Relator afirma que revisor advoga para réu

Em debate sobre penas, Lewandowski questiona se colega de Supremo é 'promotor'; após novo bate-boca da dupla, Barbosa pede desculpas

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Por Felipe Recondo , Eduardo Bresciani , Ricardo Brito , MARIÂNGELA GALLUCCI e BRASÍLIA
Atualização:

A definição das penas que serão impostas pelo Supremo Tribunal Federal aos 25 condenados do mensalão provocou ontem a mais grave das discussões entre o relator do processo, Joaquim Barbosa, e o revisor, Ricardo Lewandowski. Barbosa chegou a afirmar que Lewandowski advogava para o empresário Marcos Valério. As discussões retardaram a sessão de ontem e confirmaram que o julgamento seguirá em ritmo paulatino e invadirá o mês de novembro. O tribunal teve ontem a segunda sessão apenas para estabelecer as penas para os crimes cometidos apenas por Marcos Valério. Ainda não está definido o critério segundo o qual as punições serão calculadas - se haverá acúmulo por crimes iguais cometidos em situações diferentes do esquema, por exemplo.A nova discussão entre relator e revisor - ambos já protagonizaram vários bate-bocas em plenário neste julgamento - ocorreu quando Barbosa impunha pena de 4 anos e 8 meses de reclusão mais multa de R$ 504 mil para Valério por ter oferecido propina ao ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato em troca da liberação de R$ 73 milhões para o esquema.Lewandowski estipulou pena de 3 anos, 1 mês e 10 dias mais multa de R$ 117 mil. As duas propostas foram colocadas em julgamento e o cálculo feito pelo revisor foi acompanhado pela maioria dos integrantes do Supremo. Barbosa, então, afirmou que o sistema penal brasileiro é "risível". "Estamos a discutir sobre a pena a ser aplicada a um homem que fez o que fez na engrenagem do Estado brasileiro. Ele vai ser condenado a 3 anos. Na prática, não cumprirá 6 meses, 3 meses ou 4 meses, no máximo", disse. Lewandowski retrucou, lembrando que essa pena não será cumprida isoladamente e revelou que, por seus cálculos, a pena a Marcos Valério chegará "a um quarto de século". "Ele não vai cumprir as penas isoladamente. No meu cálculo, já passa de duas décadas", disse o revisor. Barbosa rebateu: "Três anos para quem desviou mais de R$ 70 milhões!". "Vossa Excelência acha pouco?", questionou Lewandowski. "Tenho certeza que não cumprirá mais de seis meses", respondeu o relator. "Vossa Excelência está sofismando", criticou Lewandowski. O relator então questionou as intervenções de Lewandowski. "Vossa Excelência advoga para ele?". "Vossa excelência faz parte da promotoria?" O presidente do tribunal, Carlos Ayres Britto, repreendeu: "Ministro Joaquim Barbosa, ninguém aqui advoga para ninguém". Barbosa, apontando para Lewandowski, reclamou. "Ele está sempre defendendo (os réus)."Barbosa disse, apesar de ter acusado Lewandowski de defender os réus, que a crítica era ao sistema penal brasileiro. Lewandowski rebateu, afirmando que se quisesse mudar o sistema penal deveria ir ao Congresso. "Infelizmente vivemos no Brasil. Temos que mudar de lado e ir para o Congresso Nacional. Somos aplicadores da lei", respondeu. "Moro no País e lutarei para que ele mude", retrucou Barbosa. O ministro Celso de Mello rebateu Barbosa. "Eu não seria tão crítico ao nosso sistema", afirmou, lembrando que a Noruega condenou a 21 anos de prisão o atirador Anders Behring que matou 77 pessoas em 2011. Marco Aurélio também repreendeu Barbosa: "A virulência não é produtiva".No retorno à sessão e após ouvir as críticas dos colegas, Barbosa pediu desculpas. "Eu gostaria mais uma vez de externar a minha preocupação quanto ao ritmo da nossa dosimetria e dizer que estou muito preocupado. E isso tem me levado a me exceder ao me levar a rebater de uma forma exacerbada o ministro Ricardo Lewandowski", admitiu. "Quero pedir desculpas ao ministro Ricardo Lewandowski pelo excesso." Lewandowski aceitou, dizendo que as divergências técnicas entre ambos não desbordam para o lado pessoal.

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