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Um sedutor socrático-cristão

Pré-candidato do PMDB à Prefeitura, Chalita mistura repertório filosófico, pessoal e religioso em palestras

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Por Felipe Frazão
Atualização:

Aristóteles, São Tomás de Aquino, Santo Agostinho, Rubem Alves, Zygmunt Bauman e... Gabriel Benedito Issaac Chalita. Com referências a pensadores clássicos, pós-modernos e à história pessoal, o deputado federal-professor-advogado-escritor-ensaísta-cantor-filósofo e ex-seminarista, de 42 anos, tenta conquistar o voto à Prefeitura de São Paulo em diferentes plateias. Ainda que os significados por trás de sua retórica nem sempre sejam compreendidos, Chalita tem se mostrado um sedutor político.

Há pelo menos um mês, Chalita cumpre agenda de pré-campanha na capital paulista, onde mora, no bairro de Higienópolis. Mas não larga a rotina de parlamentar no Congresso Nacional, em Brasília. De terça a quinta-feira fica no Planalto Central; de sexta a segunda-feira, frequenta círculos sociais paulistanos.

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Entre os compromissos, Chalita fala, na condição de postulante ao cargo do Executivo municipal, a moradores de grotões da cidade (extremos pobres das zonas norte, leste e sul) e a empresários paulistanos - com os quais senta à mesa para jantar. Discursa em colégios católicos e universidades protestantes - onde também leciona. Ensina princípios éticos e cristãos a pré-candidatos a vereador do PMDB. E sempre fala de si nas palestras - e tenta não deixar a vaidade se sobrepor ao pré-candidato.

"Ao falar da vida particular dele, o Chalita toma o cuidado de não exagerar para não criar rejeição no auditório. Uma das estratégias é baixar o tom de voz, para mostrar que ele é secundário, embora não seja", explica o professor da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e especialista em análise do discurso político, Carlos Piovezani.

Autor do ensaio A Sedução no Discurso (de orientações a advogados e análise de argumentações jurídicas), Chalita interpreta papéis e se faz ator, como recomenda no livro para atingir a sedução, o engajamento à ideia do orador. E talvez o voto.

Em tom professoral, Chalita costuma abrir as palestras com um chamado de atenção. Sorri, dá "boa noite" e exige um sonoro cumprimento dos ouvintes de volta, para, só então, discursar.

Segura o microfone com a mão esquerda - a mesma na qual ostenta um relógio prateado. Com o braço direito, gesticula. Estende-o ao lado e à frente do corpo. Olha no olho, usa a linguagem corporal. Chalita só discursa de pé. Veste-se de maneira despojada e alinhada. Reveza camisa nas cores azul ou branca, sempre de corte ajustado ao corpo, para fora da calça, mangas dobradas na altura do antebraço e o botão de cima aberto. No bolso esquerdo, as iniciais G.C.. Usa sapatos de bico alongado. E jeans da marca Diesel.

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Conduz o discurso por diálogos, o que chama "maneira socrática" de palestrar. E abre espaço para perguntas. "Ele busca estabelecer um efeito de franqueza, de quem sabe ouvir. Mesmo que seja um discurso monológico, ele dá a impressão de diálogo", analisa Piovezani.

O peemedebista falseia a voz e encena passagens de sua vida. E conta sua história, típica do garoto do interior que foi tentar a vida na capital e venceu. Ao mesmo tempo, fala em linguagem de acadêmico, lembra ser escritor de 63 obras literárias. Assim, consegue criar identificação com classes sociais distintas. "É um bom orador. Circula entre o erudito e o ordinário", diz Piovezani. "Uma palavra que o define é equilíbrio. Ele não quer ser taxado de distante do povo, mas também não é o Lula, um candidato popular."

Cena 1. Chalita mostra ao mesmo tempo erudição e simplicidade, explicando de maneira muitas vezes superficial conceitos complexos e pouco palatáveis, dependendo do público.

Evoca filósofos como Sócrates e Aristóteles para pregar a obsessão pela verdade e pelo comportamento ético. "A política é uma esfera em que se produz discursos que despertam desconfiança, todos são tomados por esse estigma de que são mentirosos. Ele tenta se afastar disso", diz Piovezani. Sinal disso é que o PMDB o chamou para ensinar "ética na política" a 70 pré-candidatos a vereador. Ele entrou na sala na hora marcada, às 19h30. "Pontual, por questão de ética", disse. Um e outro pré-candidato a vereador ainda saiu da aula sem entender muito, perguntando o que era a tal hermenêutica que o professor citara.

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Nas raras vezes em que o mestre de cerimônias não enumera os títulos e cargos ocupados por Chalita, ele o faz ao longo do discurso. Informa que se elegeu vereador na cidade natal, Cachoeira Paulista, e que aos 19 anos ocupou a presidência da Casa. Revela que veio de família humilde, de imigrantes libaneses - o pai era servente de escola. Filho caçula, diz que recebia carinho especial do pai quando garoto. Leitor e escritor mirim, tornou-se professor precoce e religioso. Recorre sempre a parábolas bíblicas. O peemedebista diz que é preciso "cuidar das pessoas", lembrando o mandamento do amor ao próximo.

Cena 2. Chalita lança frases de efeito, como "tenho mais dúvidas do que certezas" e "somos seres em construção" para cativar a plateia. "Ali você percebe que tem uma preocupação retórica, que ele quer ser lembrado. O auditório fica impactado", diz Piovezani.

A estratégia funciona. Na noite de segunda-feira, após 50 minutos ao microfone, falando de conceitos de educação, com pitadas sobre problemas da metrópole, Chalita cedeu a palavra à plateia, majoritariamente de mulheres. A primeira pergunta revela que a forma pode impressionar mais que o conteúdo: "Quero saber se o sr. vai ser candidato e a quê?", indagou uma senhora sentada à primeira fila. "Já tem meu voto."

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