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Análise: A campanha do Planalto e os limites da desonestidade

Peça ‘O Brasil não pode parar’ vende falsa ideia de que devemos voltar à realidade e coloca em igualdade de condições milhões de brasileiros num País assombrosamente desigual

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Por Humberto Dantas
Atualização:

A Constituição Federal exige que a administração pública se comunique com a sociedade. Trata-se de um princípio que dentre outras características tem que zelar pela impessoalidade. Não existe, no entanto, nada que limite o caráter fantasioso de parte expressiva das peças publicitárias veiculada nas últimas décadas por diferentes governos. Isso arrefece, ou fere, o caráter educativo e informativo, aspectos adicionais dessa comunicação que por vezes são ignorados. Mas absurdo tem limite.

O presidente Jair Bolsonaro durante anúncio de uma nova linha de crédito emergencial para empresas 

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A campanha do Executivo federal intitulada #oBRasilnãopodeparar (O Brasil não pode parar), custeada sem licitação a um custo de quase R$ 5 milhões, é um esbulho intelectual composto por um simples conjunto de fotos e leitura de um texto. Seu conteúdo tem claro objetivo de transmitir uma mensagem positiva sobre a necessidade de a economia não ofertar sinais de desgaste. Impossível.

Entraremos numa recessão como grande parte do mundo, e isso não depende apenas de nosso modo de enfrentar a crise. Fosse diferente e o inimigo não se chamaria pandemia. Assim: o que existe de mais razoável é ter a coragem de seguir o que preconizam as autoridades mundiais de saúde, a despeito das flexibilizações recentes do ministro, da verborragia da família do Planalto e das previsões astrológicas da Virgínia.

A campanha coloca em igualdade de condições milhões de brasileiros num País assombrosamente desigual. A campanha sugere que o País parou, e isso é uma mentira. Tivesse parado, sequer algo desse tipo teria sido produzido e exibido. A campanha compara ocupações que efetivamente não podem parar, sobretudo no universo público, com profissionais que têm absolutas condições de atuarem de suas casas em total isolamento –  sem parar. A campanha vende a falsa recomendação de que devemos voltar à realidade. Afirma que filhos, pais, netos e avós estão no mesmo barco. Não estão. E deixa de considerar, contraditoriamente, que medidas econômicas para socorrer empresas e empregos estão sendo tomadas justamente para que PARTE do país possa PARAR.

* CIENTISTA POLÍTICO E HEAD DE EDUCAÇÃO DO CLP

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