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Quando a delação premiada cruza com a ética

Por PROFESSOR DE DIREITO PENAL DA USP
Atualização:

Análise: David Teixeira de AzevedoA delação premiada é instituto jurídico que atende o interesse estatal de persecução de crimes e o interesse do cidadão, que mudou sua escala de valores, de ver a responsabilidade criminal excluída ou diminuída como resultado da colaboração com a Justiça. Está permeado de eticidade. De um lado, o valor positivo de o Estado eficiente e eficazmente combater a criminalidade; de outro, o valor ético da concessão de benefício legal para quem, reformulado os valores, pretende orientar a vida aderente às normas jurídicas e sociais. Não se pode é prestigiar uma ética torta, fixada na fidelidade de membros de grupo criminoso.Pode-se bem ou mal utilizar o instituto. No mensalão, Marcos Valério utilizou mal. Na operação Porto Seguro, pode Paulo Vieira utilizá-lo bem. Explico. Valério pretendeu no início das investigações colaborar com a Justiça fornecendo informações já do conhecimento das autoridades. Mais: ele não admitiu infrações das quais participara. Já em setembro, delineada a condenação, pretendeu a colaboração, contaminada, porém, de oportunismo, que degrada o instituto da delação. Marcos Valério não almejou o favor legal porque arrependido ou porque reformulados seus valores, mas para fugir da alta e inevitável condenação. Se a nova colaboração tem valor, sê-lo-á para os novos delitos imputados a novos agentes, por exemplo, a Humberto Costa, ao ex-presidente Lula e ao fiel Freud Godoy. Não vale, para ele, a possibilidade de delação a qualquer tempo, trazida pela Lei de Lavagem de Dinheiro. Ela diz respeito aos crimes de lavagem tipificados nessa lei e não aos antecedentes.Já para Paulo Vieira, eventual delação premiada, mesmo com a recente denúncia, parece adequada. O inquérito policial foi encerrado com muita brevidade sem explorar todos os veios de investigação e ele pode colaborar objetivamente com novos fatos de interesse para a investigação criminal. O instituto da delação premiada não acolhe espertos, mas pessoas sinceras e transparentes.

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