Bastidor: Ao manter orçamento secreto, Congresso institucionaliza o toma lá, dá cá

Parlamentares reafirmam a intenção de continuar usando o instrumento para barganha política

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Por Breno Pires
Atualização:

O Congresso Nacional aproveitou a exigência da transparência nas emendas de relator como uma desculpa para promover a institucionalização deste dispositivo, à revelia do que realmente decidiu o Supremo Tribunal Federal. A Câmara aprovou, por 268 votos a 31, projeto de resolução do Congresso Nacional que admite a distribuição desproporcional, sem seguir a exigência constitucional de equitatividade, previstas para as emendas individuais e de bancada. Assim, a maioria da Casa reafirmou a intenção de continuar usando o instrumento para barganha política, como o Estadão tem demonstrado ao longo do ano.  O projeto também foi aprovado no Senado. O Legislativo não esperou a decisão de mérito do Supremo Tribunal Federal sobre a constitucionalidade das emendas de relator-geral do orçamento. O plenário do Supremo por 8 votos a 2, determinou a suspensão da execução dessas emendas temporariamente e mandou o Congresso dar ampla publicidade às emendas já distribuídas. Ao aprovar a proposta de resolução, o Congresso faz apenas uma parte do que o Supremo determinou: prever a transparência daqui para a frente. Mesmo assim, há brechas para que o toma lá, dá cá siga oculto. O texto permite que, na hora de registrar o autor do pedido de repasse, o relator-geral (cargo revezado entre Câmara e Senado anualmente) informe o nome de agentes públicos e até entidades da sociedade civil. Assim, um prefeito pode ter uma demanda atendida sem que se registre o nome do seu patrono, o parlamentar que lhe indicou o recurso. Esse risco é reconhecido por parlamentares que são contra o instrumento.

Congresso Nacional, em Brasília Foto: Dida Sampaio/Estadão - 23/7/2021

Com isso, deputados e senadores não podem ser acusados de se venderem para o governo. Afinal, por esse modelo ninguém sabe quem recebeu recursos para votar como deseja o Palácio do Planalto. Além disso, se esse dinheiro for usado em alguma obra ou compra em que houve corrupção ninguém saberá que foi que destinou a verba.   No quesito transparência, porém, o Ato Conjunto do Congresso, assinado na última quinta-feira, 25, pelo presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e o presidente da Câmara, Arthur Lira (Progressistas-AL), é considerado mais grave. Trata-se de um recado claro ao Supremo: o Congresso não vai cumprir a decisão judicial que determinou a divulgação dos nomes dos beneficiados com as emendas de relator-geral até agora. A  narrativa da cúpula do Congresso de que não é possível atender a essa decisão não caiu bem na Suprema Corte e pode diluir o lado positivo da aprovação da resolução. Foi alegada a “inexistência de documentos que registrem essas solicitações”. No Supremo, a avaliação é que é possível conciliar a autonomia do poder Legislativo com os princípios da administração pública. Há alguma chance de sensibilização da maioria sobre a importância da liberação dos recursos. Mas, nos bastidores do Supremo, é dado como certo que a ministra Rosa Weber não dará o braço a torcer na exigência de ampla publicidade – afinal, não existe meia transparência. O ponto considerado principal, porém, é o entendimento que a atual Legislatura atropela o que definiu em 2019, quando aprovou Emenda Constitucional que prevê a impositividade das emendas individuais, sob argumento de impedir o toma lá dá cá.  “Considera-se equitativa a execução das programações de caráter obrigatório que observe critérios objetivos e imparciais e que atenda de forma igualitária e impessoal às emendas apresentadas, independentemente da autoria”.

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