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No Conselho de Ética, lobista confirma pagamentos 'ilegais' a Cunha

Fernando Baiano afirma ter acordo com o presidente da Câmara para cobrar dívida de Júlio Camargo em troca de doações eleitorais, a partir de 2010; parte do peemedebista seria de R$ 4 milhões

Foto do author Julia Lindner
Por Daiene Cardoso e Julia Lindner
Atualização:

BRASÍLIA - O lobista Fernando Soares, o Fernando Baiano, confirmou em depoimento ao Conselho de Ética da Câmara nesta terça-feira, 26, ter feito pagamentos 'ilegais' ao então deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ). O lobista também explicou de que maneira recebeu a ajuda do presidente da Casa para cobrar uma dívida de R$ 10 milhões do lobista Júlio Camargo em troca de doações eleitorais, a partir de 2010. No acordo, inicialmente de 20%, e que subiu para 50%, Cunha pressionaria Camargo por meio da comissão de fiscalização sobre contratos de empresas que Camargo representava junto à Petrobrás.

Cartaz da organização internacional Avaaz, que promoveu abaixo-assinado pela cassação de Eduardo Cunha, é exibido em sessão do Conselho de Ética da Câmara Foto: André Dusek/Estadão

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Segundo Baiano, o ex-diretor da Petrobrás, Paulo Roberto Costa, teria informado que Camargo estava preocupado com a ameaça. Ele então propôs um acordo para pagar a dívida. A parte de Cunha seria de R$ 4 milhões e foi entregue em espécie por Baiano no escritório dele no Rio de Janeiro. Questionado pelo advogado de Cunha, Marcelo Nobre, o lobista disse que nunca fez pagamentos ao peemedebista no exterior. Ele disse ainda que não entregou dinheiro diretamente ao deputado, e sim a pessoas ligadas a ele, como um funcionário chamado Altair.

Nobre reclamou que as perguntas dos membros do Conselho não têm nada a ver com o "objeto da causa", que é ligado ao fato de Cunha ter mentido ou não sobre possuir contas no exterior durante a CPI da Petrobrás. "Não tem como existir imputação neste momento de algo que foi suprimido", declarou o advogado de defesa. Baiano disse que só soube de transferência internacionais de Camargo e do doleiro Alberto Youssef ao presidente da Câmara através da imprensa, mas que não fez repasses para Cunha em 2013 e 2014.

O lobista disse que conheceu Cunha durante um café da manhã em um hotel, em 2009, através de um conhecido. O peemedebista teria pedido a Baiano, em 2010, para verificar com as empresas que ele trabalhava se poderiam fazer doações para a sua campanha. Como as empresas representadas por Baiano disseram que não poderiam contribuir, o lobista teria proposto a Cunha que o ajudasse a cobrar a dívida de Camargo.

Baiano contou que possuía uma boa relação com Cunha e que eles nunca usaram o termo "propina" nas negociações, mas reconheceu que as quantias eram ilegais. "O deputado Eduardo Cunha sempre foi muito cordial comigo, sempre foi muita educado, não teve nenhuma reação abrupta, ameaça, nada disso", contou. Ele confirmou que esteve na casa do deputado cerca de 20 vezes, geralmente aos finais de semana quando estava no Rio de Janeiro, e que também esteve no escritório de Cunha, em reuniões a sós. 

Depoimento. Baiano está depondo na tarde desta terça no Conselho de Ética da Câmara sobre a sua relação comCunha. O lobista é uma das principais testemunhas de acusação do processo por quebra de decoro parlamentar contra Cunha. 

A defesa do lobista sugeriu que o depoimento fosse a portas fechadas, mas o presidente do colegiado, José Carlos Araújo (PR-BA), avisou que não aceitaria o pedido. Ficou acordado que Baiano prestará depoimento sem a presença de fotógrafos e cinegrafistas. Assim, qualquer imagem capturada da sessão pode colocar em risco a validade do depoimento.

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No início da oitiva, o deputado Manoel Junior (PMDB-PB), aliado de Cunha, solicitou que o relator Marcos Rogério (DEM-RO) questionasse o depoente apenas sobre temas que fizessem parte da denúncia, que investiga se Cunha mentiu ou não sobre possuir contas no exterior. "Acho ineficaz estarmos tratando de assuntos que não estão afeitos ao que vamos julgar", comentou. A primeira pergunta de Rogério foi sobre a compra de navios-sonda da Petrobrás.

"Não cabe ao relator escolher as provas que chegam ao processo. Se tais informações serão usadas no relatório final isso será objeto de análise", rebateu o relator do processo, que seguiu com os questionamentos.

Delator de Cunha nas investigações da Operação Lava Jato, Baiano cumpre prisão domiciliar desde meados de novembro passado. Apontado como operador de propinas do PMDB no esquema de corrupção que se instalou na Petrobrás, Baiano fez delação premiada, homologada pelo Supremo Tribunal Federal em setembro. Em seus depoimentos, ele revelou encontros na casa de Cunha para cobrar propina atrasada. Ele citou o peemedebista como beneficiário do esquema de propina na estatal.