'O comportamento do PSDB é de inimigo'

Liderança expressiva do partido criado por Kassab, senadora critica oscilação do prefeito da capital ora ao PT, ora ao PSDB

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Por João Bosco Rabello e BRASÍLIA
Atualização:

As articulações do prefeito Gilberto Kassab, que levaram o PSD a abdicar de uma aliança com o PT para apoiar o PSDB, não foram absorvidas pacificamente pelo partido. A senadora Kátia Abreu (TO), uma das lideranças nacionais mais expressivas da legenda, se disse surpreendida nos dois momentos: no ensaio de Kassab para apoiar o pré-candidato do PT, Fernando Haddad, e na guinada definitiva do prefeito para a candidatura de José Serra (PSDB).

Inconformada com a falta de diálogo no partido, a senadora defende o envolvimento do diretório nacional nas negociações de alianças. O recente discurso do ex-governador José Serra, afirmando a nacionalização da campanha paulistana, foi na contramão da garantia dada por Kassab de que o acordo é restrito à eleição municipal.

Mesmo assim, a garantia foi posterior, reclama a senadora, e não considerou o apoio do PSDB à frente partidária que contesta a reivindicação do PSD por tempo de propaganda eleitoral gratuita proporcional à sua bancada. "O comportamento do PSDB não é de aliado, mas de inimigo", diz ela.

O tempo de TV é o que mais incomoda o PSD por ser decisivo para a consolidação da legenda não só nessas eleições municipais, como também em 2014. O partido teme que a "desfeita" ao PT produza a adesão governista à frente de oposição contra a legenda no TSE.

Na avaliação de Kátia Abreu, ao desfazer um acordo de sua própria iniciativa, o prefeito comprometeu o discurso de independência do partido com relação ao seu projeto nacional .

Cuidadosa no tratamento pessoal a Kassab e Serra ela disse ao Estado considerar que o partido está sendo conduzido de forma individual, priorizando os interesses paulistas em detrimento do resto.

A sra. se diz insatisfeita com a aliança que o prefeito Gilberto Kassab promoveu com o PSDB em São Paulo. Por quê?

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Por ser São Paulo o centro político mais importante do País, o que lá se decide afeta as demais bases do partido. Por isso, a aliança com o PSDB, na sequência de uma articulação idêntica com o seu antípoda, o PT paulista, transbordou o âmbito da política municipal. E poderia estar precipitando definições sobre o futuro político do partido.

Como assim?

O que ali ocorrer, na eleição, será decisivo para a sucessão presidencial de 2014. Isso, portanto, não é questão apenas da seção paulistana do PSD. Envolve o projeto nacional do partido.

E que projeto é esse?

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O PSD surgiu com o propósito de mudar paradigmas da política que consideramos anacrônicos e nocivos. Um deles: partidos com donos, que decidem à revelia dos filiados. O PSD se comprometeu com a democracia interna; ouvir a militância, não fazer política com fatos consumados. Outro fundamento: não ser sistematicamente a favor ou contra. Definir apoios tendo em vista princípios programáticos. Somos um partido defensor da economia de mercado, do Estado democrático de direito e da autonomia do indivíduo perante o Estado. O que favorecer nosso ideário terá nosso apoio, seja qual for o governo. Nossa missão na política é nos tornarmos fator de moderação, impedindo que seja ocupada pelo radicalismo ideológico, de direita ou de esquerda, o que implica fortalecer o centro.

Mas a aliança com José Serra não fortalece isso, na medida em que junta forças de centro-esquerda e centro-direita?

Não se trata de nomes. O Serra é um dos nomes mais qualificados da política nacional, possivelmente o melhor de sua geração. Ocorre que, em São Paulo, estabeleceu-se, há anos, uma bipolaridade radical, entre tucanos e petistas. E, ao apoiar um dos lados, após flertar com o lado oposto, o PSD associou-se ao ambiente de radicalismo, deixando de ser um fator moderador. E há mais: fez isso sem levar em conta o compromisso com a democracia partidária.

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Isso a indispõe com Kassab?

De modo algum. Estou praticando a democracia interna, com questionamentos leais. O prefeito é um democrata, mas, certamente envolvido com os desafios da política paulista, não avaliou sua repercussão sobre as demais seções do partido. A política local é importante e tem suas particularidades, mas não deve perder de vista a nacional. Quanto mais importante a seção partidária, maior sua responsabilidade. O PSD nacional, por exemplo, enfrenta neste momento uma articulação antidemocrática e absurda, que consiste em tentar suprimir-lhe na Justiça o tempo de TV na campanha. E quem lidera esse movimento? O PSDB. Não me consta que a aliança estabelecida em SP incluiu a revogação desse ato hostil. Pior: pelos ressentimentos que pode ter causado no PT, frustrando uma aliança proposta pelo próprio PSD, estimulará a adesão governista à iniciativa truculenta.

Pedirá reavaliação da aliança?

Quero que diretório nacional seja ouvido e esclarecido a respeito dessas questões que aqui resumidamente coloquei.

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