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Acusador de Maluf em Nova York vira advogado

Promotor que pôs ex-prefeito na lista da Interpol almoçou com defensores de deputado em São Paulo

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Foto do author Fausto Macedo
Por Fausto Macedo
Atualização:

Por quase 20 anos mister Adam Kaufmann desempenhou o papel de superpromotor de Nova York para combate ao colarinho branco, corrupção e lavagem de dinheiro ilícito. Um capítulo marcante de sua carreira foi a ação que moveu contra o deputado Paulo Maluf (PP-SP), acusado de roubo perante o Grande Júri de Manhatann. A incansável atuação de Kaufmann culminou no mais pesado revés já imposto ao ex-prefeito paulistano - sua inclusão na difusão vermelha, o índex dos mais procurados da Interpol (Polícia Internacional) em todo o mundo.Na semana passada, Kaufmann passou por São Paulo. Mas ele não veio para reunir mais provas contra o político brasileiro, ora cumprindo segundo mandato consecutivo na Câmara. A missão de Kaufmann era outra: um almoço com advogados do próprio Maluf, a quem entregou cartão de visitas de sua nova trincheira: o escritório Lewis Baach Kaufmann Middlemiss, destacada banca de advocacia instalada em Washington que se dedica a complexas causas internacionais.O almoço foi em um restaurante no Itaim. Kaufmann estava acompanhado de seu antigo colega da promotoria de Nova York, Arthur Middlemiss. Dois advogados de Maluf deram as boas vindas aos antigos oponentes no tribunal americano.

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Kaufmann fez uma explanação sobre suas novas funções, agora do outro lado do balcão, como se diz no mundo forense. Dali partiu para uma reunião na sede de famosa banca de advocacia societária e corporativa, no Centro de São Paulo, onde também passou seus contatos.Algoz de Maluf, o superpromotor deixou em janeiro o ofício de acusador e rastreador de tesouros ilícitos que migram pelo sistema financeiro de seu país. Desligou-se após cumprir rigorosa e bem sucedida jornada de 18 anos e meio no Ministério Público dos Estados Unidos.No último dia 13, ele e Middlemiss ingressaram no Lewis Baach, que orgulhosamente adotou o sobrenome de seus novos quadros, apresentados como "dois proeminentes profissionais de combate ao colarinho branco que ingressaram na empresa".Para abrigar os serviços de Kaufmann e Middlemiss, a banca instalou-os em escritório de Nova York.A nova função de Adam Kaufmann não significa que ele vai desfazer o muro que construiu para emparedar Maluf. Não há registro algum de que, em alguma oportunidade, irá defender o ex-prefeito.O detalhe é que o escritório americano que abriu as portas para Kaufmann mantém cordiais relações com os causídicos brasileiros que desde sempre se dedicam à defesa de Maluf.No processo contra Maluf não houve ação conjunta das duas bancas, mas em outras demandas elas já fizeram parceria - como numa causa sobre uma instituição bancária. Quando necessita de um representante nos Estados Unidos, em disputa de âmbito internacional, os defensores do ex-prefeito recorrem ao Lewis Baach.Kaufmann e Middlemiss ocuparam posições de liderança sênior do escritório da Procuradoria de Nova York.Kaufmann, o ex-chefe da Divisão de Investigação, supervisionou mais de 100 promotores que cuidaram de causas penais envolvendo colarinho branco internacional, violações das sanções e o crime organizado.Middlemiss, o ex-chefe de uma agência que incidiu sobre o crime de colarinho branco internacional, conhecido informalmente como DANY Overseas, deixou a cadeira em 2007 - recentemente, trabalhou no JPMorgan Chase & Co., onde ocupou cargos seniores em programa de anti lavagem de dinheiro e foi nomeado o seu primeiro Diretor do Programa Anti Corrupção Global.Em seus tempos de promotor, Kaufmann notabilizou-se e ganhou a confiança e a admiração de seus pares brasileiros como grande colaborador no cerco implacável a doleiros do caso Banestado (evasão de US$ 30 bilhões) e a Maluf.Compartilhou informações com os promotores do Ministério Público de São Paulo que aqui movem ações contra o ex-prefeito, a quem acusam de corrupção, improbidade, lavagem de dinheiro. Fazia parte de sua rotina, por exemplo, rastrear valores depositados em instituições financeiras americanas por políticos de outros países, como o Brasil.As intervenções de Kaufmann levaram à inclusão do ex-prefeito na difusão vermelha da Interpol, em 2009, depois que a Justiça americana mandou prende-lo.Maluf pode até sair do Brasil, mas corre o risco de ser algemado em qualquer lugar do planeta - quase 200 países integram a malha da polícia internacional.Em 2010, de passagem por São Paulo, onde prestigiou o 1.º Congresso do Patrimônio Público e Social do Ministério Público, Kaufmann falou de Maluf. "Eu investiguei o sr. Maluf. Ele foi acusado em Nova York por crimes em Nova York, não no Brasil. Eu fiz o meu trabalho. Depois de 16 anos de promotoria é difícil me chocar. É difícil para mim entender a cultura daqui (do Brasil). Eu acho que as instituições têm que crescer. O Brasil é um grande parceiro. Encontrei promotores e juízes que são dedicados e que trabalham duro, que querem fazer as coisas acontecer."Adam Kaufmann confirma o encontro com advogados de Paulo Maluf. Mas assegura que não tratou de assunto relativo às ações contra o ex-prefeito. "Eu não estou mais envolvido no caso. E discutir o caso teria sido um tanto inadequado."Kaufmann não vê conflito ético em sua nova missão. Ele destacou que deixou a promotoria de Manhattan depois de 18 anos e meio de serviços, em janeiro de 2013. "Entrei para um pequeno escritório de advocacia, Lewis Baach, que tem experiência em lidar com litígios internacionais complexos e recuperação de ativos", observou o homem que comandou um núcleo de mais de 100 promotores de Nova York.Ele informou que a banca vai funcionar em Nova York como Lewis Baach PLLC Kaufmann Middlemiss. "Meu parceiro em NY, Arthur Middlemiss, era o chefe de Gabinete do Procurador Distrital de Crimes Financeiro Internacional."

