Alstom é investigada na Argentina

Oposição a Cristina Kirchner aponta irregularidades e superfaturamento em contrato para construção de trem-bala

PUBLICIDADE

Por Ariel Palacios
Atualização:

Lideranças da oposição acusam o ex-presidente Néstor Kirchner e sua mulher e atual presidente, Cristina Kirchner, de irregularidades no contrato que o governo assinou com a empresa francesa Alstom para a construção do polêmico trem-bala entre as cidades de Buenos Aires e Córdoba. A obra bilionária, afirmam os críticos dos Kirchner, estaria superfaturada. Segundo o governo, o custo seria de 2,5 bilhões, mas a oposição sustenta que esse valor será ultrapassado. As suspeitas sobre irregularidades cresceram com a súbita troca, por parte do consórcio Veloxia, liderado pela Alstom, do banco que realizaria o financiamento da obra. Em vez do original Banco Societé Générale (que colocava taxas de juros de 5,2% por 50% do custo da obra), o financiamento será realizado pelo Banco Natixis (que, segundo a oposição, coloca juros entre 11% e 12%). Além disso, os prazos para a apresentação de ofertas - no meio do clima de campanha eleitoral no final do ano passado - foi exíguo, o que teria complicado a participação de outros grupos na licitação. Diversas empresas pediram a ampliação dos prazos, mas foram ignoradas. Nos últimos meses, a Alstom e o governo negaram em diversas ocasiões a existência de irregularidades no contrato. A ferrovia especial para o trem-bala argentino deve ter 710 quilômetros de comprimento. Além da ferrovia propriamente dita, o consórcio liderado pela Alstom também se encarregaria da eletrificação, das obras de sinalização, comunicações e do fornecimento de material para o trem. A oposição e diversas ONGs sustentam que o dinheiro que será usado para a obra, considerada "faraônica", deveria ser aplicado na melhoria da colapsada e antiquada rede ferroviária nacional. Mas o governo Cristina defende o projeto alegando que proporcionará alta tecnologia para o país, além de 5 mil postos de trabalho diretos e 20 mil indiretos durante a construção da linha. Uma das denúncias foi apresentada pelo advogado Ricardo Monner Sans, famoso por ter apontado diversos casos de corrupção na última década e meia na Argentina, e pelo ex-deputado Mario Cafiero. Eles sustentam que o custo total da obra seria, na realidade, de US$ 13,49 bilhões. Segundo a denúncia, a "armadilha" do contrato seria o cálculo do custo. O cálculo oficial prevê que o euro reduzirá sua cotação perante o dólar, que passaria de US$ 1,35 a menos de US$ 1,20 ao longo dos próximos 30 anos. No entanto, Monner Sans e Cafiero ressaltam que a cotação do euro não é de US$ 1,35 tal como indica o contrato, mas sim de US$ 1,60. A denúncia, apresentada ao juiz Octavio Araóz de Lamadrid, indica que a licitação pública foi um "ato fictício com a intenção de dissimular o que na realidade é uma adjudicação direta a favor do grupo Alstom". Segundo Cafiero e Monner Sans pode-se "confirmar a adjudicação direta pela mudança radical no financiamento da obra por parte do Banco Natixis, totalmente diferente ao oferecido originalmente pela Alstom". Cafiero e Monner Sans sustentam que "os desfavoráveis antecedentes públicos da empresa Alstom deveriam ter motivado um processo seletivo mais estrito". Os denunciantes afirmam que "a estrutura de financiamento aprovada a favor do Banco Natixis é intensamente desfavorável, por encerrar um desmedido seguro encoberto contra um calote, além de ser uma simulação de empréstimo a 30 anos, quando, na realidade, seu prazo de pagamento é substancialmente menor". As denúncias, no entanto, não tiveram impacto, já que o governo conta com maioria tanto na Câmara de Deputados como no Senado. Analistas afirmam que os Kirchner possuem considerável influência na Justiça para bloquear o avanço das investigações. Na mídia, o espaço dedicado ao caso Alstom também foi pequeno, já que, nos últimos três meses, os meios de comunicação argentinos estiveram praticamente dedicados a cobrir a grave crise que o governo enfrenta com o setor ruralista. Apesar disso, o escândalo pode crescer. Especula-se que a Alstom também pretende abocanhar outras futuras licitações para a construção de um trem de alta velocidade entre Buenos Aires e o balneário de Mar del Plata (uma linha de 400 quilômetros) e outro entre a capital argentina e a cidade de Mendoza, a mais de 1.000 quilômetros de distância.

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.