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Assentamento no RS se torna uma pequena cidade

Por Agencia Estado
Atualização:

À primeira vista, a cidade de Pontão, no norte do Rio Grande do Sul, não tem nada diferente de outras centenas no Estado. Quatro ruas, algumas dezenas de casas e uma avenida principal onde ficam a prefeitura, o posto de Saúde e dois postos bancários. Em volta, milhares de hectares cobertos de grãos, principalmente soja. É o mesmo cenário que se vê por toda a área rural gaúcha. Pontão, porém, tem uma história peculiar: surgiu há apenas dez anos no rastro dos projetos de reforma agrária que dividiram grandes fazendas na região. A emancipação da antiga vila de Pontão da cidade de Passo Fundo só foi possível após a chegada dos novos moradores, principalmente os assentados da Fazenda Annoni. Esse assentamento é considerado o marco para o surgimento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), que se tornou conhecido nacionalmente com a ocupação da fazenda por 2.500 famílias (cerca de 10 mil pessoas) em outubro de 1985. Depois de anos de discussões na Justiça e de embates dentro da fazenda, 430 famílias se estabeleceram ali definitivamente, aumentando a população da região e permitindo a emancipação de Pontão. A cidade é movida a agricultura familiar. Além dos novos pequenos proprietários da Fazenda Annoni, outras quatro comunidades de colonos formam a grande massa populacional de Pontão. No total, são 4 mil habitantes, quase 80% morando na área rural. De acordo com um estudo do escritório da Emater local, em 2001 642 famílias moravam na área rural, 515 com área menor do que 50 hectares. Entre os moradores dessas comunidades, encontram-se desde o pequeno produtor de hortaliças até o agricultor que planta quase 100% da sua área com soja e milho. A qualidade de vida depende do grau de sucesso do agricultor, mas existe um padrão básico: a grande maioria das casas têm água e luz e há vagas na escola de 1º e 2º graus para todas as crianças da cidade. "A cidade vem montando uma infra-estrutura para garantir a fixação das famílias no campo", diz o prefeito Nelson Grasselli (PT). A própria história do prefeito, um assentado da Fazenda Annoni, explica a opção pela agricultura familiar. Grasselli participou desde o início da ocupação da Annoni, foi durante sete anos da liderança estadual do MST, dirigiu a cooperativa do assentamento e a Cooperativa Central dos Assentamentos do Rio Grande do Sul, a Coceargs. Sua família é de pequenos agricultores de origem italiana. "Meu pai tem uma pequena propriedade de 42 hectares em Rondinha. Somos 11 irmãos e apenas um continua com meu pai. Aos outros restou procurar outra alternativa. Eu sempre sonhei em ter a minha própria terra por isso entrei na ocupação da Annoni." A saga dos Grasselli é comum a tantos outros agricultores familiares. A segunda geração quase nunca tem condições de ficar na propriedade. Os recursos gerados pela atividade não são suficientes para a compra de novas terras. Para o técnico agrícola da Emater de Pontão, Darlei Cecconello, a questão é como mudar esta equação que perpetua o êxodo rural. A sustentabilidade da agricultura familiar esbarra principalmente no modelo produtivo e sua inserção no mercado. No caso de Pontão, Cecconello diz estar cético em relação à opção adotada pela maioria das famílias, a produção de grãos. "Eles estão repetindo seus antepassados. Hoje o preço da soja está razoável, mas quem garante o que vai acontecer com esse mercado? E um pequeno produtor não tem como se precaver". Ele acredita que a saída está na diversificação e na busca de agregação de valor, como a agricultura orgânica e a criação de pequenas agroindústrias. A comunidade de pequenos agricultores mais antiga de Pontão, chamada de Rio Bonito Alto, vive exatamente este dilema. Os primeiros colonos de origem alemã começaram a chegar na região há cerca de 50 anos. Em geral, eram filhos de pequenos agricultores que vieram desbravar a região em busca de terra barata. De acordo com os relatos dos colonos, 50 famílias vieram para a região. Sobraram 22. Os moradores atuais lutam para garantir a sobrevivência das suas áreas. A maioria acredita que a situação melhorou nos últimos anos, principalmente por causa de linhas de crédito voltadas para a agricultura familiar, como o Pronaf e o RS Rural (do governo estadual). A família Endres, com três irmãos ainda vivendo no Rio Bonito Alto e trabalhando em conjunto em três áreas que somam 78 hectares, vai finalmente conseguir reformar a casa de madeira onde mora e que foi construída pelos pais há quase 50 anos. Isso porque conseguiram recursos de um programa de apoio à moradia rural. O prefeito Grasselli explica que a infra-estrutura da cidade também recebeu ajuda das linhas de crédito oficiais, especialmente dos recursos do Procera. Foram liberados crédito para eletrificação rural, construção de escolas, estradas rurais etc. "O município recebeu ajuda, mas também estamos conseguindo aumentar a arrecadação todo ano". Desde 1995, ou seja, desde o início do primeiro mandato de Grasselli, a receita anual de Pontão praticamente dobrou. Em 2002, a arrecadação foi de R$ 4.430.000. Destes, R$ 590 mil foram em créditos para investimentos vindos de diversos programas federais e estaduais.

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