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Na internet, atos mobilizam 136 milhões Grupos deram ajuda aos manifestantes

Entre os dias 13 e 21 deste mês, foram mais de 2 milhões de citações sobre protestos, ante 214 mil sobre a Copa das Confederações

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Foto do author Anna Carolina Papp
Por Anna Carolina Papp e Camilo Rocha
Atualização:

O escritório do consultor de vendas e ativista online Lúcio Amorim fica em posição privilegiada, no 18.º andar de um prédio na Avenida Rio Branco, no centro do Rio. Na noite de segunda-feira passada, uma das principais vias da cidade estava tomada por milhares de pessoas. "Quando vi que estava muito maior que qualquer coisa que já tinha visto, preferi esperar só para fazer este registro histórico", disse. O resultado foi um vídeo de seis segundos, registrando a passeata de ponta a ponta, transmitido pelo aplicativo de vídeos criado pelo Twitter chamado Vine.Rapidamente, o vídeo virou hit na internet e se tornou uma das imagens mais divulgadas dos protestos no Rio. Foi transmitido pelo Wall Street Journal, pela emissora canadense CNBC e pela britânica BBC, que entrevistou Amorim. É um exemplo de como os protestos das últimas duas semanas consolidaram a importância da internet e das redes sociais como ferramentas de comunicação no País. Muitos recorreram aos serviços para se informar, a partir de relatos no Twitter e no Facebook. Vídeos como o de Amorim simbolizaram os eventos tanto ou mais do que as imagens feitas por redes de televisão.O fluxo paralelo de informação possibilitou fazer comparações com as versões das autoridades. "Muitos representantes do poder não são atualizados sobre as ferramentas," disse a jornalista e blogueira Sam Shiraishi, especializada em ativismo social. Um exemplo foi o vídeo amador que mostra um policial quebrando o vidro de uma viatura, sugerindo tentativa de forjar uma ação de vandalismo. "A violência que se viu na quinta-feira (dia 13) foi em grande parte desmascarada por esses vídeos", diz o professor Pablo Ortellado, do Grupo de Pesquisa em Políticas Públicas para o Acesso à Informação da Universidade de São Paulo (USP).Audiência. Na terça-feira passada, durante as horas mais tensas do confronto entre manifestantes e a Tropa de Choque na Rua Augusta, em São Paulo, a única transmissão ao vivo ficou a cargo do canal online PosTV, com imagens feitas por um iPhone. A exclusividade da cobertura se refletiu nos acessos, que chegaram a 180 mil. O link da transmissão foi compartilhado à exaustão - incluindo o jornalista Jorge Pontual, da TV Globo, que elogiou a transmissão no Twitter. O jornalista Bruno Torturra, da PosTV, diz que a rede veio ocupar um espaço vago. "A gente fez o que se espera que a imprensa faça no mundo conectado das redes." O uso das mídias sociais no País tem números grandes e as redes sociais são cada vez mais acessadas na rua, graças ao avanço dos smartphones, que deverão ser 50% dos aparelhos celulares neste ano. De acordo com monitoramento da empresa Scup, publicações sobre os protestos impactaram mais de 136 milhões de pessoas nas redes sociais. Entre 13 e 21 de junho, foram mais de 2 milhões de menções em Facebook, Twitter e YouTube e Google. No mesmo período, a Copa das Confederações teve 214 mil menções. O monitoramento foi feito com base em palavras-chave como #passe livre, #vemprarua e #ogiganteacordou - são as hashtags. Para Ortellado, no entanto, as ferramentas também servem para repercutir discursos preestabelecidos. "Na rua, vemos uma difusão de pautas. A internet responde com um novo significado o que aparece nos meios de comunicação. Estamos vendo uma espécie de guerra simbólica." A jornalista Sam Shiraishi ainda vê uma falta de maturidade política nas redes. "Uma rede como o Facebook favorece a confiança no que os amigos falam, na curadoria de conteúdo deles. Passa-se para frente coisas que nem se leu direito."Para Iran Giusti, do grupo Mobilizados, criado no Facebook, as ferramentas digitais podem extrapolar o "ativismo de sofá" e unir pessoas em torno de objetivos. "Estávamos nas ruas e a pergunta era como chamar mais gente. Não somos da turma 'sai do Facebook'. Somos da turma 'use o Facebook para fazer coisas reais'."Além de relatos, vídeos e fotos, as redes sociais possibilitaram a organização de serviços de utilidade pública e redes de apoio a manifestantes - de campanhas convocando moradores a liberar o wi-fi a um mapa colaborativo que divulgava locais com postos de ajuda a feridos, abrigo e pontos de violência.Também foram compartilhadas dicas a quem fosse nas manifestações: do que vestir na rua a como lidar com bombas de gás lacrimogêneo. Quem não ia aos protestos também não ficava de fora: o movimento #Vemprajanela convocava moradores a colocar panos brancos em suas janelas em sinal de apoio a manifestantes.O advogado Augusto de Arruda Botelho publicou o número de seu celular para seus amigos do Facebook para o caso de sofrerem prisões "arbitrárias" na passeata de segunda-feira. "Na da quinta-feira anterior, houve muitas prisões assim, que dependem muito da presença do advogado para contestar a interpretação do delegado." Um grupo de advogados de São Paulo criou uma página no Facebook chamada Habeas Corpus Movimento Passe Livre. A iniciativa foi reproduzida em cidades como Porto Alegre e Belém. Segundo Botelho, as postagens ultrapassaram um milhão de compartilhamentos. "Nenhum livro de Direito jamais vendeu tanto", compara. Já o grupo Mobilizados surgiu depois da manifestação na capital paulista no dia 13, que ficou marcada pela ação violenta da polícia. Um post no Facebook convidava profissionais a produzir conteúdo para convocar pessoas às ruas. A adesão foi imediata. Em pouco mais de uma semana, a página na rede social já contava com mais de 23 mil "curtidas"."Atuamos fazendo a cobertura em tempo real para informar o público, checando exaustivamente as informações que chegam dos nossos colaboradores que estão na rua", disse o jornalista Iran Giusti de 24 anos, um dos integrantes do grupo. Outra iniciativa foi oferecer apoio difundindo a #MOBajuda: pessoas que necessitassem de auxílio podiam postar a hashtag - expressão que agrupa conteúdo em comum - em qualquer rede social para receber orientações. "Indicamos rotas mais tranquilas, identificamos pontos perigosos e oferecemos auxílio médico", diz Giusti. "No fim, a #MOBajuda serviu para que acompanhássemos o todo, e não só prestássemos auxílio. Foi muito importante, pois guiou equipes médicas de outros grupos de militância, por exemplo." / A.C.P. e C.R.

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