Embaixadas por toda parte

Em uma década, País abriu 75 postos no exterior - mas estratégia ainda não aumentou a influência nem melhorou a balança comercial

Por Lisandra Paraguassu e Iuri Dantas
Atualização:

BRASÍLIA - Entre 2002 e 2011, o Brasil inaugurou 75 novos postos diplomáticos no exterior. A política de ampliar as relações internacionais teve duas metas: abrir novos mercados para os produtos brasileiros e aumentar a influência global do País. 

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Este ano, o Brasil só deixou de vender para 12 países entre os 237 com os quais mantém negócios. Nos últimos anos, conseguiu emplacar seus candidatos em diversos organismos internacionais, entre eles a Organização para Agricultura e Alimentação (FAO) e na Organização Mundial do Comércio (OMC). Esses ganhos, no entanto, ainda não transformaram o Brasil na potência diplomática e comercial almejada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seu idealizador.

Desde 2011, quando Dilma Rousseff assumiu o governo, o Brasil vê seu superávit cair nas novas áreas de comércio e mesmo em zonas de influência mais próxima e direta, como a América Latina. O déficit comercial com os 54 países africanos triplicou entre 2010 e 2013, chegando a US$ 6 bilhões. No Oriente Médio, o superávit passou de US$ 6,13 bilhões para apenas US$ 3,58 bilhões em 2013. Entre os latino-americanos, caiu de US$ 14,78 bilhões para US$ 9,3 bilhões em 2012, voltou a subir um pouco no ano passado, mas dificilmente manterá o resultado este ano.

O Itamaraty vê nesse movimento o resultado normal de uma crise econômica que ainda perturba o comércio mundial - mesmo que outros competidores no comércio mundial, como os chineses, tenham ocupado espaços que antes eram de produtos brasileiros. No entanto, apesar da preocupação direta de Dilma com a parte econômica das relações internacionais, a presidente não tem o mesmo ímpeto e temperamento de “caixeiro-viajante” de Lula. As relações políticas, tão cultivadas pelo ex-presidente, perderam espaço.

Sul-Sul. As apostas do ex-presidente na chamada diplomacia Sul-Sul, de relacionamento direto do Brasil com outros países emergentes e do antigo Terceiro Mundo, focaram “mercados pequenos, com potencial de crescimento, mas com rendas baixas, que não têm no comércio exterior uma fonte potencial de benefícios para o Brasil”, resume Bruno Lavieri, analista da consultoria Tendências.

Apesar de ter estado presente em quase todos os fóruns internacionais, Dilma demonstra sempre uma atenção especial aos que tratam de temas econômicos e que possam render proveitos ao País. Foi inegável sua satisfação ao receber os Brics - Rússia, China, Índia e África do Sul - no encontro de Fortaleza, há pouco mais de um mês. A presidente tem, ainda, especial apreço pelos encontros do G20, o grupo onde se reúnem as maiores economias mundiais e se discutem basicamente assuntos econômicos. É o G20 que trata de questões de combate à crise mundial. Já grupos mais políticos, como a União das Nações Sul-americanas, e as Cúpulas América do Sul - Países Árabes (Aspa) e América do Sul - África (Asa) não despertam nela a mesma atenção.

Dilma deixou claro, desde o início do seu governo, que não viajaria tanto como seu antecessor. Diplomatas garantem que ela ainda viaja mais do que se esperava, mas confirmam que seu gosto é por resultados concretos. Não é segredo que, ao tratar de uma viagem, ela pergunta: “Mas o que de concreto vai acontecer lá?”

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Dilma se manteve afastada de temas internacionais como a crise na Ucrânia e, ao contrário de Lula, nunca tentou influenciar nas negociações do Oriente Médio - nem mesmo entre Israel e Palestina, área em que o Brasil tentou até ser mediador. 

Mediador. Ainda assim, o Itamaraty avalia que o Brasil mantém, hoje, uma certa influência internacional, como mediador na América Latina e como negociador em fóruns internacionais - não apenas econômicos, mas políticos, como a Assembleia Geral das Nações Unidas, onde conseguiu aprovar uma resolução sobre responsabilidade na internet.

“Quem quer ter uma política global tem que atuar globalmente. Então faz parte de uma visão coerente da nossa política externa, de atuar em várias frentes em vários países”, afirmou ao Estado o ministro das Relações Exteriores, Luiz Alberto Figueiredo.

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O chamado “soft power” do Brasil, sua capacidade de não gerar atritos com os diversos atores internacionais, tem sido usado para pressionar por mudanças na chamada governança global, em instituições como as Nações Unidas, Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial. Com sua rede de contatos diretos, o governo brasileiro angaria apoio para essas propostas, uma delas já longe no retrovisor, que é o direito a um assento permanente no Conselho de Segurança.

Com a reforma da ONU atualmente engavetada e sem horizontes concretos, o Brasil tem centrado seus esforços nas reformas do sistema de governança econômica. Na prática, ainda não obteve os resultados prometidos, o que pôde ser constatado quando o francês Dominique Strauss-Kahn deixou a direção do Fundo Monetário Internacional (FMI) em meio a um escândalo envolvendo estupro. O Brasil tinha expectativa de emplacar um economista de país emergente no comando do Fundo, mas teve sua ambição vetada pelos países ricos e prevaleceu o nome da também francesa Christine Lagarde. A reforma das cotas do FMI e do Banco Mundial também continuam em discussão no G-20 até hoje, após um leve ajuste no início da crise financeira internacional.

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