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Assassinato de camponês desatou caça a guerrilheiro

Rosalindo de Souza virou alvo de militares após a morte do camponês João Pereira em uma emboscada

Foto do author Leonencio Nossa
Por Leonencio Nossa
Atualização:

O guerrilheiro Rosalindo de Souza, o Mundico, virou alvo de militares e de parte dos moradores da região do Pau Preto após a morte do camponês João Pereira, de 21 anos. Pelos relatos e documentos, ele foi o autor do disparo que matou o rapaz. No momento da emboscada, em 17 de agosto de 1972, o camponês estava em companhia do amigo e também agricultor Paulo dos Santos, hoje com 63 anos. 

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Única testemunha viva do episódio, Santos foi localizado na semana passada pelo Estado num restaurante de estrada em São Geraldo do Araguaia. “Por volta das 6 da tarde, a gente passava por uma roça de mandioca para caçar um capelão (espécie de macaco guariba) quando alguém atirou. O tiro acertou o peito, no lado esquerdo, do Joãozinho”, relata. “Aí dois homens saíram de uma moita. O homem que atirou, o Mundico, e um outro”, diz. “Mundico puxou minha cinta e tomou minha faca e minha arma.” Santos foi poupado pelos guerrilheiros.

Ao receber a notícia da morte do filho, José Pereira reuniu amigos e os demais filhos e saiu à caça de Rosalindo. O grupo não achou pistas do guerrilheiro. O general Antonio Bandeira chegou a propor ao pai que perdera o filho atirar num guerrilheiro preso como vingança. Pereira não teria aceitado.

Irene, filha dele e irmã de João, conta que a família desistiu da vingança. “Nesse tempo, os guerrilheiros estavam escondidos no mato. A Dina esteve na casa de vizinhos e disse que tinha sido contra a decisão do Rosalindo de matar meu irmão”, relata. 

Futebol. João Pereira e Rosalindo eram amigos no Pau Preto. Na época, participaram da abertura de um campinho de futebol. “Quando Rosalindo matou João, o campinho ainda não estava pronto”, diz o agricultor Jota Pereira, de 67 anos, irmão do camponês morto. Ele mora num assentamento rural no interior de Marabá. “O campinho serviu para o helicóptero do Exército descer e pegar o corpo do meu irmão.”

Parte da família de João mora em Eldorado dos Carajás, cidade que ficou marcada pelo massacre de um grupo sem-terra, em 1996, pela Polícia Militar. Lá vive Bonfim Pereira, de 87 anos, mãe do camponês morto. Ela diz não ter mágoa de Rosalindo, mas lembra que a morte do filho “acabou” com a família.

Bonfim criou dois filhos de João – Gentil e Maria Bonfim. Há poucos anos, Gentil foi assassinado. Ela afirma ter pressentido a morte do filho. “O cabeça (dos militares) falou com o José, meu marido, que queria comprar umas galinhas para fazer janta. Depois, outro militar disse: ‘O senhor me dá um rapaz do senhor para me levar até o Jabuti Cru?’ O José mandou o João ir. ‘Ele vai.’ Aí eu fiquei em casa chorando. A gente era gente mansa. Dei a chorar”, conta. 

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O chefe da equipe era o major Lício Augusto Maciel. Naquele momento, o sítio de José Pereira já era usado pelos militares como base improvisada. “Não tenho medo de falar. O barracão do meu pai era ponto de apoio do Exército. Ou apoiava ou ia para a taca, apanhava até a morte”, relata Irene Pereira, filha do agricultor. “Eles (guerrilheiros) ficaram com raiva da gente porque o Exército estava dentro da nossa casa.”

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