ANÁLISE: O fim sem dignidade de um governo

Estamos diante de um vácuo de poder por mais de um ano

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Por Aldo Fornazieri
Atualização:
Presidente Michel Temer conseguiu barrar segunda denúncia na Câmara Foto: DIDA SAMPAIO/ESTADÃO

O governo Temer, a rigor, já havia acabado politicamente quando foi alvo da primeira denúncia. Mesmo conseguindo se salvar da segunda denúncia, Temer não tem condições de se recuperar porque está política e moralmente morto. Perdeu a capacidade e as condições de aprovar reformas importantes, projetos relevantes e mesmo de realizar privatizações significativas. Temer e seu núcleo palaciano ficarão reféns dos palácios e de si mesmos. A sua base no Congresso terá com eles uma relação meramente utilitária, na qual vale a extorsão acima de qualquer relação de responsabilidade e seriedade para com o país. Em resumo: estamos diante de um vácuo de poder e de governo por mais de um ano.

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A situação só não é pior porque o ciclo econômico recessivo parece ter chegado ao fim. A economia funcionará por moto próprio, mas sem a potência que um governo honesto e respeitado poderia lhe conferir. Mas, para sobreviver, Temer deverá promover estragos ainda maiores nas parcas conquista civilizatórias e de dignidade humana, alcançadas às duras penas. Exemplos não faltam: retrocesso na fiscalização do trabalho escravo, desmontagem na pesquisa científica, redução de direitos e agressão à cultura.

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O mais grave é que o Brasil continuará mergulhado em grave crise institucional, na qual o STF abriu mão de ser a decisão em última instância, renunciando à sua função de exercer o controle constitucional e de ser a palavra final relativa à Constituição, às leis e à matéria penal. Agora, o poder político, seja do Legislativo ou do Executivo, está autorizado a desobedecer a Constituição e ao seu órgão de controle – o STF.

Tragicamente, sempre que os poderes forem ativos, a tendência é a de que a crise política e institucional se agrave. Assim, chegamos ao extremo do absurdo: o menos pior para o Brasil consiste na inatividade, na não ação dos três poderes de uma República destroçada. A tarefa que resta, e que será longa, é a de construir algo novo sobre os escombros que sobraram. Será longa porque temos personagens públicas, nos três poderes, sem virtudes e um povo incapaz de exercer, com coragem, o seu direito à indignação. 

* Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP)

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