O governo federal descumpriu orientação do Supremo Tribunal Federal ao repassar, ontem à noite, a segunda parcela dos recursos do Fundo de Participação dos Estados (FPE), dinheiro que é dividido com todos os 27 governadores a cada dez dias desde 1966. O STF considerou anos atrás os critérios de rateio do fundo inconstitucionais e já tinha alertado o governo federal que apenas a primeira transferência deste ano, feita em 10 de janeiro, seria considerada legal por se tratar de imposto recolhido no ano passado.Os Estados poderão sacar o dinheiro depositado pelo Tesouro Nacional hoje. O governo federal se baseia em acórdão do Tribunal de Contas da União (TCU) para continuar repassando aos governadores os recursos do FPE, que no ano passado totalizaram quase R$ 49 bilhões. O dinheiro transferido ontem foi arrecadado pela União entre os dias 1.º e 10 de janeiro deste ano, momento em que, segundo o STF, a lei do FPE já estava extinta. Formado com 21,5% dos recursos arrecadados com o Imposto de Renda e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), o FPE foi considerado inconstitucional pelo Supremo em fevereiro de 2010.À época, o STF concedeu prazo de 35 meses ao Congresso Nacional para criar novas regras de rateio. Esse prazo venceu em 31 de dezembro de 2012, mas nenhuma lei sobre o tema foi aprovada. O parecer do TCU, de novembro do ano passado, libera o governo a continuar repartindo os recursos até que novos critérios sejam estabelecidos.O governo federal alega que o cumprimento da decisão do STF poderia gerar uma crise nos Estados. O FPE representa cerca de 70% do orçamento total de pelo menos seis Estados: Acre, Rondônia, Roraima, Amapá, Piauí e Tocantins. Ontem, o secretário de Fazenda do Acre, Mâncio Lima, confirmou ao Estado que o dinheiro já havia sido depositado pelo Tesouro.Há duas semanas, o advogado-geral da União (AGU), Luís Inácio Adams, e o secretário executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, se reuniram com o presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, para defender os repasses com os atuais critérios. À época, o governador de Sergipe, Marcelo Déda, afirmou que "Sergipe estaria diante de um abismo fiscal caso ficasse sem os recursos do FPE".Representantes do STF foram procurados ontem à noite para comentar o assunto, mas até a conclusão desta edição não haviam dado resposta. Barbosa já havia deixado claro para o governo que a decisão da Corte deveria ser cumprida e rechaçou, conforme relatos de integrantes do tribunal, qualquer tentativa de driblar o acórdão do tribunal. O repasse feito pelo Executivo pode ser contestado judicialmente. E os responsáveis pela transferência podem ser processados por improbidade administrativa e por crime de responsabilidade.