Alencar volta, mas não fala mais de juros

Vice tem alta e brinca com imprensa

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Foto do author Fausto Macedo
Por Fausto Macedo e SÃO PAULO
Atualização:

José Alencar chegou em cadeira de rodas às 12h37 de ontem para sua primeira conferência com a imprensa, e foi também sua primeira aparição em público, 23 dias depois de enfrentar uma cirurgia de quase 18 horas para retirada de 9 tumores na região abdominal - o mais dramático e arriscado procedimento a que foi submetido o vice-presidente da República, de 77 anos, na longa batalha que trava contra o câncer. "Eu não queria chegar assim, os culpados são os médicos", disse, com a irreverência e o bom humor que marcaram o encontro de 26 minutos com os jornalistas, ainda no auditório do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo. "Andar eu posso, mas tenho que andar com mais destreza porque do contrário eu perco a eleição. Do jeito que eu estou andando não sei se já dá pra ganhar eleição." Seu relato foi permeado por elogios à equipe médica e agradecimentos às manifestações de apreço e carinho que chegam de toda parte. "Levando em conta as circunstâncias o quadro é muito bom, estamos muito animados e seguros", disse Alencar, que recebeu alta hospitalar "em boas condições clínicas" e agora inicia em casa um trabalho de fisioterapia para recuperação muscular. "Sob anestesia fiquei mais de 20 horas. Disseram que ia dar amnésia. Eu disse: então vai ser bom porque vou esquecer minhas contas. Mas a amnésia não veio, de modo que eu vou ter que pagar minhas contas." Desvencilhou-se da expectativa geral, até derrubou previsão do presidente Lula que, dia desses, ao visitá-lo, saiu do hospital falando que a primeira coisa que Alencar iria comentar eram os juros altos. "Eu não falo mais de juros, não falo porque vocês devem ter observado que nos últimos meses todo mundo está falando. Então, não precisa mais que eu fale." Também rejeitou uma prosa sobre política, muito menos quis analisar as declarações do senador Jarbas Vasconcelos (PE), que apontou corrupção no PMDB. Hoje no PR, Alencar saiu-se à mineira: "Vocês sabem que eu sou suspeito para falar do PMDB, meu primeiro partido. Tenho grandes amigos no PMDB. Quando a gente está no hospital, é incrível, não surgem assuntos de política, a gente fala só de saúde." Citou, um a um, os médicos a quem chamou de "profissionais excepcionais, companheiros " - Ademar Lopes, cirurgião oncologista, Roberto Kalil Filho, cardiologista, Paulo Hoff, oncologista clínico. Mariza, sua mulher, num canto da sala, anotou outros nomes da junta em um pedaço de papel e mandou entregar-lhe porque preocupada com que ele esquecesse de algum doutor. À mesa onde os repórteres instalaram microfones e gravadores, ela pôs a imagem em gesso de Nossa Senhora do Sorriso, presente de padre Marcelo. Comovido, Alencar fez uma revelação. "Eu tenho tido privilégio. Eu, às vezes, fico meio com complexo de culpa porque sou vice-presidente da República e os brasileiros todos deveriam ter um tratamento como esse que eu tenho tido. A expectativa de vida no Brasil seria outra. Eu fico triste de não poder oferecer a todos os brasileiros isso que eu tenho recebido." Ele rogou: "Eu quero pedir a Deus que não me dê nenhum dia de tempo de vida a mais a não ser que eu possa me orgulhar dele. Eu não quero que Deus me dê um dia a mais de vida a não ser que esse dia de vida seja objeto de orgulho não só da minha parte como da minha mulher, dos meus filhos, dos meus netos, dos meus irmãos, dos meus amigos e dos brasileiros." Às 13h05, amparado e sob aplausos, livrou-se da cadeira e dirigiu-se, vagarosamente, ao carro que o levou.

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