ABI vê campanha de intimidação em ações da Universal

Igreja tenta usar Justiça contra livre exercício do jornalismo, reforça ANJ

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Por Moacir Assunção
Atualização:

A Associação Brasileira de Imprensa (ABI) classificou como "uma campanha de intimidação e coerção sem precedentes na história da comunicação no Brasil" as ações judiciais contra jornalistas e a direção de três jornais, Folha de S. Paulo, Extra e A Tarde de Salvador, por fiéis e pastores da Igreja Universal do Reino de Deus. As ações questionam reportagens dos veículos que tratam do patrimônio de Edir Macedo, líder da igreja, e agressões a imagens de santos católicos por membros da Universal. O presidente da ABI, Maurício Azêdo, afirmou que o fato de as ações terem sido ajuizadas em localidades distantes - onde, em alguns casos, só é possível chegar de barco - demonstra a intenção dos autores: "Há a nítida intenção de dificultar o direito de ampla defesa e do contraditório assegurado pela Constituição", argumentou Azêdo. Da mesma forma, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) se manifestou contra a conduta da Universal. "É uma intimidação ao livre exercício do jornalismo e uma tentativa espúria de usar o Poder Judiciário contra a imprensa e privar o cidadão de ser informado", afirmou, em nota, a entidade. O diretor de Redação da Folha de S. Paulo, Otavio Frias Filho, disse que o jornal respeita todas as religiões, mas isso não está em questão. "O que estamos discutindo é o direito de o jornal realizar seu trabalho jornalístico sem sofrer cerceamento por parte de quem quer que seja. A ação orquestrada configura litigância de má-fé." A assessora jurídica de A Tarde, Ana Paula Cardoso de Morais, demonstrou preocupação com as ações. "Se a moda pegar, estará extinta a liberdade de imprensa no Brasil", criticou. A empresa responde a 35 ações propostas por pastores da Universal e fiéis que pedem indenizações de R$ 1 mil a R$ 15 mil por supostos danos morais causados por uma reportagem assinada pelo repórter Valmar Hupsel Filho sobre o vandalismo contra uma imagem de São Benedito por um fiel da igreja. As ações, que alegam "discriminação religiosa", foram ajuizadas em cidades como Uruguaiana (RS) e Araguatins (TO). A linha de defesa do jornal tem se baseado na "falta de legitimidade de fiéis para propor ações, já que a Universal tem personalidade jurídica e seus autores não foram citados nas reportagens". A empresa Folha da Manhã, que edita a Folha de S. Paulo, foi alvo, de acordo com a advogada Taís Gasparian, de 50 ações - quatro já extintas - por causa de reportagem de Elvira Lobato, que mostra o aumento do patrimônio da Universal. A igreja e Edir Macedo controlam, segundo a reportagem, 23 emissoras de TV e 40 emissoras de rádio, além de 19 outras empresas. No caso do carioca Extra, os processos são contra a empresa e seu diretor de redação, Bruno Thys. Cinco pastores alegam, no pedido inicial, estar "correndo o risco de sofrer agressões diárias e discriminações". Thys contesta as alegações. "Cumprimos o nosso dever de informar e confiamos na Justiça. De fato, causa estranheza a semelhança nos textos das ações e a coincidência das datas." A leitura das ações sugere que os vários processos tiveram matriz única. Os pedidos de indenização contêm parágrafos idênticos, como se tivessem sido preparados pela mesma pessoa - o que indica uma ação orquestrada. ILEGÍTIMAS Em sentença na cidade de Xapuri (AC) em ação contra a Folha de S. Paulo, a juíza Zenair Ferreira Bueno anotou em sua decisão contrária ao autor, Maurício Muxió dos Santos, que "é impossível acreditar que 30 fiéis, nos mais distantes rincões do País, tenham sido abordados com os mesmos dizeres citados na ação". Outros 29 fizeram a mesma petição. O autor alegou que estava sendo ofendido na rua por causa da reportagem. "O Poder Judiciário não pode admitir que seja usado por quem quer que seja que pretenda atingir objetivo ilegal", advertiu a juíza, em sua sentença. Procurado por meio da assessoria de imprensa da Rede Record, o advogado de Edir Macedo, Artur Lavigne, não se manifestou sobre o caso.

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