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'Fiesp financiou a tortura', afirma ex-marido de Dilma

Preso na ditadura e torturado, Carlos Araújo pede que comissão investigue 'antro' empresarial; entidade diz se pautar por democracia

Por Elder Ogliari e PORTO ALEGRE
Atualização:

O advogado Carlos Araújo, ex-deputado estadual do Rio Grande do Sul pelo PDT e ex-marido da presidente Dilma Rousseff, pediu ontem que a Comissão Nacional da Verdade investigue empresários brasileiros que financiaram a repressão durante a ditadura militar (1964-1985), durante depoimento em audiência pública em Porto Alegre."Tenho certeza de que a Comissão da Verdade vai entrar nesse antro da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), que foi responsável não só por financiar, mas também por assistir e estimular a tortura", afirmou. Araújo disse ainda, em seu depoimento, que empresários chegaram a acompanhar sessões de tortura e teriam estimulado os agentes. Chegou a mencionar um nome - "Nestor Figueiredo", "que até hoje está na cúpula da Fiesp" - que estaria envolvido com o financiamento da repressão.Em nota divulgada horas depois, em São Paulo, a Fiesp afirmou que "a atuação da entidade tem se pautado pela defesa da democracia e do Estado de Direito, e pelo desenvolvimento do Brasil" e que "eventos do passado que contrariem esses princípios podem e devem ser apurados". A entidade informou que o nome de Nestor Figueiredo, citado pelo ex-deputado, não consta nos arquivos da federação.Como sofre de enfisema pulmonar, Araújo ficou poucos minutos na audiência promovida pelas Comissões Nacional e Estadual da Verdade. A programação foi alterada para que ele falasse logo que chegou e saísse após cerca de dez minutos de depoimento.O ex-deputado exortou a Comissão Nacional a cumprir a promessa de revelar as cadeias de comando, do general ao torturador, conforme disse ao Estado o coordenador do grupo, Paulo Sérgio Pinheiro, em entrevista publicada no domingo. Araújo, que participou da luta armada, foi preso e torturado no Departamento de Ordem Política e Social (Dops) de São Paulo.Ontem, Paulo Sérgio Pinheiro ressaltou que uma das linhas de trabalho da comissão é investigar o financiamento da repressão no período mas admitiu que a questão é "delicadíssima". Na audiência, o governador gaúcho, Tarso Genro (PT), voltou a classificar como "lamentável" a decisão tomada em 2011 pelo Supremo Tribunal Federal que considerou os torturadores também beneficiados pela Lei da Anistia. O petista disse que essa posição será revista, pois "vozes importantes" dentro da Corte estariam dispostas a rediscutir o assunto. Tarso, no entanto, não citou nomes.Outro nome. A ligação de empresários paulistas com a polícia política da ditadura, registrada em documentos do Departamento de Ordem Política e Social (Dops), na Luz, foi revelada pelo Estado no dia 17. Tornados públicos pelo Arquivo Público estadual, eles informam as visitas diárias feitas ao órgão no início dos anos 70. Entre os nomes desses visitantes, os documentos apontavam o do empresário Geraldo Resende de Mattos, que era identificado apenas pela palavra "Fiesp".No dia seguinte à publicação da reportagem, a Comissão da Verdade da Assembleia paulista anunciou a disposição de investigar as ligações da entidade empresarial com o aparelho repressivo do regime militar. Na ocasião, a Fiesp informou também que o nome de Mattos nunca figurou entre seus funcionários. Um parente contou que ele havia trabalhado para o Serviço Social da Indústria - e este pediu tempo para checar a informação. Mattos morreu de enfarte em 2002, aos 65 anos.

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