Há cerca de 6 anos, Middlemiss deixou o gabinete do procurador e migrou para o JP Morgan Chase, onde projetou e executou o programa anti corrupção global. "Na minha posição anterior, supervisionei todas as investigações de lavagem de dinheiro internacional, a corrupção, o financiamento do terror, fraude e evasão", assinala Kaufmann."A maior parte de nossa nova prática está ajudando os bancos estrangeiros a cumprir as melhores práticas globais e padrões internacionais de anti branqueamento de capitais, anti corrupção e de sanções geralmente internacional a crimes financeiros", argumenta.Kaufmann disse que em sua breve visita ao Brasil encontrou-se "com muitos advogados e banqueiros para discutir essas questões". Ele é taxativo. "Não vejo conflito ético no trabalho."Relata que promotores de Manhattan "são treinados para seguir os fatos e aplicar a lei sem medo ou favor". "Os procuradores distritais em Nova York tendem a ser extremamente não políticos. No meu tempo, eu vi o escritório (da Procuradoria) processar aliados políticos que infringiram a lei, e processar os ricos e famosos com o mesmo profissionalismo. Os procuradores distritais em NY tendem a ser extremamente não políticos. Assim, um promotor deixando o setor público não poderia trabalhar em qualquer assunto que ele trabalhou como promotor.""Estamos muito satisfeitos que Adam Kaufmann e Middlemiss estão se juntando a nossa empresa, nós tivemos uma relação de respeito mútuo e amizade por muitos anos", declarou o sócio sênior Eric Lewis ao site do escritório. "Sua decisão de se juntar ao Lewis Baach é mais uma prova da crescente tendência entre os grandes talentos para escolher empresas baseadas em conhecimento e foco, ao invés de tamanho e número de áreas de atuação."

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