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Estudo prova falência estrutural do Dnit e incapacidade de fiscalizar obras

Gestão. Auditor nomeado vice-chefe do órgão levantou dados que comprovam impossibilidade de atingir eficiência na área de Transportes e confessa: 'O Dnit não tem condições de tocar o PAC. Como ter controle num órgão que gere R$ 15 bi e tem 7 auditores?'

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Por Fabio Fabrini e BRASÍLIA
Atualização:

Nomeado vice-chefe do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) após a "faxina" promovida pela presidente Dilma Rousseff, o auditor da Controladoria-Geral da União (CGU) Tarcísio Gomes de Freitas se diz à frente de uma autarquia falida, sem condições de executar suas principais funções. Espécie de interventor do órgão, no cargo há pouco mais de cinco meses, ele desabafa: "O Dnit não tem condições de tocar o PAC (Programa de Aceleração do Crescimento). O que fazem com ele é uma covardia". Como diretor executivo do Dnit, o auditor concluiu em dezembro estudo que evidencia a impossibilidade de atingir as pretensões de eficiência do programa na área de Transportes. Fora a cultura de corrupção, que remonta ao extinto Departamento Nacional de Estradas de Rodagem (DNER), as deficiências estruturais empacam obras e favorecem desvios. Falta quem fiscalize a execução de contratos ou pague, com a devida celeridade, pelas medições de serviços prestados por empreiteiras. O Dnit tem hoje 2.695 servidores de carreira - menos funcionários, segundo o diretor, que o Departamento de Estradas de Rodagem de São Paulo (DER-SP), com 3,8 mil. Mais da metade do pessoal passou dos 51 anos de idade e um terço já tem ou terá, até 2016, condições de se aposentar. Para levar adiante 1.196 contratos, o grosso integrante do PAC, seriam necessários 6.861 funcionários. Mas projeção indicada no estudo mostra que, sem concurso público, 43% do pessoal vai debandar até 2015, restando 1,5 mil em atividade num contexto em que, ano a ano, o orçamento cresce. O Ministério do Planejamento não tem previsão de abertura de vagas. Levadas em conta somente as aposentadorias, alguns setores, como o Instituto de Pesquisas Rodoviárias (IPR), que aprimora as técnicas e procedimentos do órgão, perderão 71% da força de trabalho até 2015. Perfil. O problema não é só a quantidade, mas o perfil do pessoal. Mais da metade é de nível intermediário e atua em funções administrativas e de apoio. Em todo o País, o Dnit tem 126 porteiros no Brasil e só 9 contadores. Em Brasília, trabalham três contadores, com 597 processos de prestação de contas atrasados. Nos tempos em que a máquina de escrever virou peça de museu, há 131 datilógrafos no quadro do departamento, ante 10 técnicos de estrada e 8 tecnologistas, encarregados de avaliar a qualidade do material e dos serviços empregados em obras."Este desbalanceamento dificulta o cumprimento das tarefas, prejudica o desempenho global e escraviza a autarquia, que fica dependente de terceirizações para o desempenho de suas atividades", constata o estudo, que aponta deficiências também em área crucial para o controle da corrupção. País afora, o Dnit tem 94 motoristas e somente 7 pessoas para patrulhar a execução de um orçamento mastodôntico. "Como é que eu vou ter um bom ambiente de controle num órgão que gere R$ 15 bilhões e tem uma auditoria interna com 7 auditores?", questiona o diretor executivo. Na Corregedoria, responsável pela apuração de malfeitos dos servidores, há seis pessoas para conduzir, em média, 55 processos anuais. O impacto dessa desordem administrativa no andamento das obras é direto. Nas palavras do estudo, o Dnit leva "incríveis 300 dias" para pagar a uma empreiteira pela medição de um serviço. Contribui para isso, acrescenta o diagnóstico, a falta de sistemas de informação confiáveis e integrados para o acompanhamento físico-financeiro das obras. "Cada documento passa por inúmeras mesas sem um controle efetivo de prazos e ou de consistência das informações prestadas", diz o trabalho. Relevo. Órgão com expertise em estradas, o Dnit não tem em seus quadros, segundo o estudo, topógrafos para avaliar, por exemplo, as condições do relevo nas obras rodoviárias e laboratoristas para checar a qualidade do asfalto. Nem mesmo no IPR. São cerca de 800 engenheiros, mas, nas contas do diretor executivo, seriam necessários 3 mil. Não por acaso, nas unidades locais do Dnit, esses profissionais, não raro com mais de 30 anos de casa, atuam sozinhos, equilibrando-se entre serviços técnicos e administrativos. Sem condições de fiscalizar as obras, resta a eles apenas ratificar os pareceres de empresas de supervisão, contratadas para acompanhar o serviço de empreiteiras e que, em muitas situações, atuam em conluio com elas para fraudar os contratos. "A gente tem situações de um camarada completamente atirado aos leões, porque não tem um mínimo de estrutura para acompanhar aqueles contratos. Além disso, não tem o suporte de laboratório. Fica à mercê, a reboque das empresas de supervisão. De certa forma, fica escravo dessas empresas", queixa-se Freitas. Em vários Estados, obras importantes do PAC, prometidas por Dilma, permanecem no papel ou atrasadas. É o caso da duplicação da BR-381, entre Belo Horizonte e Governador Valadares, e da reforma do Anel Rodoviário da capital mineira.Há anos, os dois empreendimentos não saem da fase de "projeto". No Maranhão, conforme o Estado mostrou na terça-feira, a licitação para duplicar a BR-135 teve de ser cancelada por deficiências nos projetos. Em Pernambuco, as intervenções na BR-101 acumulam atrasos e suspeitas de corrupção investigadas na Operação Casa 101, da Polícia Federal.

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