Bastidores: Para não queimar nome, Bolsonaro fará indicação para o STF no último minuto

Políticos, juristas e evangélicos tentam influenciar escolha do presidente após aposentadoria antecipada de Celso de Mello

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Por Jussara Soares e Tania Monteiro
Atualização:

BRASÍLIA – A antecipação da aposentadoria do decano Celso de Mello aumentou a pressão de grupos políticos, jurídicos e evangélicos sobre o presidente Jair Bolsonaro, na tentativa de influenciar na indicação da vaga no Supremo Tribunal Federal (STF). O chefe do Executivo, no entanto, já adiantou a auxiliares que não cederá aos apelos que têm chegado ao Palácio do Planalto. Para Bolsonaro, é essencial indicar já na primeira oportunidade um nome de total confiança e alinhamento para fazer a defesa de suas pautas na Corte.

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O indicado, como é de praxe, precisa passar por uma sabatina no Senado e ter o nome aprovado pelo plenário. O Estadão apurou que há um acordo entre o Palácio do Planalto e o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), para que a sabatina na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) ocorra imediatamente após Bolsonaro anunciar a escolha.

O movimento tem o objetivo de evitar que o nome escolhido pelo presidente fique exposto a um desgaste público. No Senado, a expectativa é que a indicação ocorra por volta de 15 de outubro.

O presidente Jair Bolsonaro ao lado do ministro Jorge Antonio de Oliveira Francisco, cotado para vaga no STF Foto: Adriano Machado/Reuters

Bolsonaro tem dito que manterá o suspense até o último minuto. O ministro Celso de Mello, que se aposentaria em 1° de novembro, anunciou na semana passada que deixará o cargo já em 13 de outubro. Integrantes do governo afirmam que a tendência é Bolsonaro só anunciar sua decisão após a saída do decano.

O ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Jorge Oliveira, segue como o mais cotado para a vaga de Celso de Mello. Filho do capitão do Exército Jorge Francisco, morto em 2018, e que por 20 anos foi chefe de gabinete de Bolsonaro na Câmara de Deputados, o ministro tem uma relação próxima com o presidente.

Advogado e major da Polícia Militar, Oliveira foi chefe de gabinete do deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e também padrinho de casamento do parlamentar. Ele iniciou o governo no comando da Subchefia de Assuntos Jurídicos (SAJ). Depois, acumulou o posto e o cargo de ministro-chefe da Secretaria-Geral.

Em abril, Oliveira era o nome preferido de Bolsonaro para substituir o ex-juiz Sérgio Moro no Ministério da Justiça e Segurança Pública. De acordo com relatos feitos ao Estadão, Oliveira recusou o cargo, alegando que a indicação dele reforçaria a acusação de Moro de que o presidente tenta interferir na Polícia Federal. Com isso, a pasta acabou indo parar nas mãos do ministro André Mendonça, antes na Advocacia-Geral da União, também cotado para o STF.

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Considerado uma das pessoas mais influentes no governo, Oliveira se tornou internamente o nome preferido por integrantes do Executivo e conquistou apoio também no Congresso. No meio jurídico, a inicial resistência ao ministro, criticado por ter uma carreira considerada pouco robusta, também diminuiu, de acordo com informações obtidas pela reportagem, principalmente pela habilidade dele de atuar nos bastidores. Oliveira teria atuado diretamente para arrefecer os ânimos na crise entre o governo e ministros da Corte.

É justamente essa característica de Oliveira que o faz ganhar força. De acordo com auxiliares da Presidência, Bolsonaro – que já disse querer um ministro do STF “terrivelmente evangélico” – agora afirma ser essencial um nome que tenha capacidade de articulação e confiança total para defender suas convicções na Corte, principalmente em pautas de costumes. O presidente quer, ainda, alguém que possa defender o seu “legado conservador”, se posicionando contra a descriminalização das drogas e do aborto.

Caso opte por Jorge Oliveira, Bolsonaro terá de fazer uma jogada com dois movimentos. A saída dele implica em encontrar um substituto para assumir a Subchefia de Assuntos Jurídicos, órgão que presta consultoria jurídica para atos do presidente. O posto exige uma pessoa de confiança do chefe de Executivo. Por esse motivo, há quem prefira que Oliveira seja indicado apenas na segunda vaga do STF, quando o ministro Marco Aurélio Mello se aposentar.

Na avaliação de integrantes do Planalto, as sinalizações do presidente indicam que Mendonça, que é pastor presbiteriano e tem bom relacionamento com ministros do STF, perde fôlego na corrida. Ele conheceu Bolsonaro na transição do governo, no final de 2018, e virou ministro com o apoio de Jorge Oliveira e do ministro Wagner Rosário, da Controladoria-Geral da União (CGU). Apesar de ter conquistado seu espaço no governo, pessoas próximas a Bolsonaro consideram que a relação é recente para ganhar a vaga. A interlocutores, Mendonça diz que sua indicação nunca foi motivo de conversa com o presidente.

Aras também é citado como possibilidade no STF

O nome do procurador-geral da República, Augusto Aras, também é citado como uma possibilidade ao STF. Com um ano no cargo, completado no último sábado, 26, Aras mostrou alinhamento total com Bolsonaro, que já chegou a mencionar que poderia indicá-lo a uma vaga na Corte.

O procurador-geral da República, Augusto Aras, pediu ao STF que intime a cúpula da CPI da Covid para prestar esclarecimentos. Foto: Evaristo Sá/AFP

Na corrida pela cadeira no STF, dois nomes de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STF) surgem, ainda, como cotados: Luís Felipe Salomão e João Otávio de Noronha. Salomão é também corregedor-geral do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), onde tramitam processos que investigam, entre outros pontos, disparo de mensagens em massa pelo WhatsApp na campanha eleitoral de 2018 e que pedem a cassação de Bolsonaro e o vice, Hamilton Mourão.

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Noronha, por sua vez, tomou decisões favoráveis a Bolsonaro e sua família. Levantamento do Estadão feito com base em decisões do ex-presidente do STJ aponta que o ministro atendeu aos interesses do governo Bolsonaro em 87,5% das decisões individuais tomadas de 1º de janeiro de 2019 a 29 de maio deste ano. Em uma delas, durante o recesso de julho, determinou a prisão domiciliar, com tornozeleira eletrônica, para o ex-assessor parlamentar Fabrício Queiroz e a mulher dele, Márcia Oliveira de Aguiar.

O ex-assessor é investigado sob suspeita de comandar um esquema de “rachadinha” – desvio do salário de funcionários – no gabinete do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ), filho do presidente, na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj).

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Com a vaga na Corte à vista, voltaram a circular nomes como o do desembargador Thompson Flores, ex-presidente do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Criminal do Rio de Janeiro.

Thompson Flores é defendido por parte de integrantes da ala militar, como o vice-presidente Hamilton Mourão. Entretanto, o desembargador já foi rejeitado por Bolsonaro para ocupar o cargo de ministro da Justiça, sob o argumento de que não o conhecia o suficientemente bem. Por sua vez, Bretas, que é evangélico e já se deixou fotografar ao lado de Bolsonaro, sofre resistência em boa parte do governo. Na redes sociais, os apoiadores do presidente já começaram a promover a “fritura” ao nome de Bretas.

Outro magistrado fluminense que sonha com a vaga é o juiz federal William Douglas do Santos, também evangélico. Ele teria o apoio do senador Flávio, filho mais velho do presidente.

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