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Analistas defendem maior presença de jovens no Congresso

Apenas 14 dos 513 deputados federais têm menos de 30 anos

Por Victor Pinheiro , Vinícius Passarelli e Paulo Beraldo
Atualização:

A maior presença de jovens no Congresso Nacional poderia “oxigenar” as práticas políticas, melhorar a representatividade e a diversidade e promover ações inovadoras por parte de uma geração conectada. Essa é a avaliação de analistas ouvidos pelo Estado.

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Apenas 2,7% dos deputados têm menos de 30 anos, enquanto a parcela da população que tem entre 20 e 29 anos é de 16,5%, como mostrou o Estado. Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), apenas 11,8% dos candidatos tinham entre 21 e 35 anos nas eleições do ano passado.

Para Carlos Melo, cientista político do Insper, a mescla de pessoas com diferentes idades é positiva ao unir as inquietações dos mais novos com a bagagem dos mais experientes. “O jovem, na sua ansiedade, cria uma pressão para que coisas novas aconteçam. Enquanto isso, o político mais experiente, se por um lado já conhece o sistema, por outro pode se acomodar”, afirma.

A deputada Tabata Amaral (PDT-SP), de 25 anos, é uma das jovens que mais tem tido visibilidade em seu primeiro mandato Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

Carlos Melo afirma ainda que a inexperiência não pode ser motivo para impedir a entrada do jovem no Parlamento. Para ele, a própria “inexperiência pode funcionar como uma força motriz para a mudança.”  

Vitor Oliveira, cientista político e diretor da consultoria Pulso Político, vai na mesma linha. “O corpo técnico da Câmara é capaz de absorver a inexperiência dos políticos novatos”, afirma. O cientista político faz uma ressalva: “Se a participação do jovem não for bem assessorada, pode ser atropelada pelos mais experientes”. 

Representatividade

Oliveira diz ainda que a maior presença de jovens traz também qualidade de representatividade. “É importante pensar quanto as pessoas que integram o processo de decisão no País representam de fato a população”, questiona. O cientista político pondera, no entanto, que há a possibilidade de um parlamentar mais velho representar os anseios dos cidadãos mais jovens.

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Apesar de baixa, a representação de jovens na Câmara dos Deputados brasileira ainda é superior à média mundial de 2,2%, conforme dados da União Parlamentar. O estudo analisou o caso de 147 países. Por outro lado, o Brasil ainda está distante da Noruega, que lidera o ranking, com 13%.

Se uma parcela da população tem sub-representação, qualquer matéria que impacta esse grupo não será tão bem discutida. Porque quem vive a situação não está discutindo

Felipe Rigoni (PSB-ES), deputado federal de 28 anos

Por que há poucos jovens?

Para Cláudio Couto, professor de ciência política da Fundação Getúlio Vargas, a baixa representatividade “não é de se estranhar”. O especialista argumenta que o cargo de deputado federal é uma posição muito competitiva e avançada no sistema político. “O comum é que jovens entrem na política em outras esferas, na municipalidade, nos movimentos estudantis e conselhos.” Segundo ele, assim como em outras atividades, a política demanda tempo e experiência para conquistar espaços e aperfeiçoar a prática do ofício, independentemente da idade.

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Além disso, se a inexperiência é um desafio durante o mandato, se adequar às estruturas de partidos políticos pode ser um obstáculo já na corrida eleitoral. De acordo com Vitor Oliveira, representantes jovens costumam ter pouco espaço dentro de partidos políticos, sobretudo no acesso a recursos eleitorais. “Geralmente quem é privilegiado com mais recursos eleitorais é quem já está há mais tempo no partido.”

Cláudia Farias, pesquisadora da Universidade Federal de Minas Gerais, aponta outro problema: apesar da sub-representação no Parlamento, a juventude está presente na política em arenas informais, como coletivos e movimentos sociais. No entanto, a atuação nessas esferas é limitada. Ao buscar a entrada na política institucional, esses movimentos são obrigados a aderir a uma estrutura partidária que, segundo ela, “conversa outra língua”.

“Esses espaços são muito burocratizados, institucionalizados e não correspondem aos anseios do jovem por mudança”, argumenta. Além disso, os próprios “partidos já são filtros sobre movimentos jovens. A atuação, no entanto, precisa estar nos partidos, que geralmente não têm uma estrutura interna muito democrática”.

“A partir do momento em que as estruturas partidárias não são transparentes nem participativas, você gera um interesse menor por parte dos mais jovens. Essa estrutura impõe uma barreira não só aos mais jovens, mas a qualquer novato na política que queira disputar uma eleição”, afirmou Kim Kataguiri (DEM-SP), de 23 anos.

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Distanciamento

Para Vitor Oliveira, outro fator de distanciamento do jovem é a desvalorização da política estudantil. “Há um certo desprezo de uma parcela da sociedade sobre a política secundarista, em que muitos jovens estão inseridos.” O especialista aponta ainda a falta de educação política nas escolas e em outras esferas de aprendizado e cidadania.

“Como professor, vejo que muitos brasileiros nem conhecem como funciona o próprio sistema eleitoral. Enquanto não houver esse incentivo, o quadro não vai mudar”. 

Vitor Oliveira, pesquisador da USP

 

Duas perguntas para… Zeina Hilal, diretora de participação de jovens na União Interparlamentar

O que deve ser feito para elevar a participação de jovens nos parlamentos ao redor do mundo?

Acreditamos que é preciso acabar com a diferença de idade entre a qual as pessoas podem votar e podem ser eleitas. Em 73% dos países, existe essa barreira. Se a pessoa tem idade suficiente para votar, também deveria ter para ser eleita. Essa discriminação baseada na idade não deve existir.

Um segundo ponto seria estabelecer cotas para jovens nos parlamentos. E elas devem ser ambiciosas, tendo paridade entre homens e mulheres, para aumentar o número de parlamentares jovens. Isso acontece em países como México, Filipinas, Uganda, Ruanda, Marrocos, Quênia…

Como fazer com que as instituições sejam mais abertas aos jovens?

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Isso é muito importante. Não só parlamentos como instituições governamentais devem ser mais atraentes para que a política não seja vista como algo distante da juventude. Os próprios parlamentos têm instituído alguns esforços para se comunicar melhor, para se abrir aos jovens, têm programas de estágios, programas diferenciados para se conectar e engajar com eles.

Os jovens precisam entender melhor o que os parlamentos fazem e sua importância para as democracias. Promover a educação cívica de uma maneira diferenciada é um bom caminho para isso.

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