A luta de Aécio contra o abandono

Retorno do tucano ao Senado mostra um político isolado, cenário oposto ao de 2014

Foto do author Julia Lindner
Por Renan Truffi e Julia Lindner
Atualização:

BRASÍLIA - No dia 4 de novembro de 2014, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) voltou ao Congresso depois de quase vencer a presidente cassada Dilma Rousseff nas eleições. Foi ovacionado por aliados e militantes do partido, que o cercavam para cumprimentá-lo. “Eu não podia esperar uma recepção tão forte, tão marcante”, disse, na ocasião, diante de uma multidão que o seguia pelo Salão Azul da Casa.

O senador Aécio Neves (PSDB-MG) chega ao Senado após 46 dias fora do Congresso Nacional após ter suas funções parlamentares restituídas pelo STF, em 4 de julho Foto: André Dusek/Estadão

PUBLICIDADE

Quase três anos depois, Aécio retornou novamente ao Senado, desta vez após ficar afastado mais de um mês das atividades parlamentares por ordem do Supremo Tribunal Federal. Diferentemente de 2014, o que se viu foi um senador abandonado por aliados e com a imagem fragilizada, algo que ele mesmo percebeu, segundo pessoas próximas. Ainda que tenha conseguido se salvar no Conselho de Ética da Casa, o tucano luta agora para permanecer como presidente do PSDB.

O isolamento de Aécio ficou evidente logo na sua chegada ao Congresso, na terça-feira passada. Acompanhado do tucano José Aníbal (SP), o senador veio em seu carro particular, como de costume. Ao chegar, não quis falar com a imprensa. Foi recebido por uma única correligionária quando desceu do carro, a jovem deputada Bruna Furlan (PSDB-SP). Ela disse que soube “por acaso” que o presidente licenciado do partido chegaria, e que os outros parlamentares não foram avisados.

Aécio se dirigiu ao gabinete do senador e presidente interino do PSDB, Tasso Jereissati (CE), por onde também passaram alguns parlamentares. Por mensagem, aliados foram convocados para acompanhá-lo no caminho até o plenário, mas somente três deputados seguiram lado a lado com Aécio no momento em que a imprensa registrou o percurso. Uma imagem diferente daquela feita no fim de 2014, quando até deputados de outros partidos pousavam atrás do ombro de Aécio.

Segundo parlamentares próximos ao senador, o “desamparo” se deu por causa de votações importantes que ocorriam no Congresso naquele momento. “Ele não quis fazer um espetáculo político. Se ele quisesse, ele colocava cem pessoas ali, do lado dele, mas obviamente seria um gesto inadequado”, disse o deputado Domingos Sávio (PSDB-MG), aliado de Aécio.

Sobre supostas traições de antigos aliados, Aécio disse no gabinete de Jereissati que não esperava ter de aprender lições como essa nos cerca de 45 dias em que ficou impossibilitado de exercer o cargo.

Os colegas do mineiro afirmaram ainda que, apesar da soltura de sua irmã, Andrea Neves, e do primo, Frederico Pacheco, o senador continua emotivo. Seus olhos marejam quando fala sobre esse assunto.

Publicidade

Antes de fazer o discurso na tribuna do Senado, Aécio reafirmou aos deputados e senadores presentes que não cometeu nenhum crime. E “demonstrou rancor” contra o empresário Joesley Batista, responsável pela gravação de áudio que o expôs pedindo R$ 2 milhões.

“Ele foi de peito aberto e o cara (Joesley Batista) armou para ele. É gente que não tem caráter. O único que ele mencionou pessoalmente foi o Joesley”, contou o deputado Marcus Pestana (PSDB-MG), um dos aliados do senador que passaram para cumprimentar o mineiro.

A reportagem do Estado/Broadcast apurou que o senador mineiro quer manter uma indefinição sobre o comando do partido até a votação da denúncia contra o presidente Michel Temer na Câmara. Aos mais próximos, ele tem justificado que a saída do comando do PSDB o enfraqueceria muito.

O intuito é evitar que Tasso assuma o cargo definitivamente e ganhe mais força para defender o desembarque do governo antes do pleito.