Apesar de críticas, cotas para negros avançam no Brasil

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Por RAYMOND COLITT E STUART GRUDGINGS
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O Brasil manterá a adoção de cotas para negros em universidades e empregos públicos, na tentativa de corrigir o legado da escravidão, disse na terça-feira o ministro da Igualdade Racial, Edson Santos. Ele afirmou a jornalistas que a abolição, que completa 120 anos na terça-feira, "foi incompleta, e os negros continuam na parte mais baixa da pirâmide social". Quase metade dos 185 milhões de brasileiros se declaram negros ou pardos, e o Brasil, um dos últimos países a abolir a escravidão, se considera como o segundo maior país negro do mundo, com população apenas inferior à da Nigéria. Mas o negro brasileiro continua vivendo em condição de pobreza. A taxa de homicídios entre negros é 75 por cento superior à dos brancos, e 73 por cento dos jovens analfabetos são negros, segundo estudo publicado na terça-feira pelo governo. Projetos a serem votados neste ano no Congresso tornam obrigatórias as cotas para minorias raciais nas universidades, nos empregos públicos e possivelmente também nas empresas privadas. Além disso, o governo ficaria obrigado a colocar mais negros nas suas propagandas -- corrigindo uma notável ausência desse grupo na publicidade em geral. Alguns setores reagem com veemência às propostas. A entidade que reúne faculdades e colégios particulares foi à Justiça contra as cotas, e o Supremo Tribunal Federal deve se manifestar nos próximos dias. "As cotas não vão resolver a pobreza, só vão criar um problema racial onde não havia", disse o sociólogo Bolívar Lamounier à Reuters. Ele está entre os 113 intelectuais, sindicalistas, artistas e empresários que disseram numa carta-aberta que as cotas são inconstitucionais e discriminatórias contra os pobres de outras raças. O estudo divulgado na terça-feira mostra que os negros continuam ocupando os mesmos espaços que seus ancestrais: as zonas portuárias e as regiões onde há produção de algodão e café. Em 2007, uma pesquisa do Ibope mostrou que apenas 3,5 por cento dos executivos do país são negros. Os esforços institucionais para corrigir tais distorções já existem há muito tempo nos Estados Unidos, resultado do movimento por direitos civis da década de 1960. Lá, as cotas e outros mecanismos são incluídos sob o rótulo de "ação afirmativa". No Brasil, a adoção de cotas ainda depende da vontade de cada instituição. Há cinco anos, a Universidade Estadual do Rio (Uerj) tornou-se a primeira universidade brasileira a adotar o sistema. Na carta-aberta, as personalidades contrárias às cotas dizem que "a baixa renda limita o acesso à educação superior" e que "as cotas raciais dão privilégios a uma minúscula minoria de estudantes de classe média, mas mantêm um sistema falido de ensino público". O governo alega que, sem uma ação afirmativa, a igualdade racial no Brasil só será resolvida dentro de mais 500 anos. "Não podemos esperar. Nossa tarefa estará concluída quando a pirâmide social do Brasil for tão multicolorida quanto o Brasil propriamente dito", disse Santos.

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