palácio do Planalto e a cúpula do PT avaliam que a decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki de afastar o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB), revela uma articulação de bastidor para dar uma "cara de legitimidade" ao provável novo governo de Michel Temer. Em conversas reservadas, petistas preveem que esse afastamento pode representar a primeira grande crise entre Temer e Cunha.

A presidente Dilma Rousseff durante evento do Plano Safra no Palácio do Planalto Foto: Wilton Junior/Estadão

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Com o avanço do processo de impeachment contra Dilma e com Temer assumindo o poder, Cunha seria o próximo na linha sucessória presidencial. Nesse caso, caberia a ele ocupar a cadeira de presidente da República em caso de viagem do titular ao exterior. Ministros e dirigentes do PT observam que Temer já havia demonstrado incômodo com a associação de seu nome a Cunha, réu no âmbito da Operação Lava Jato, acusado dos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro no esquema de corrupção na Petrobrás.

Nesse cenário, a percepção de auxiliares de Dilma é que a desgraça de Cunha beneficia diretamente o vice, que se livra de um "peso" difícil de suportar sobre sua provável administração e de um previsível problema na relação do Planalto com o Congresso.

Desvio de poder. Mesmo assim, o ministro-chefe da Advocacia Geral da União (AGU), José Eduardo Cardozo, vai usar o argumento de que a decisão de Teori Zavascki reforça a tese da defesa de Dilma sobre "desvio de poder" de Cunha ao dar a largada para o impeachment.

No recurso a ser apresentado ao Supremo Tribunal Federal após a já esperada decisão do Senado pela saída da presidente, a AGU baterá na tecla de que o impeachment sofre de um "pecado original" ou "vício de origem", perpetrado por Cunha. Além de sustentar que Dilma não cometeu crime de responsabilidade, Cardozo argumenta que a ação do presidente da Câmara contra Dilma foi movida por "vingança", depois que o PT decidiu apoiar a cassação do mandato dele no Conselho de Ética.

Na avaliação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de ministros do PT e de dirigentes petistas, o Supremo agiu "tarde demais" contra Cunha, mas, de qualquer forma, tudo isso será usado para o partido construir a narrativa de que Dilma foi "injustiçada" por um "golpe" de Estado. É o discurso que se ensaia para a campanha eleitoral deste ano, em que o PT ainda tem esperanças de reeleger Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo - considerada a "joia da Coroa" -, mas, principalmente, para a sucessão de 2018. Nesse ambiente de conflagração política, com o PT prestes a perder o poder conquistado há 13 anos, a candidatura de Lula ao Planalto depende sobretudo do desfecho da Operação Lava Jato.