Agências reguladoras estão na berlinda e consenso é de mudança

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Por NATUZA NERY
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Criadas como sinal de avanço, boa gestão e independência em relação a governos durante a gestão Fernando Henrique Cardoso, as agências reguladoras entraram na berlinda com a crise aérea que culminou com o maior acidente da aviação brasileira. Independente de posições políticas ou motivações ideológicas, é consenso a necessidade de mudança no setor de regulação, seja para preservar a independência desses órgãos, seja para enfraquecê-los. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, reforçou o debate ao questionar a existência da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e lançar a indagação sobre em quais setores da economia as agências reguladoras seriam realmente necessárias. Ex-ministros, tanto da administração petista quanto tucana, divergem no tom. "A fórmula das agências não funcionou. Na prática, serviu para facilitar a promiscuidade dos interesses privados sobre o Estado", ataca o deputado Ciro Gomes (PSB-CE), ex-ministro da Integração Nacional, no primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva. Já o ex-ministro da Fazenda, Antonio Palocci, prefere preservar o modelo, com poucos reparos. "É fato que a agência (de aviação civil) está com problema, mas não deveríamos questionar o modelo. Se é preciso mudar a Anac, que se faça, mas é bom lembrar que a Anatel, a Aneel e a ANP estão funcionando", disse, sem apontar sugestões para tanto. A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) entrou para o contexto da crise atual como grande vilã do setor. Acusada de ineficiência e de servir aos interesses das companhias de aviação civil, acabou virando alvo preferencial de autoridades políticas. O acidente com o Airbus da TAM, em julho passado, deixou um saldo de 199 mortos e uma lista interminável de ataques ao órgão regulador, responsável por fiscalizar as empresas e o serviço prestado pelo governo. Para blindar as agências de interferência política, a legislação não só protege o colégio de diretores desses órgãos como lhes garante autonomia nos mandatos. "Quem foi que inventou essa história de que as contradições políticas vão ser resolvidas por uma agência mandatada", pergunta Ciro Gomes. Essa fórmula, aprovada no governo Fernando Henrique Cardoso contra a vontade do PT e de partidos mais à esquerda, seguiu a lógica de dar mais segurança ao mercado. "A agência é especialmente importante quando tem atividade muito concentrada, sobretudo após a privatização. Acho que o modelo foi muito bem concebido, muito bem executado, mas desvirtuado nos últimos quatro anos. Houve politização das agências. É preciso exigir indicações técnicas para essas instituições", rebate o deputado Paulo Renato (PSDB-SP), ex-ministro da Educação no governo FHC. "O modelo funciona, mas precisa ser aperfeiçoado", acrescenta. NOVA LEGISLAÇÃO O debate sobre o modelo, a função e a eficácia das agências ganhou contornos emocionais após a tragédia com o avião da TAM. O calor das discussões levou o presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), a adiar a votação do projeto das agências reguladoras, ao menos por enquanto. No caso específico da Anac, um diretor só pode ser destituído do cargo pela via política se sofrer um processo administrativo interno, instaurado pelo ministro da Defesa. Apesar de ter seu nome aprovado pelo Senado, após indicação do Executivo, ele também não pode ser convocado a prestar esclarecimentos ao Congresso, apenas convidado. Muitos dos que advogam mais rigor às agências se incomodam com o grau de blindagem dos órgãos reguladores. "A Anac é um equívoco grosseiro, devia ser extinguida (...) A tragédia é só caricatura dramática disso", diz Ciro Gomes.

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